DM III

Não pensa que te atas à vida por grossas correntes de aço que não se desintegrarão, seja lenta, seja vagarosamente, antes da hora marcada.
Não pensa.
Fingimos — e como sabemos fingir bem — que, basta querer, podemos convencer o tempo a ser nosso aliado. Podemos domesticá-lo usando relógios e calendários e datas. E podemos enjaulá-lo em horas marcadas numa agenda carregada pra cima e pra baixo dentro duma bolsa ou debaixo dum braço, para — e aqui reside nossa canalhice — para libertá-lo por um tempo que é nosso, não DELE, contando que, ainda assim, ele se desincumbirá da NOSSA missão.
Da nossa frívola, injusta, errática, desprezível missão.
Malditas horas marcadas que não funcionam sequer em consultórios médicos e dentários e nas estações do metrô mas que psicanalistas alheios ao nosso tempo pessoal sabem cumprir tão ferrenhamente para então didaticamente nos ensinar que, se queremos ser adultos e responsáveis, devemos antes de tudo aprender a respeitar as pulsações impessoais do tempo.
Maldita hora marcada em que cheguei à esquina para esperar minha namorada e ela não apareceu e às oito e meia daquele onze de novembro de mil, novecentos e sessenta e nove e a canção que me martelava o cérebro atordoado da espera ficaram e ficarão marcadas até o fim dos tempos no cantinho imenso que, dentro de mim, nasceu, talvez junto comigo, para armazenar as frustrações que a partir de então passaram a ser pequenas, desprezíveis e mortais.
Minha canção eterna cadencia o ritmo do meu tempo.
Durante, não tenho parentes, amigos ou conhecidos e não sou membro de clubes, facções ou ordens e não pertenço a nenhuma sociedade e DM é das poucas pessoas de quem quero me aproximar pois sei que DM não arregalará os olhos de espanto ao ler esta homenagem ao seu trigésimo aniversário, ao contrário de tantos outros espantadiços e protocolares que me assombram qual fantasmas cujos nomes me esforço por esquecer.
Não pensa que me ato a ti por grossas correntes de aço imunes a mim indiferentes a ti.
O que me ata a ti é um fio, o mais orgânico deles, que ora afina e esgarça, ora urde e entrança e entrança sob as pulsações mágicas do tempo de nós dois.

Como ter pinta de grande intelectual

Cá pra nós: você tem um blog literário e certamente quer abafar, não quer? Não seria o máximo jogar uma de respeitabilidade e erudição pra cima dos pobres coitados por aí que só falam feijão com arroz?
Claro que seria. Pois aí vão algumas dicas pra você dar uma de gostosa(o):
1 — Em pelo menos uma postagem por dia, cite uma longa lista de grandes nomes da literatura ocidental. Assim: “Como ensinaram Balzac, Turguenief, Dickens, Zola, Flaubert, Leconte de Lisle, Sully-Predhomme, Swinburne, George Eliot, Thackeray, Arnaut Daniel, Airas de Santiago, John Donne, Marino, Corbière, Hopkins, Kilkerry e outros...” Mas atenção: pelo menos metade de sua lista deve ser de figurões de quem a malta nunca ouviu falar, pra que o papo fique obscuro e portanto fascinante.
2 — Não deixe de incluir medalhões que sejam “objetos de desejo” da plebe: Freud, Shakespeare, Goethe, os gregos, por aí. O ideal é ter também umas palavrinhas em grego ou latim. P. ex., “Para Horácio a poesia devia combinar ‘prodesse’ (aprendizado) e ‘delectare’ (prazer)”.
3 — Não vá mumunhando como se pedisse treis pãozinho ao Severino da padaria. Ninguém dá bola pro coloquial. Emposte a voz, erga as sobrancelhas, abroche um biquinho. Não tenha receio de soar pedante. Soe pernóstico mas não decididamente antipático. E não receie parecer ligeiramente esnobe, como se a modéstia o impedisse de exibir seu imenso conhecimento em toda exuberância e vigor. Vez ou outra forje um tom pedagógico (mas não didático). Ensine mas não perore. Se puder papaguear feito guru, melhor. (Há uma finíssima linha entre ambos que só os hiperssofisticados enxergam. E quem não enxerga, sente-se inferior ao ponto das lágrimas. Quem disse que um chororô ocasional não faz bem pro fígado?) Importante: mencione en passant sua vivência prática com grandes e profundas leituras, que, obviamente, você não tem. Aqui e ali ao longo duma postagem jogue algum jargão, desses usados pela crítica especializada. Mas não entorne o caldo — uma teorização críptica de máximo de 5 ou 6 palavras é suficiente.
4 — Reclame. Numa boa, mas reclame. Principalmente do “baixo nível”. Por exemplo, do baixo nível dos professores, do baixo nível dos alunos, do baixo nível das novelas e, obviamente, do baixo nível geral dos leitores de blog. Impreque também contra a falta dum bom debate erudito, tanto no seu blog quanto no Brasil quanto no planeta como um todo. Denuncie o medo que o brasileiro tem dum bate-boca. Só tome cuidado pra não reclamar que ninguém reconhece seu valor; ninguém curte patéticos.
5 — Jamais comente ou se refira à literatura leve, i.e., as obras produzidas pela indústria cultural destinadas ao entretenimento despretensioso. Um inteleca que se preze não perde seus preciosos neurônios com livros vendidos no Extra. Enfatize repetidamente a necessidade da mensagem. Se puder citar coisas como “cunho”, “caráter”, “visão de mundo”, “reflexão”, “senso crítico”, manda bala. Explique que literatura não é revistinha de piadas de português. Só os grandes gênios da raça são capazes de passar uma mensagem avã la létre. Se não a achamos é porque não olhamos (ou lemos) direito. Um romance deve ter uma boa história pra contar, uma razão que “elucide”, sacadas que “desvendem a alma humana”. Se der uma grande lição, manero. Não importa se profunda ou simples, sutil ou patente. A literatura digna do nome deve “induzir” o leitor a repensar-se “enquanto” ser, levantar desafios, incentivar a criatividade. Só não vá mencionar que tudo que Shakespeare pretendia quando escreveu suas peças era distrair o rei e sua corte e faturar uma boa grana.
6 (e mais importante) — O segredo d'uma postagem decente é escrever de modo que ninguém a queira ler mas não se dê conta disso. Neguinho deve bater o olho no texto e partir imediatamente pra outro, achando-se incapaz de compreendê-lo em sua plenitude hermenêutica. De lambuja, você leva uma grande vantagem: assim pode mandar a maior asneira do mundo que ninguém sequer desconfiará.
That's all folks! Deem suas contribuições. Se tivermos bastante material, podemos até lançar um livro com esse título aí acima.

O vencedor

Respiro. Enquanto você decora a sala. Me entrego aos vírus e às bactérias. Enquanto você passa batom na boca. Bebo ao próximo minuto. Enquanto você planeja seus próximos vinte anos.
Respiro o pouco de ar que me cabe na atmosfera e que me foi deixado de herança por alguns poucos homens e mulheres prudentes desta terra hoje em chagas.
Por uns segundos me acho um ser eleito e elevo ao ar, dramaticamente, um brinde a esse meu deus que não existe e que esse meu raciocínio grosso e leal à minha história ao fim de tais segundos torna a se impor e a hemorragia dos meus pensamentos na superfície do meu cérebro estanca e agradeço envergonhado a algo ou alguém nos céus.
Tenho saudade da tuberculose que matou Álvares de Azevedo e das touradas madrilenas de Hemingway que hoje não toleraria reler. Quando li Adeus às armas, adolescente, jurei num dos cantinhos escuros da minha mente que seria um toureiro alcoólatra para todo o sempre. E fui. E sou. Toureiro hoje sem capa nem espadas nem touro ou arena ou sangue.
Sinto as pupilas se dilatando ante o brilho das tuas joias e o gosto amargo no fundo da garganta ante a meia-calça que vestes para sair na noite sem hora para voltar. Revivo minha era do Anjo azul e uma explicação imemorial me crucifica que, estou certo, fui desmamado precocemente. Um rádio longínquo toca Out of the Blue, de John Lennon, e lamento não ter prestado a devida atenção aos meus sentimentos quando tinha a capacidade de saboreá-los com a necessária intensidade então apropriada aos meus vinte anos.
Poderia ter, então, me enforcado. E, também estou certo, teria sido relativamente fácil e quase indolor. Hoje minha única opção é tentar imitar aquele que já não sou há tantas décadas.
Ao contrário do que imaginava então, o tempo vai devorando minhas palavras, aos poucos me encurralando num beco seco e estéril. Me reduzi a um espectador desse espectro que sobrou. Meus lábios se expandem sob a memória dos dias em que acreditei na lógica das ciências e me deixei enganar pelos princípios da termodinâmica e vislumbrei algum sentido no estudo das onomatopeias. Nos raríssimos momentos em que o superego me dava alguma trégua, fugia para as peladas no campinho da esquina e me entregava resolutamente aos dribles dos garotos azes do futebol.
Não acreditava na época em subordinação e não acredito ainda hoje. Era, e é, apenas um pretexto, obscuro para mim, mais obscuro para eles. Nunca – em instante algum – vi qualquer problema em me deixar enganar. Sempre – em todas minhas épocas – soube que o ludíbrio é parte integrante e natural das leis particulares que me regem.

A namorada do Gregório

Uma das coisas que me deixam encasquetado é citação de poetão.
Desde meus 10 aninhos me amarro no barbão do Walt Whitman. Papai era tão glabro quanto Roland Barthes segundos antes de virar carne moída sob as rodas daquele furgão de lavanderia. Deliro testemunhando um françois alienado de suas teorias estapafúrdias enquanto é massacrado pela verdade do mundo.
Eu mesmo um dia serei atropelado, estou certo. Não por um carro de combate vendido pelo Putin ao zé dirceu no grande levante das massas contra a inteligência e a sensatez mas prosaicamente por um Jeep coreano desgovernado sob as patas de unhas pintadas duma mãe com pressa de deixar a pirralha mimadinha na escola onde professores mambembes ensinam crianças alheias como levar no rabo fazendo de conta estão bebericando champanhe ao lado do príncipe Carlos numa barca deslizando suavemente pelo Sena neste mais longo dia do verão parisiense.
Será mesmo verdade que vocês hoje aí fora são mais de 7 bilhões de bípedes dizendo exatamente a mesma coisa em múltiplos idiomas enquanto teclam os mesmos botões e recostam no mesmo sofá enquanto tentam sufocar a mesma repulsa e aspiram pelo mesmo destino?
Custa-me saber.


Como todos vocês sabem, sou um frustrado, neurótico, priápico, agnóstico e com a perna esquerda ligeiramente mais comprida que a outra, como todo escritor que se preze.
Desde a mais precoce idade sonho em abafar nos salões literários da minha terra, quando minha terra ainda tinha salões literários. Hoje me conformo em sonhar em abafar neste blog pelo menos.
Venho escrevendo por aqui há exatamente seis anos e ninguém e sua vizinha dá a mínima.
Assombrado com a falta de feedback, matutei uns 2 segundos e concluí que foi porque nenhum de vocês entendeu a jogada. Então explico: minha intenção era fazer piadinhas com, por exemplo, essa mania do google em nos corrigir quando digitamos um termo de busca e não obtemos nenhum hit. Como também sabem, o google tem esse horrendo costume de achar que fazemos todos parte dum colossal rebanho humano de jegues. Ao que parece não passa na cabeça do Larry que pode haver no meio da manada um ou outro indivíduo, dotado da respectiva carga de pessoalidade, características únicas, idiossincrasias e escova de dente cor-de-rosa.
Como já expliquei em dezenas de postagens, meu maior sonho é me tornar um escritor bem-sucedido e paparicado nas comunidades virtuais, quem sabe até virar uma referência da literatura universal atual. Sei que vocês debocharão, fazendo aquele gesto típico de desmunhecar derrisoriamente. Mas, em que pese que sim, haverão de admitir que se trata duma pretensão legítima. Afinal nós escritores vivemos botando banca de sabidos, eruditos, criadores e o cacete mas o que buscamos no duro é que nos olhem com admiração e até mesmo uns laivos de inveja. Eu pessoalmente gostaria muito de sair incógnito pelas ruas aqui no meu bairro só pra 5 minutos depois ter um bando de fãs me perseguindo, estendendo bloquinhos de coleção de autógrafos em minha direção e suplicando um segundo deste meu penetrante olhar de gavião ensandecido.


Agora, imagine-se cuma Contigo nas mãos, a fotonovela (lembra?) se chama A preferida do padre que nasceu um século antes da internet.
Imagine ainda que minha vodka está no fim mas não tanto.
E, Gott, imagine que nossas vidinhas não têm nada a ver com que nossos cerebrozinhos imaginam.
Sou um constante adolescente
Suplicando que os adultos e o mundo que os adultos manejam
Me deixem entrar pelo menos alguns minutos (pois alguns minutos seriam suficientes) e então a fugacidade que planejei para mim e minhas coisas (minha vidinha inclusa) me bastaria.


Como todo intelectual digno do nome, Gore Vidal extravasava dos clichês em que os mais estúpidos e menos inconformados em geral se escondem para não pensar com verdadeira independência. O esporte preferido de GV era enfurecer direitistas e esquerdistas, doidivanas e reaças, héteros e ateus (sic) ao bel prazer, sem passar telegrama nem recibo. Um sujeito como GV aparece neste planeta só a cada meio século, para sorte dos diversos matizes de patrulheiros. Não temos um GV no Brasil desde... desde o século 16, acho.


Vejo daqui de dentro e de baixo do que me restou de órfão emotivo a sôfrega corrida dos expositores de currículos por estamparem em suas paredes caiadas de restos de latas de tinta látex as infaustas glórias que seus papai e mamãe sonharam para eles durante aquele sofrido coito no, como gostam de optar os clichês de Holliwood, banco traseiro do Buick e que, pra nós aqui abaixo da democraia do Chávez, se dá quando muito encima da pilha de caixas de cervejas no fundo do buteco imundo nas cercanias da V. Madalena.
Estou chegando à bebedeira e deliberando por permanecer por aqui mesmo. A grande questão que nos recusamos a encarar é se tudo não passa duma grande perda de tempo. Sem falar nessa mania de tomar banho todo santo dia como se fôramos baiacus. Daonde virá essa necessidade de contato com os elementos? Faz 5 milhões de anos que deixamos a vida aquática. Ai que falta de ar. Não seria mais aconselhável ficar numa poltrona bem seca, nas mãos um livreco igualmente seco, ruminando o gosto amargo destes dias e noites que não passam? Pelo jeito só consigo arrancar de vocês alguma info digna de registro quando dou umas estocadinhas no meio do nervo letárgico. Não vão reclamar depois.
Estou escutando Angel do Hendrix. Auge.
Spurt.
Deus, onde estás que não me escutas?
Preciso duma epifania.
Vejam. Fazer literatice não é tão foda afinal. A há à farta por aí em blogs de pessoas sérias e compenetradas das miçangas da vida.
Esta preguiça me mata.
Merda, por que as mulheres têm de ser tão pragmáticas? Só pensam em procriar.


Umas pessoas havia de cujas almas apenas uma porta de imbuia e dois metros me apartavam. Quão longa, intransponível era essa distância. Hoje sei que posso fingir que não e sim. Tinha em algum lugar algum conceito de completude vazia que me bastava. Não era fingimento, veja. Passei a fingir anos depois quando aceitei a hegemonia do mundo. Foram longos anos. No início pensava que sairia ileso. Hoje nem imagino quantos monstruosos danos tive de aceitar na negociação.


Me disseram que psicólogos e psicólogas pesquisam o google antes de aceitar marcar a entrevista inicial com um potencial paciente / cliente, sei lá.
Deu pra sacar?
Se você andou aprontando além do aceitável por aí, pode pendurar as chuteiras.
De minha parte, eu não seria aceito nem no Charcot, na via Anchieta onde já fiz tratamento, como sabem os que leem atentamente meus escritinhos.
Anyway, não corro tal perigo. Já tive provas cabais de que não há terapia na literatura humanista que dê conta do meu ser.
Eu sou foda. Os internos zanzando pelo pátio do Charcot são foda.
Amanhã, se não estiver derrubado como estou hoje, tentarei lhes contar por que é que a literatura não cabe em pequenos blogs formigando de crianças que sonham em escrever o grande romance do século 21 num banco do McDonalds.


Já fui acusado de sofrer os efeitos do tempo dezenas de vezes. O mais patético: por gente que se arma de ares literários com seus narizinhos empinados querendo posar de gostosões.
Obviamente os mentecaptos jamais leram uma linha sequer de quem quer que seja que tenha algo a dizer sobre a natureza humana na literatura mundial. De certo jamais leram Shakespeare. A obra do Bill, eivada de centenas de personagens anciãos, daria nesses energúmenos torcedura de nariz.
Imagine um Rubem Fonseca que, por um sonho de inverno, viesse postar num desses fórus entupidos de teens. Seria escorraçado pelos intolerantes menores de idade que não fazem a mínima ideia das maiores injunções da vida e, inocentes, se pensam capazes de impor a ditadura da juventude sobre todos os seres.
Então imagine cada um dos maiores escritores da humanidade e a idade em que morreram e imagine, ao lado de cada um deles, um bostinha adolescente lhe ensinando que suas datas de validade já eram.
Por essa e muitas outras adolescentes cheios de empáfia me dão nos nervos. Não toleram que um sujeito como eu possa se expor da forma inconsequente como me exponho. Provavelmente eu os assuste.
Pois, porra, que sentido há em fazer literatura e opinar sobre a literatura e sobre os homens e mulheres que a fazem sem assumir sua pessoalidade?
Pois, em meio à fulanização proporcionada pela internet, a individualidade hoje em dia vale ouro.


Judiciário coisa e tal, identidade pública na rede, risco de se envolver em quiproquós, risco de afetar o currículo e a carreira, perigo de manchar a reputação, quem sabe daqui uns anos levantam lá o teu prontuário, você se portou “inadequadamente”, frio na barrigona que começa a intumescer de cerva, a fuzarca internáutica afinal não vale tanto a pena assim, não é? Melhor voltar para a minha moita, hehehe....


Sempre que vejo um escritor ou poeta pedindo opiniões alheias me ocorrem As cartas trocadas entre Rilke e o jovem poeta Kappus. Esgoto o que penso a respeito em De anjos, ratos e outras pragas.
N'As cartas você encontrará tudo de que precisa para escrever.
Ou melhor, não encontrará nada.
Como escritor/poeta, você tem de conformar com sua solidão. E desistir das milhões de convenções sociais que brotam ao seu redor a cada segundo. Senão, deixará de ser você e passará a ser todos.
Não seja todos.
Não seja eles.
Seja você.
Não é moleza ser você.
São oito bilhões de fulanos, sicranos e beltranos lá fora contra um só você. A briga é desigual. Você não terá chance se não se assumir como um ser especial e único, sem molde, averso à linha de montagem, disposto ao próximo passo apenas se o caminho for seu e de mais ninguém.
Escritores e poetas são antípodas de carimbadores constantemente afoitos para distribuir suas etiquetas, regras e normas.
Não vou dizer que é preciso ter coragem.
É preciso ter coragem.
Eu, particularmente, estou ainda vivo porque não a tive.
Lamento cada dia desde então.
Se você se acha predestinado a virar uma estrela com brilho próprio e não apenas reflexo do Sol, talvez um dia precise se incendiar.


Sei, machos bocejantes dão sono em suas fêmeas. You had it coming.
As mulheres tão precisadas dum paulão em suas vidinhas insossas.
Quem não?
Eis um dos segredos dela, vida.
Certa feita, 13 aninhos, fiquei esperando.
E ali na fila pude enxergar sua tecitura.
E silenciei, até pra mim mesmo — era vida demais para um ser irresoluto de querer viver.
Quer que te agradeça? Obrigado. Mudou alguma coisa?
As partículas que me compõem são só minhas e a elas devo minha atualização.
Spit.
Por que meu uísque é tão perfumado?
Acho que acabei de compreender a alma russa.
Se vomitar durante a madrugada, ofertarei meu vômito a vocês.


Pego aleatoriamente um livro da obra completa de Borges em minha estante e abro aleatoriamente numa página qualquer e leio aleatoriamente um parágrafo e me assombro e me professo pela enésima vez agradecido e reconhecido da existência de homens como Borges que nos elevam um tico que seja da mediocridade e não é um sociólogo numa entrevista em que deixa demonstrado que a palavra não é seu forte que vai abalar 1 mm que seja o que aprendi até hoje sobre homens pequenos e grandes homens.


Estou procurando alguém capaz de discutir criação literária e artística cum mínimo de competência que não seja inapto para ir além de citações previsíveis dos medalhões do mundo ou das piadinhas sórdidas ou do protocolar confortável.


Vou dar uma dica, gasto grande parte do meu tempo atacando as pobres ovelhinhas indefesas eternamente a proteger suas bucetinhas virgens dos monstruosos cacetões que rondam a noite lá fora à procura dum cabacinho inermemente doentio, acordem antes que seja tarde, já é tarde, será tão difícil de enxergar? vomitando minha verve aqui pruns covardes acossados atrás da porta da calhorda da Elis e do vivaldino do Chico escritor parisiense, ontem à noite mamãe voltou do além pra me puxar a orelha, nenê! (me chamava de nenê a carcamana, sei, tá explicado, caralho, que exaustão dos vermes nascidos para apascentar galinhas, paixão paixão paixão me redima me abduza toque o acorde inicial da minha vida estou a ninar quantos surdos existem neste planeta? eis a conta incalculável.


Boa escrita, cúspite! que significa isso? não se deseja isso nem mesmo a quem se pretende escritor. Little Rose, quando casada com Philip Roth, ao sair para a feira onde ia comprar as castanhas de caju de que Roth é aficionado ainda hoje, nunca dizia “Phil, boa escritura!” (pois é assim que se deveria dizer isso se isso pudesse ser dito a qualquer escritor que fosse, quer fosse pretenso ou já realizado), pois Little Rose sabia que correria o risco de levar uma maquinada de escrever no meio da fuça (Roth escrevia e sempre escreveu com máquina de escrever antes de se aposentar, são pitorescos esses geniozinhos literários). Você desejar a um escritor — e quando digo escritor me refiro a um bom escritor — o que quer que seja — seja um prosaico “bom passeio”, ou um cafonérrimo “boa escritura” — é desconhecer de cabo a rabo do oiapoque à marilena chauí what writing is all about.


Parafraseando Clemanceau  e seu “a guerra é séria demais para ser deixada aos militares”
Parafraseando Delfim e seu “a economia é séria demais para ser deixada aos economistas”
Parafraseando Nietzsche e seu “a música de Wagner é séria demais para ser apresentada no casseta e planeta”
Devo dizer que sou sério demais para ter sido criado por uma mulher como mamãe.


Não visitem meu blog literário porra nenhuma.
Não quero, nunca quis, a proximidade de apaixonadinhos vocacionados para edulcorar a aspereza do meu mundo, de libélulas prostitutas sempre prontas a eletrizar o cadaverismo de seus papais e mamães diante do aparelho de TV na noite de sábado torcendo para que o cemitério de domingo nunca se consume e todas essas nossas experiências não tenham passado dum pesadelo do qual acordaremos quando morrermos, que lixo este universo em que nasci.


Pra mim a razão sempre foi, desde meus tempos de 40 cm de altura, que nossas famílias são mais ou menos especiais. Ia alegar outro fundamento mas acho melhor deixar pra depois. Não vejo lá estreita ligação entre uma família e outra. Nesta primeira etapa da investigação devemos nos ater aos elementos internos 3 pontinhos.


Puta que pariu, tem noite parece que minha genialidade não tem fronteiras, dá até medo. Fico pensando, aonde é que vai parar meu dieu? Pode não ter fim. Não sou um tipo de ser humano lá muito autoexploratório como soem ser os grandes artistas. Já passei por momentos particularmente terríveis em que tive a clara impressão de que me seria impossível retornar. Não, nada a ver com Nietzsche e seu ponto (único) do não retorno. O próprio Frederico não retornou. Chegou ao cúmulo de ter nojo de Wagner, pra mim prova incontestável da sua não retornabilidade. Hélas, tudo é questão de coragem, acho. A maioria dos bovinos pelos rebanhos no mundo no máximo ousa comprar um carrão arretado ou ler um pensadorzão porque ler  pensadorzão é chique e amaina os ataques agudos à consciência de que somos um bando de animais selvagens querendo comer o rabo do próximo e da próxima e dar o nosso próprio à próxima ou ao distante. Tudo é uma grande merda.


Nunca abanaram o rabo pra mim.
Sou um frustrado.
Sabia que “alguém” eliminou o ruído produzido pelas engrenagens do mundo quando engrenam? Ou desengrenam?
Craaaakkk (será predestinação?)
Imagina o preço de tal intervenção?
Essa bosta está prestes a implodir.
Meu demônio angelical me visitou ontem à noite e quis saber, onde desejas passar o instante da implosão?
Quer dizer que ainda não aconteceu? I asked back.
A onomatopeia da desengrenagem do mundo é dad daddy, eu sou vertical, disse Sylvia Plath quando lhe perguntei se queria me levar consigo.


Conversa fiada. Depois da novela A tempestade vem o programa Bonanza (lembra? Little Joe, Ross, Robert).


Minha benóvola Xuquita bateu as asas que não tinha e nunca teve e voou. Teria sido assim e teria sido tão simples se a partida tivesse ocorrido dentro do planejado. Mas sou uma anta e nada nunca haverá de sair conforme o planejado. Pois sou um imbecil abilolado eternamente às voltas com os entes etéreos que me habitam e CULPA! CULPA! CULPA! não previ o que estava ali acontecendo na minha própria fuça. Minha santa Xuquita começou a botar os intestinos para fora e, eternamente aloprado, me limitei a olhar e liguei, liguei e liguei e não encontrei o miserável do meu vet e recorri à internet e localizei uma fariseia que procrastinou o sofrimento da minha amada por um loonnngo dia em que me prostrei abestalhado a testemunhar sua dor. Não posso acreditar que aconteceu mais uma vez, não quero ter um entezinho destes ever more, bah, que patético aqui choramingando pra desconhecidos esfomeado de compaixão, suplicando aos inexistentes deuses que pelo menos uma vez me permitam a graça da crença, jesus, não é assim, meu querido, mantenhamos a compostura das aparências, minha Xuca se ergue no meu céu batendo as asas que lhe dei e fôdasse, tá certo agora? que vidinha de vermes é esta que vamos levando, cuspe!


Sou o demônio filho da puta sob 60º graus de febre sifilítica e efeito de 482 garrafas de uísque de terceira que escreveu isto: Um escritor sem assunto na esperança de que um dia alguém cum mínimo de sensibilidade literária e indiferente ao aprendizado de suas professorinhas mortas de intactabilidade dos cabaços de ouro do papai, que mundo asqueroso esse dos diletantezinhos líricos horrorizadinhos com a falibilidade desta bosta de raça, seus indolentes sob o luz fedida deste sol doentio, fôdanse todos e a cabeleleira da tia alzira.


Sabe, um dia fui apaixonado por uma menina chamada Marina.
Não lembro direito minha idade. (Note o tom altivo e vagabundo do New Criticism.)
Puta merda, não me lembro nem da Marina.
Não vá cair da cadeira de tanto rir. É foda, eu sei. Porém também sinto saudade do beijo que nunca lhe dei. Pobre Nelson, a branquinha não caiu bem na carreira dele.
Lá se vão mais de 50 anos e então não tinha a mais ínfima desconfiança de que estaria aqui na internet, quase 11 da noite, a rememorar a vaga e oblíqua figura de Marina.
Oblíqua? Não, não conjeturava então que tais tipos de adjetivos pudessem vir boiando na crista da enxurrada que acabou de varrer a rua aqui em frente.
Ma, quero lhe dizer que estou aqui, que não mudei, sou ainda eu mesmo e não, não aprendi ainda a lição dos sentidos da vida que a nossa fessora quis me ensinar.
Já imaginou quantos paus d’água se afogaram enxurradas afora antes do advento da internet?
Tô tentando ouvir Bach mas tudo que consigo é Hendrix. Quero fazer parte duma Cruzada, empunhar um daqueles espadões de 30 kg que os brutos brandiam diante dos pescocinhos dos mulças. Quero me alistar na Luftwaffe, pilotar um Tiger de 40 toneladas rumo ao Institulo Lula.
Me poupe.


U know, eu não saberia mais viver sem este meu púlpito digital. Amiúde vejo-me assarapantado a pentear os fartos, hirsutos fios de cabelo da minha imaginação pensando, porra, como é que sobrevivi quase 50 anos sem a divina dádiva dos blogs?
Antes da internet eu sabia que o mundo era infestado de patetas masoquistas, mas só a internet pôde me presentear com tão vastas evidências. Vai ter idiota assim em Júpiter.
É por essas e outras que às vezes até me arrependo de rogar mais celeridade ao encontro com a dona Ceifadeira.
Quem diria, sou um espancador nato e não sabia.


Não entendo poeta que não bebe, não entendo poeta que chegue aos 80, entendo que ele não tenha feito poesia sobre o filho esquizofrênico morto há tempos; acho que estou começando a entender a poesia e a terei dominado no último instante, deitado (espero que não no hospital, espero que não recoberto por lençol macio recendendo a vida, pronto pra viagem), e pedirei que todos (todos? nem nessa hora serei sincero? não há nem haverá mais ninguém  ao meu lado e estarei conformado, talvez satisfeito, que me basto) se retirem para que eu e ELA possamos conversar a sós; ELA terá mil coisas a me contar, mas e eu? é provável que esteja então terrivelmente tímido como sempre fui, zeloso que estranhos desconfiem dos meus assuntos, possam puxar algum ponto dum fiozinho de que não me tenha dado conta; e falaria de que afinal? que é que se fala numa hora dessas a alguém desses? então saberei e evitarei ser frívolo como sempre sou e conhecerei o sossego que tantos e tantas me mostraram existir e nunca fui capaz de comprovar por mim mesmo e não estarei mais sozinho.


Você aí com esse narigão torcido olhando agora pra tela pensando what the fuck, será que deus não deixou nenhuma migalha pra mim?
A casta superior anda uma tristeza, nem na época do Adolf a coisa tava tão braba. Até recentemente a gente ainda podia descolar umas moedinhas perdidas nas proximidades da catraca do busão, do guichê do metrô, esses locais onde o vulgo costuma deixar o suor de seu trabalho em troca das misérias que nasceu pra engolir em suas vidinhas de lombriguinhas otimistas e assanhadas.
São 5 e caceta da matina e eis-me aqui com estes meus dedinhos irriquietos a restrugir mais um textículo eivado de engabelo e intrujice que assim que você acordar pra ler aí pelas 10 já terá se magnificado numa sonata insinuante que na certa enfeitiçará seu tio Nestor e os fantasmas que vicejam em sua consciência.
Fica decretado que este pedacinho do inferno digital se prestar-se-á como depósito de pensamentos grandes e profundos e forrobodós mentais que qualquer mané a se deixar apanhar pela rede nas madrugadas equivocadas movido pelas turbulências de seu travesso coraçãozinho tal como este desorientado guarda semovente metafísico que ora vos estarrece de pompa e beleza poderá servir-se deste nosso abrasível rincão esgotífero para elucubrar as mais antalógicas sacadas sobre os gênios que pululam neste planeta ou já se foram ralo adentro.


Humanidade,  cagada divina
Sirvam-se, senhoras e senhoritas
Registro mais recente: noite passada, por volta da dez e trinta, confesso que entrei neste blog para deixar mais um registro desta minha infeliz existência mas me abstive, pelo que dou graças por ter-me desencontrado em meu labirinto.



Já que ninguém se interessou e nem sua manicure entendeu minha piada sobre o ménage entre Lya Luft, Mia Couto e Andrea Matarazzo, com suaves participações e figurações de Cássia Kiss e Deborah Kerr, serei obrigado a contar um recente episódio que sofri envolvendo o pseudoescritor Luiz Inácio de Loyola Brandão certa feita quando ele foi convidado a servir de paraninfo (notem como evitei “convidado para paraninfo” e vejam como é que se escreve) em Américo Braziliense, terra natal de mamãe mas não é isso que vim testemunhar nesta ocasião e sim que acabei de chegar dum passeio com minha notável Zezeí, maldito amálgama de dobermann com chiuaua, quando me dei conta sem querer que o entregador de carne estava entregando num prédio aqui da vizinhança e o entregador de água estava entregando num outro prédio aqui da vizinhança e o entregador de pizza não estava entregando em nenhum prédio aqui da vizinhança porque são apenas 10 da matina e aparentemente ninguém aqui da vizinhança come pizza a esta altura da manhã e o entregador de correspondências estava entregando e o entregador de coca-cola e o entregador de gás e o entregador de jornal e o entregador de farinha e o entregador de panfletinhos do novo buteco que abriu ali na esquina quando me dei conta sem querer que entre tantos entregadores faltava o entregador.

Fósseis cibernéticos

Meus romances Amorokê, catapultado para a esfera digital há quatro anos
e O céu, cujos capítulos venho publicando paulatinamente
nesta rede em que tudo e mais um pouco vira farofa cibernética instantaneamente
escoando para dentro do voraçálico ralo
sensaborão da espetacular nadicitude
dos seres de palha digitais elióticos.
Ambos prosseguem impávidos em sua virgindade.
Se do escritor, inda que estrambótico,
a sina é criar para abantesmas sem alma
munidos de mouse e maps do google,
eu quero é que se foda.

Para quase ninguém

Só se sonhar com você.
Mas quem pode garantir
Se o guardião dos meus
sonhos dorme comigo?