Senza cedere
Há uns anos escrevi a um dos meus filhos começando assim:
Todas as noites em que eu vaguei, por dentro cheio de imensa
canção...
Nos dias idos em que era rei, pós-adolescência, auge prematuro da
existência qual um aborto engendrado por deus, vagava horas zumbi pelas ruas
emitindo acordes mentais, morcego sonâmbulo me guiando pelos ecos reverberando
nos muros da cidade enlouquecendo de dores e sons.
Era feliz e, ó graça, sabia. Hoje olho à minha volta e me pergunto
de que me serve esta pseudolucidez a que me agarro feito náufrago prestes a
despencar no abismo de Tártaro.
Os produtos da pretensa ludidez não valem nada. Sobretudo a música.
Música é um estado interno. Música é estar encharcado de sons,
sons que fazem parte de você como sua cabeça ou seu coração.
Nesse estado a música brota feito uma mina d'água, sem que você
saiba de onde, sem que você queira saber.
Nesse estado você cantarola mentalmente algo que lembra Beethoven,
Roberto Carlos, Xitãozinho, acordes inefáveis, teus acordes oníricos, tua
música primeva.
É essa a música que interessa.
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