Continua qualquer dia, acho

Chega de poesia por hoje.
No sir, os idealistas tendem a achar que sim, mas poesia não é resposta para tudo.
Sei que sou um chato.
E sou um chato não apenas neste blog ou online. Tenho longo currículo como The Weirdo. Pois absolutamente, ou quase, todo mundo ligado no literário -- e no cultural e no "filosófico" -- é mais, ou menos, avesso ao debate.
Todos querem fazer parte da brincadeira de teclar, responder, postar e ser respondidos impunemente, com uma certa leveza e até irresponsabilidade, sem maior consideração pelo que escrevem.  (Embora alguns se mostrem escandalizados quando O Outro o faz.)
Parecem sofrer dum estranho temor à reflexão. 
A maioria repele a elocubração. A maioria prefere a agilidade à demora, a superficialidade às profundezas. Vejo narizes se torcendo quando passo dum certo limite. E esse limite é extremamente baixo: se tento um tico de sofisticação, me têm por pedante. Se procuro fugir um centímetro do grotescamente rudimentar, me pensam exibido. Se destoo do coro da unanimidade burra, me acusam mentalmente de avis rara.

Sei que não atraio o interesse de quase ninguém. Pois não falo de assuntos "quentes" como Paulo Coelho ou a quebra do banco do Sílvio Santos.
Há um absurdo desperdício online. De ignorância, semipensamentos, cacos de palavras soltos pelo ar. E que  me deixa um travo amargo de futilidade e impotência. A experiência online é ao mesmo tempo fantástica e angustiante. Abre certas portas e fecha outras. Até aqui, e da forma como se dá a minha experiência, tenho encontrado muito mais portas fechadas que abertas. Ou que tenham pelo menos a chave na fechadura.
Ninguém está a fim de falar disso. Muito menos ouvir. Mas dou um conselho à meninada que pretende escrever pra valer e não apenas brincar de Machado: habitue-se a escrever para as paredes. Como faço aqui.
Repito, repito e repito que o escritor tem de aprender a ser seu próprio público. Escrever -- ou aprender a -- é um ato de atroz solidão. Não tenha medo do que pensem de você. Melhor ainda, não tome conhecimento do que dizem a seu respeito. 
Para a molecada para quem a vida online é natural como coçar a cabeça, duvidar da experiência online é o mesmo que falar grego. Quando nasci a espetacularidade da tecnologia já estava presente. Cresci acedendo e apagando luzes, fazendo exames de raios-X, viajando com a cara ao vento no DKV cinza e branco ao lado do meu poderoso papai que tudo sabia (os alunos agora são os pais), telefonando aos berros para mamãe a 150 km de distância quando nas férias me deixava com minha tia na casa do Forte perto de São Vicente.
Mas ter nascido na crista do avanço tecnológico não me impede de indagar aquém. Uma das minhas dúvidas mais constantes é: somos mais felizes agora do que eram aqueles pobres homens e mulheres do século 19 para trás, desprovidos de água potável na torneira, antiácidos, iluminação, comunicação e gratificação instantâneas?
Quando discuto isso com algum amigo, as posições indefectivelmente se dividem. São todos unânimes em dizer claro, temos muito mais felicidade agora com todos esses "auxílios" do que quando não os tínhamos. Ao mau passo que eu fico lá parado, absorto em especulações, duvidando se a nossa existência se beneficia mesmo de todos esses magicamente fascinantes penduricalhos. (Nas minhas incertezas, duma coisa estou certo: estaríamos bem melhor se nos livrássemos da TV.)
E, quer você se espante ou não, houve um tempo longínquo em que ser feliz não era nem de longe o objetivo principal da raça. Mas essa é uma história ainda mais longa e fica pra outra.
Certo, qualquer um pode contraargumentar que a espantosa esticada na longevidade nas últimas décadas é prova inconteste de que as mágicas modernas, entre elas a  medicina dos superpajés e seus aparelhos maravilhosos, decidamente trazem vantagens e colocá-las em dúvida seria indesculpável leviandade.
Também acho a leviandade indesculpável e procuro ficar longe dela sempre que posso. (Um dos mais difíceis desafios a que me proponho no dia a dia, em geral com resultados pífios.)  Mas o número cada vez maior de pessoas ultrapassando a barreira dos 100 anos me deixa com o pé atrás, para usar uma expressão original. E sou testemunha ocular: mamãe quase chegou lá e posso afirmar que nem ela nem eu gostamos da brincadeira. 
As chamadas "clínicas da eutanásia" abundam na Holanda e na Suíça. Dar cabo da própria vida nesses spas macabros custa o olho da cara. Mesmo assim vivem lotadas. Li certa vez o relato dum ancião americano de 90 e poucos (ancião? que demodê), em que ele lamentava: "Tomei remédios a vida toda para não morrer e agora, quando não suporto mais viver, preciso de um para acabar com tudo".
Se de fato vivemos num tribunal e provas são tudo que conta em nossos processos, então é difícil desprezar a evidência documental desse relato. Até que idade a medicina poderá nos levar? Podemos um dia chegar aos 200 com o corpo relativamente são? E se chegarmos, como estaremos de cabeça? Nossos neurônios ainda funcionarão? E nossos filhos, suportarão a cruz de nos carregar indefinidamente ou o sistema erguerá superasilos à prova de suicídio para os supervelhos? E nossas sensações tácteis? E nossos sentimentos? Teremos saudade da infância? Seremos ainda capazes de lembrar que tivemos uma? 
Mas todas essas questões dizem respeito ao futuro. E o futuro não está entre minhas maiores preocupações. Meu futuro concreto, tangível, são meus dois filhos. Que já estão passando da hora de gerar sua própria prole. França e Japão, entre outros, já enfrentam graves problemas de população envelhecida. O Japão degreda seus velhos em casas de "repouso" (o rei de todos os pleonasmos; a última coisa que velho com saúde quer é repousar) para que não atrapalhem o vídeogame da garotada. Os franceses são mais e mais intolerantes com crianças. Se você tem filhos e quer alugar um apê em Paris, esqueça. Ou seja rico.
O que me fascina, roubando meus pensamentos mais lúcidos, é o passado. A História. As únicas evidências materiais do que fomos e somos. E nesse passado que me interessa as pessoas viviam em média 50 anos. Se eu acreditasse em deus, decretaria, sem medo de errar, que essa é idade que Ele planejou para seus trágicos brinquedinhos humanos. De sua parte, gênios agraciados com dons divinos tinham maior carência. Michelângelo, mesmo sem vacina antigripe e plano de saúde, chegou aos 89. O homem comum, aos 30, atinge seu prime e a idade da razão, ganhando mais 10 de lambuja para decidir se sua vida ou não foi em vão. Naquela época a mulher era dada em casamento aos 10 e exercia plenamente a exclusivíssima missão que lhe foi designada pela Natureza: procriar. Certo, se alguém lesse esta postagem, diria que se trata duma provocação temerária. Non-sense. Depois do feminismo, da mulher de hoje, etc.
Mas só um imbecil negaria que a mulher é antes de tudo uma máquina de procriar. A diferença é que a mulher moderna quer "fazer parte", ter uma profissão, ser dona de sua própria sexualidade e de seu útero, dispor da prerrogativa do acasalamento. Nada contra, obviamente. Mas me pergunto se o preço não é alto demais. 
E quem quiser pode facilmente estender implicações similares a outras áreas da experiência humana. 

Escola de cínicos VIII

Um, dois,
Fecho os olhos, conto até cinco.
Se reabrisse agora,
te veria?
Se me esquecesse assim, talvez
você me cutucasse dizendo,
acorda!
Conto infinitamente até sete,
durmo.
Vou até oito,
me perco.
Tenho medo de terminar a vida assim.
Abro os olhos.
E não te vejo.

Andança à noitinha



Passei diante da empresa
Uma forte luz foi acesa
Pelo "detector de presença"
Pasmo, pensei "que surpresa!"
Esquecido de que existo

Dever preciso dever

Na última madrugada,
que passava quase, 
a hora chegou da troca 
da guarda a escorrer.


A troca da guarda dá-se assim: 
este mundo se vai (aonde? que sei eu?) e outro que breve habitarei toma dele o lugar a derramar-se. Não dura o revezamento prazo regular - às vezes é coisa dum segundo, outras,  um mundo pode jorrar.


Às vezes, é mais fugaz que o fechar das pálpebras na morte. 
Outras, é lento feito o abrir dos olhos no nascimento (o vertedouro).


Outras, impercebido qual o crescer duma árvore.
Outras, chocante, inacreditável qual o mais arrebatador dos transbordantes cogumelos de Hiroshima.


Naquela última madrugada, 
que já quase passava, 
quando a hora chegou da troca 
do meu turno, o previsto 
(aparentemente conforme 
ele mesmo) se pôs enfim a brotar.


Deu-se o revezamento por tempo indefinido. Suficiente para reafirmar a mim meu compromisso a gotejar.


(O pagamento. Devo, 
devedor nasci. Pago? 
Duvido. Devedor 
morrerei.)


Pois
Entre a lâmina espasmódica
E a fundura indevassável
Do oceano
Havia naquela madrugada
Teu rosto a reverberar os reflexos
Do mistério

Thank god, minha verve não morreu, ainda

Sim! Você aí! 
Resfolegante!
Cerrando os punhos!
Querendo briga!
Querendo vida!
Buscando ar!
Provando sangue!

Sim, caralho!
Você aí!
Você mesmo!
De músculos retesados!
E aquele infinito
Grito engasgado
na garganta!

Diga, desgraçado!
Lendo minhas postagens
Arrumadinhas
Comportadinhas
Bunitinhas
Enfeitadinhas
Embucetadiças
Vomitórias

VOCÊ ACHA QUE FOI PRA ISSO QUE
 NÓS POETAS FILHOS DUMA
 PUTA INVENTAMOS A 
LITERATURA?

Bye-bye Mummy

Bye-bye Mummy
I'll see you no more
as you never saw me


bye-bye Mummy
we didn't get too far
we didn't get too close


bye-bye Mummy
I'm here to say I loved you
I long to hear you love me


bye-bye Mummy
look me in the eye
tell me I'm not lost


bye-bye Mummy
I don't know what to say
I don't know how to feel


bye-bye Mummy
You didn't get to know me
we were not meant for each other


bye-bye Mummy
I wish I could fly
I wish I could hide
I wish I could slide
I wish I could die
I wish you could sigh
I wish this was only a rhyme

Prece


Senhor, sei que meu cartaz
conTigo está em baixa.
De fato, não rezo há... bem,
o Senhor certamente sabe há quanto
tempo
não rezo. E naqueles
distantes dias idos
da infância, quando rezava,
rezava sem convicção, mexendo
mecanimente – ai, Senhor, quão
mecanimente era! – os lábios,
os impolutos pensamentos fixos nas
tenras tetinhas da Sílvia ou no
rechonchudo bundão da
Regininha.
Ai de mim, ó Deus, sou um caso perdido, o
pecado é minha vocação, o inferno,
meu fado, sim, não mereço
Vossa trela ou atenção.
Entretanto, ó glorioso Javé, ciente de
que Vossos desígnios são insondáveis, Vossa
paciência, infinita, Vossa misericórdia,
infalível, venho hoje humildemente
a Vossos pés implorar.
ó Grande, ó Ser que reinais soberano
sobre tudo que há neste vasto
universo, eu Vos peço: agora que os
astrônomos
estão finalmente determinando
com razoável certeza a existência
de outros corpos celetes semelhantes à
nossa Terrinha, seria pedir demais
que o Senhor nos desse um
tempo
e fosse azucrinar a vida
de algum outro planeta por
esse mundão afora?

Buracos e sombras


A Neguinha curtia buracos e sombras
Onde se enfiava por qualquer pretexto
Para que fizéssemos de conta que ela não existia.

Será que ainda curte suas fugas?
Não sei se uso os verbos no presente, pois
A Neguinha não tem o perfil dos resistentes
(Exatamente como eu)
A Neguinha não tem o perfil dos resistentes

Era fraquinha
Velhota
Arredia e desiludida
Sempre pertinho do seu previsível destino.
Será que já chegou?
Ou amanhã aparecerá do nada, como se voltasse de viagem
Ou dum breve passeio até a esquina?

Não era dada a essas coisas, a Neguinha
Viagens, passeios e que tais
Só se fosse na imensa, onírica segurança da sua caixa de papelão
Onde curtia fugir
dos seus inimigos reais e imaginários
Monstros que, ela nunca sabia, podiam atacar sorrateiros

A Neguinha vivia alheia
Estava aqui, mas só no faz-de-conta
Queria estar em outro canto
Um que fosse só dela

Eu também tenho inimigos reais ou não
Eu também me enfio em buracos
Eu também curto me perder


Tchau, Neguinha

Escola de cínicos VII

Houve formidável explosão
ao nascer do dia
pombas não bateram asas
rumo ao céu plúmbeo
sabiás não trancaram os
bicos ressabiados
bebês não caíram no choro
instintivamente certos de
que o fim estava próximo
nem um grão de poeira
mudou de lugar
tampouco alguém ergueu-se
na cama tampando os ouvidos
em indistinto desespero
ante iminente desabamento
do teto
quando, sob formidável explosão,
o dia nasceu

Escola de cínicos VI

Mesmo o mais conformista dos homens, que
sequer se espante que nasçam anencéfalos ou
que existam estações no ano ou jamais se
interrogou sobre os estapafúrdios gafanhotos
haverá de concordar:
há algo de estranho em nós

Somos todos passíveis duma recaída concretista



n
un
cadi
ganun
canunca
digasempre
semprediganun
ca sempre diga sem
sempre nunca sempre
nunca nunca sempre sempre
sempre nunca nunca nunca nunca sempre
sempre sempre nunca sempre nunca sempre diga
diga nunca nunca sempre sempre diga nunpre semga dica
nunca dipre sempre nunga nunca semca sempre diga nunca diga diga
C
L
O
A
C
A

Escola de cínicos V

Mal abriu os olhos de manhã viu que aquele não ia ser um dia fácil. Sentiu a boca seca – seca como nunca estivera antes.
“Água”, pensou automaticamente, chacoalhando a cabeça para espantar os pesadelos da noite maldormida. Estalou a língua áspera, procurando um pouco de conforto. “Preciso dum copo d’água”.
Se levantou, se vestiu, foi ao banheiro, comeu um pãozinho com margarina e acabou se esquecendo da sequidão na boca.
Quando saiu de casa os lábios abriam e fechavam espontaneamente, suplicando por algo líquido. Mas na correria para apanhar o ônibus, se espremendo entre os passageiros em pé no corredor do ônibus, suando frio, maldizendo a lentidão do trânsito, torcendo para que seu ponto chegasse logo, tornou a se esquecer da sede atroz.
E assim prosseguiu durante todo o resto do dia. Mal a sede dava sinais de que ainda não fora saciada, ele se via subjugado por uma das centenas de pequenas injunções que nos acometem no dia a dia e acabava por deixar de lado a secura da boca.
Ao voltar para casa à noitinha, tateando penosamente os bolsos em busca da chave, abrindo a porta, indo para a cozinha, sentando-se numa cadeira diante da mesa, esfregava a garganta, atormentado sob as lembranças daquele dia. “Puxa”, pensou, espantado, “não acredito que atravessei toda essa via-crúcis sem me lembrar de matar a sede.”
Nisso percebeu que diante dele, na mesa, havia um copo d’água. Sentiu um espasmo na garganta, um espasmo doloroso. O copo parecia apresentar um ultimato: ou aproveitava aquela chance ou caía morto de fulminante sede.
“Pois então é agora!” Sentiu os olhos marejarem de ansiedade.
Começou a estender o braço em direção ao copo quando viu algo estranho surgir de algum lugar debaixo da mesa, voando em sua direção. Recolheu o braço, acautelado. Que troço era aquele? Quando a coisa suspeita se aproximou, deslizando suave e silenciosa, até parar exatamente sobre o copo, viu que era uma nuvenzinha.
Confuso, ele pôs a mão espalmada sobre os lábios ressequidos, tentando apaziguar a ânsia de beber. Esticou o pescoço rumo à nuvenzinha para examiná-la mais de perto. Era escura e, apesar de ínfima, de aparência ameaçadora.
De repente, para sobressalto dele, um relampejo escapou de dentro da coisa e um raio atingiu o copo. A fulguração iluminou a penumbra em torno da mesa por um átimo. Assim que o brilho desapareceu, um pequeno estrondo assemelhado a um trovão ribombou distante. Então a superfície do copo se agitou e ondas se formaram, encrespando ominosamente a superfície da água.
Alguns segundos se passaram. De repente, um novo raio cintilou do âmago da nuvenzinha, seguido dum novo trovão, seguido de uma saraivada de outros raios e trovões. A nuvenzinha começou a rodopiar, girando furiosamente em torno do copo, como se fustigada por formidável ventania. O copo estremecia sobre a mesa, parecendo prestes a tombar sob o impacto das ondas que se agigantavam indômitas. Às vezes alguns pingos se desgarravam do interior do copo para serem absorvidos pela toalha da mesa.
Entre maravilhado e perplexo, ele ficou inerme, se limitando a observar o insólito espetáculo. De súbito, tão inesperadamente quanto como surgira, a agitação começou amainar e a nuvenzinha se afastou, voando de volta até desaparecer por sob a mesa.
Assim que tudo voltou ao que era antes, a sede tornou a dar sinais de que ainda estava lá. A língua recomeçou a estalar, a secura dentro da boca voltou a incomodar. Ele estendeu novamente o braço em direção ao copo, agora rápido, antes que a nuvenzinha pudesse ressurgir mais uma vez. Levou o copo aos lábios e o entornou boca adentro, sôfrego

Vejo o fim a olho nu


(Parágrafo único)
Senti uma ventania estranha hoje.

E à tarde saí pra zanzar um pouco pelas ruas, de repente soprou essa estranha lufada de vento.

Okay, já vi lufadas como essa antes e sei que são meros fenômenos meteorológicos.

(Se bem que fenômenos sejam sempre fenômenos e não devemos menosprezá-los.)

Então como que senti que o vento me tirava do meu rumo (se é que tenho um), me voltando sempre para uma direção. Tentei resistir por uns segundos, até me dar conta de que não tinha escolha senão renunciar ao meu livre-arbítrio.

(Adeus, conectivos, por ora)
Deixei que a ventania me guiasse como se eu não mais comandasse meus passos.

(Serei firme até o fim)
Assim como se uma luz repentinamente brilhasse para me iluminar, vi, claramente como a luz duma estrela, qual era o destino da minha ventania.

Você já andou de trem, ouviu a buzina dum navio partindo, ensurdeceu sob as turbinas dum jato?

A paixão pelo desconhecido, que risco poderá me trazer?
Sou e sempre serei meu próprio desconhecido. 
Posso continuar me desconhecendo e tampouco saberia o que causo em mim.
Se tudo que posso é me imaginar num baile de máscaras, alheio à mútua identidade, indiferente à minha mútua verdade.

Você, desconhecido, tem seu mundo. Eu, em seu mundo, não tenho o meu.
Veja, sempre sairei perdendo.
Não basta como consolo?

Escola de cínicos V

A teus pés me prostro, Serena Besta da
Solidão, para participar que está formada
a rede dos solitários, em cada canto da
cidade um facínora de si mesmo

Tua luz, efulgente, explode e nos cega
e assim nos conduz dóceis por
tua própria escuridão

Escola de cínicos IV


Peguei o nenezinho no colo, indizível
inquantificável fragilidade, massinha branca
de creme tenuemente sustentando os
ossinhos em minhas mãos gigantes. E se
lhe torcesse o pescoço num só golpe?
Quanta dor poderia poupar a uma criatura.

Escola de cínicos III


ter de quebrar as leis da vida como quebramos
a lei da gravidade mesmo que seja para mexer
um dedo e não atrofiarmos antes do tempo. Mas
ao contrário da nossa condição de transgressores
da física, que nos faz rebeldes por princípio e
circularmente estabelece nossa condição,
permitindo-nos exercitar os músculos e crescer –
mas agora desprovidos da pureza intacta que
tínhamos antes de tudo –, viver não exige outra
condição senão não morrer

Devaneio sob o papagueado de náufragas maritacas

Manetas intimidados nos demos as mãos, cegos desenxabidos nos olhemos nos olhos, surdos seletivos nos escutemos em meio à algazarra dos foliões e, desesperançados desamparados,  aguardemos, qual fiéis filhos da Mãe Gentil, que a redentora manhã nos livre desta nossa lambuzada solidão.

Escola de cínicos II


O escritor devagar
dotado de grande, fino talento
e lábia esperta espetacular
grafava mixto com x e acento
aos ricos, se vendia por ouro
às damas, micava com as pretas
com a língua brigou feito mouro
e lançou-se a feias mutretas
até ser aceito hors concours
na Academia Brasileira de Letras

Insuficiência lírica

Hoje acabei de consumar algumas ideias que vinha desenvolvendo suavemente dentro do meu cabeção endomorfo.
Bem, acho que descobrira fazia tempo.
A saber: as razões pelas quais a maioria das pessoas pensa gostar de poesia.
Não vou enumerar nenhuma, obviamente.
Mas franzo a testa ao ouvir gente dizendo que gosta de poesia.
Poesia não é para ser gostada.
Poesia não é couvert, vestido, mulher amada.

Bem, não foi bem uma descoberta.
Mas, sim, redescoberta.
Estranha mesmo assim.
Pois que me esquecera.
Como sempre ocorre com as pouquíssimas coisas boas que aprendi da vida.

Pouquíssimos sabem o que é poesia.
Pouquíssimos sabem o que é poesia porque poesia requer uma visão e uma atitude amadurecida da existência.
Ao contrário da crença difundida por portais de relacionamento e blogs literários em geral segundo a qual poeta bom é o poeta que não tira os olhos da infância.
A capacidade de manter presente a infância na idade adulta é uma vantagem, naturalmente.
Sobretudo se a essa capacidade aliarmos outra: a de observar como vamos mudando à medida que crescemos e como nossa concepção da nossa infância também muda com nosso crescimento.
Essas duas capacidades, sim, dão ao poeta um belo filão para começar.

Isso não significa que eu goste de poesia.
Às vezes, sim, outras, não.
Me parece mais um, digamos, problema pessoal.
Há uma certa poesia que me incomoda.
Não no sentido em que é justo e até necessário esperar que a poesia incomode.
Ainda não firmei convicção a respeito.
Talvez tenha a ver com o incômodo que os autores desse tipo de poesia me causam.

Hoje também lembrei duma descoberta que fiz ainda precocemente na infância.
A saber: gosto de dar tchau, seja de perto, seja de longe.
Pode parecer natural; muitos gostam de dar tchau.
Só que, no meu caso, detesto dar oi.

É esse afã que tenho, também desde muito cedo, de cair fora abruptamente.
De onde quer que esteja.
Com quem quer que esteja.
Esse meu afã – outra descoberta – me dá um tico de sossego.
Como que um alívio.
Como se de repente descobrisse que alguém à minha volta tem lepra.

Gosto de brincar.
Sobretudo comigo mesmo.
Só comigo mesmo.
Serei autolúdico?
Tenho princípios e definições muito particulares sobre as coisas, o mundo, as cadeiras estofadas.
Tem dia que gosto de parecer antipático.
Mas ainda não aprendi a parecer pegajoso.

Já nos conhecemos?
Se já, responda com verbos transitivos.
Sem indiretas.

Sou daqueles que falam na lata.
Que somem sem deixar bilhete.
Que desistem sem aviso prévio.

Não sou de suposições.
Não sei fazer suposições.
Mas hoje preciso fazer uma.

Hoje gostaria de poder supor que falo com alguém.
Hoje gostaria de poder supor que falo com alguém com quem vivi por toda a vida.

Foi tão estreita convivência, que houve um dia em que mal reparamos que trocávamos sentimentos, que trocávamos identidades como se trocássemos germes.
E que nossas trocas raiaram a irresponsabilidade.
Recebi e transmiti sentimentos e identidades tão deletérios quanto latas formigando de ebola.

Me amarro na ideia da morte.
Meu poeta preferido, obviamente, é Augusto dos Anjos.
Sou obcecado pela extinção (de mim mesmo e dos outros).
Pela aniquilação.
Pela destruição.
Pela deterioração.
Pela devastação.
Pela ruína.

Me devoram germes altamente infecciosos.
Quem conversa comigo por meros dois minutos sai por aí cantarolando alegremente as delícias de esticar a canela.

Tenho outros defeitos mil.
Um dos piores é minha mania de proferir obscenidades.
Só para escandalizar.

No fundo, e no raso, sou um moleque.
Com todas as desvantagens que moleques têm: irresponsabilidade, frivolidade, arbitrariedade, crueldade, irreverência, vaidade, amor por caprichos, astúcia, fantasiosidade.
Como hoje estou bonzinho, vou superar minhas deformidades de caráter só por um instante para alertar meu solitário leitor:
Cuidado: sou, acima de tudo, eu mesmo.
E quando sou eu mesmo, saio por dentro de mim procurando poesia e, pior, fazendo.
Ou tentando.

A aranha e o pernilongo

O pernilongo era altão, gorducho e usava uma barba à la Tolstoi. Mas, estranhamente, apesar de baitão, barbudão e o cacete, não o enxergavam direito. Até falavam dele no diminutivo. Ele próprio, embora grandalhão, gostava de pensar em si assim petitico.
Como se pode ver logo de cara, a vida do pernilonguinho era cheia de antíteses. Dum lado, um montão de ão ão ão; doutro, só inho inho inho. Dum lado, um glutão; doutro, sozinho. Dum lado, um vozeirão; doutro, perdidinho.
Coitado do pernilonguinho; tudo que se referia a ele era tão extremado. Por que será?
Ninguém sabia.
Era muito doidão aquele pernilonguinho.
Num dia, quase se matava de tanto trabalhar; noutro, exausto, dormia, dormia e dormia num cantinho escuro da parede, até se encher do mais terrível tédio de que um pernilonguinho podia se encher.
Então acordava cuma fome de vampiro, disposto a chupar até a última gota o sangue da primeira vítima que lhe cruzasse o caminho. Nessas horas, não distinguia raça, cor, credo ou   tipo de sangue. Podia ser a eguinha que camelava no estábulo ao lado, podia ser a leitoazinha que ronronava no chiqueiro em frente, podia até ser a gatinha que, encarapitada no cume mais alto telhado, não parava de miar pros gatões que a espiavam cuns olhões deste tamanho da laje do vizinho. O pernilonguinho queria era devorar.
Mas, pobrezito, as bichinhas que ele tava a fim de devorar se punham tão, mas tão inacessíveis.
A eguinha era casada cum jumento que, só para fins de rima, era muito ciumento e bem capaz de lascar uma rabada letal no incauto taradinho.
A leitoazinha nunca parava de chafurdar na lama e estava cada dia mais difícil para o pernilonguinho achar um pedaço de couro razoavelmente limpo onde pudesse meter sua tromba.
E a gatinha vivia rodeada de temíveis felinos que eram extremamente ágeis, mesmo traiçoeiros, capazes de destroçar o pernilonguinho numa só patada.
Tadinho do nosso amiguinho. Tão sozinho. Tão fraquinho. Tão esfomeadinho. Seria uma tremenda perda para a pernilonguidade se a Mãe-Natureza o deixasse esticar de inanição as longas canelas.
Então, a Mãe-Natureza, que era muito, mas muito esperta mesmo, certa noite escura qual miolo de carvão cochichou ao ouvidinho dele: "Escuta, Pernil" (Sei que vocês vão estranhar que a Mãe-Natureza desse um nome desses a um pernilongo; tudo bem, podem estranhar. Mas que faz sentido, faz.) "Escuta, Pernil, por que é que você não acorda dessa sua sorumbática sonolência e dá uns rolês por aí? Quem sabe tu não descola uma pernilonguete dando sopa somewhere somehow?"
Na manhã seguinte, nosso amigo pernilongo acordou cedinho e, bidu, teve uma idéia: "e se eu desse uns rolês pela night pra ver se topo cuma pernilonguinha dando sopa opa opa? Não custa tentar. E seria melhor do que ficar esperando a chegada de Dona Morte neste meu cantinho tão escuro, nesta parede tão, ui, gelada".
Assim pensando, nosso companheirinho voltou a dormir, só acordando com os primeiros raios da noite. (Vocês vão estranhar etc.)
Numa só esvoaçada, ele se acercou do leito de mamãe pernilongona, deu na véia uma beijoca muito comovida e se despediu anunciando, não sem um ou outro soluço de pesar, que enfim chegara a hora de conhecer o mundo. Mamãe pernilongona, que estava à beira da morte, se limitou a virar pro outro lado, resmungando "vai se foder" ou algo carinhoso assim. (Bom, vocês já perceberam que a vida do pernilonguinho, pra chegar a inferno, tinha de melhorar pacas.)
E lá se foi nosso camaradinha batendo asinhas no breu da noite a zanzar pra tudo que era lado. Ai, como bateu perna, digo, asa o bestinha. Ia daqui pra lá, de lá pra cá, e neca de pitibiriba.
Não avistava nenhuma femeazinha, barata, vagaluma, joaninha ou tatuzinha que fosse, que se mostrasse um tiquinho disposta a deixar que ele tirasse umas lasquinhas. Não, não era por falta de "material".
Na verdade, tava assim ó de inseta na night tépida e azulada do mundo. Era inseta de tudo que é cor, tamanho, idade, altura, baixeza, textura e temperatura que vocês possam imaginar. Algo chamou de pronto a atenção do pernilonguinho: as insetonas eram, em sua grande maioria, insetonas oxigenadas, o que, claro, deixava nosso amigo muito, mas muito encafifado mesmo.
"Por que será", pensava ele com os botõezinhos de sua camiseta cor de gengibre, "Por que será que a insetaiada por aqui tem essa mania de fingir que nasceram na Noruega? Será complexo de inferioridade cultural? Ou então vai ver, de fato descendem dos vikings?"
E havia ainda outra coisa que intrigava nosso querido pernilonguete: a maioria das insetonas vivia rindo e levava debaixo do braço um álbum de milhões de fotos e cada uma das fotos mostrava a insetona e uma cacetada de outras insetonas suas amigas e em cada uma das fotos todas elas riam e riam e riam e riam como se se mijassem nas calças, e o nosso pernilonguinho, mais e mais encafifado, ia se perguntando, "Caráleo, do que é que essa insetaiada ri tanto? Só eu é que não sou feliz nesta merda?"
(Cá pra nós, que o nosso chegadinho não nos ouça: e se fosse mesmo verdade? Digo, e se ele de fato fosse o único serzinho infeliz daquela merda? Uuuui, dá calafrio só em pensar em tão medonha possibilidade.)
E, como se não bastasse, as insetonas e os insetões cultivavam um estranho hábito, que para o nosso pernilonguinho constituía o mais insondável dos mistérios: muitas das insetonas e muitos dos insetões gostavam de se agrupar em clubinhos que eram batizados de nomes muito esquisitos sob os quais havia umas descrições ainda mais esquisitas. E com que fim as insetonas e os insetões se reuniam em tais clubinhos? Pasme-se: eles se reuniam nesses clubinhos simplesmente pra zumbir, zurzir e arengar merda.
Mas não era uma porcariazinha aqui e ali, só de vez em quando, não: era merda pra ninguém botar defeito, merda pra servir de esterco pra dez bilhões chinas, merda a dar co pau, merda a mais não poder, merda, merda e merda e mais merda sem fim.
E, como se não bastasse de novo, os carinhas e as caretas falavam esse monte infindável de fezes sem respeito algum pelo vernáculo, pela lógica, pela compostura e pela moda recém-lançada na Fashion Week.
Para o nosso espantadiço heroizinho, se tratava de crime inafiançável. Não era possível confiar em insetonas e insetões incapazes de reconhecer a primazia da língua sobre todas as outras coisas e da lógica sob a língua. A montanha de cocô que os membros daqueles horrendos clubinhos vomitavam uns sobre os outros sem observar as mais reles regras da gramática e do estilo davam ao nosso pobre amiguinho os mais intoleráveis engulhos que ele já sentira em toda sua efêmera existência.
Ô boçal insetalha! regurgitava, atormentado por atrozes aferroadas em várias regiões de seu barrigão estufado de hemoglobinas com álcool etílico a 40º.
Sempre perambulando mais doidinho que galinha sem cabeça, buscando um ombro amigo onde pudesse pousar e descolar uma chupadinha, pois estava quase morto de fome, nosso infeliz serzinho alado viu-se num dilema: ou retomava o caminho de casa e seu cantinho escuro na parede úmida e sua mãe pernilongona que jazia moribunda no leito de morte, ou fechava os olhos, tapava o nariz e aterrissava num dos horríveis clubinhos, levado pelos golpes de sorte e azar do Capitão Destino.
"Que fazer?" se perguntava, imitando o vozeirão rouquenho de Lênin na época em que este ainda era amigo de Trótski.
Depois de 6 segundos de longa ponderação, o pernilonguinho finalmente se decidiu pela segunda alternativa. Quem sabe o Capitão Destino não tinha acordado bem disposto aquele dia e resolvera salvar do tédio mortal um pobre representante da subordem nematocera?
Assim pensando, nosso marjorzinho exclamou "Fôdasse!" e, tampando bem os olhos e o nariz, mergulhou de cabeça. Seja o que Papai Pernilongão do Céu quiser!
Mal aterrissou, caiu em estado de torpor por 3 dias, cismado, espiando os próprios pensamentos beeem lá longe, muuuuuito vagos, virando-se pesadamente para os lados, sem saber se dormia mais um pouco ou se acordava de vez.
Como estava esfomeado, decidiu-se de novo pela segunda opção. (Em sua superstição pernilonguícica, imaginava tolamente que a segunda era sua vez da sorte. Que tonho se mostrava nosso zombeteiro protagonista!)
Tremendo de medo, abriu os olhos devagarzinho. Com muita discrição, estudou os arredores.
Onde estava, afinal?
Sim, definitivamente era um daqueles famigerados clubinhos de insetões parlapatões. Sentiu o coraçãozinho gelar.
"Papai Pernilongão que estais no Céu, tenha dozinho de mim. Se é chegada a hora, que seja rápido. Nada mais peço".
Ainda com tremores nas longuérrimas pernetas, equilibrou-se sobre as patinhas e tentou ler o nome do clubinho. A noite estava particularmente escura e seus olhinhos não podiam enxergar direito. Logrou ver apenas que fazia referência a uma obscura relação entre inteligência e apetite sexual.
"Ih!", já ia se arrependendo nosso pobre amiguinho. "Não foi desta vez que o Capitão Destino teve pena de mim".
Dizendo isso, deu de ombros e sentou-se numa poltrona. Já que ali estava, ali ficaria. Fosse o que o pernilomônio quisesse. Tinham se exaurido suas parcas forças para retomar a infindável busca.
Um tico mais calmo, resolveu assuntar quem eram os demais membros do clube.
Como não poderia deixar de ser, quase todos insetões fakes. De autênticos, só ele próprio e uma orientalzeta de nome ilegível e país de origem enigmático que atendia por um nome impronunciável e que era nada mais nada menos que a mulherzinha mais lindinha de toda a night azul-aboborinha.
Como não poderia deixar de ser de novo, nosso pobre bichinho de chofre caiu de amores pela misteriosa fofinha de olhinhos puxados.
Como ele sabia que ela era fofinha?
Simples: um dia, sem querer, ela deixou seu álbum de fotos aberto no balcão e, mesmo morrendo de medo de ser flagrado fazendo o que não devia, nosso pernilonguinho foi lá e constatou in situ que aquela era uma insetinha de primeira. Não se passaram nem bem 2 minutos e lá estava o bocozinho urdindo uns versinhos mancos para a gostosilda, pois, além de esfomeado e besta, o idiota ainda tinha pendores poéticos.
Assim, trespassado pela flecha do amor, nosso heroi veio a perder totalmente o sono que já lhe era tão escasso. Passava as noites em claro, esmerilhando o teclado em viscerais poemas melecados de sangue tipo O e lágrimas sem sal. Era [impronunciável nome japonês] isso, [impronunciável nome japonês] aquilo, [impronunciável nome japonês]inha, [impronunciável nome japonês]rão, [impronunciável nome japonês]nilda, e a donzelinha só dando uma de boba, querendo saber quem era ele de fato, de onde a conhecia, essas bobagens que as insetas fresquinhas insistem em saber nesses casos.
Enquanto isso, nosso pernilonguinho só mandando bala. Noite e dia, dia e noite se derramando para a nipônica deusdede e ela se derretendo, mas sempre com um pezinho tamanho 33 atrás.
Até que, passados uns 10 dias, nosso bobinho amigo pediu, com toda singeleza de que era capaz, que [impronunciável nome japonês] lhe desse pelo menos uma fotinha tirada especialmente para ele, em troca dos quilos de versos melados que vertera em sua homenagem.
Ante o pedido, a sirigaitinha limitou-se a rir, dizendo que não tinha nenhuma câmara fotográfica. Extremamente desapontado com tamanha ingratidão, nosso pobre pernilonguinho mandou [impronunciável nome japonês] à merda e prometeu a si mesmo que nunca mais tornaria a teclar um á sequer por uma inseta, não importa quão gostosa ela fosse.
Sendo dado a poesia e outras baboseiras mais, é claro que o tonto descumpriu a promessa na primeira oportunidade. E que oportunidade foi essa? Bidu, foi o momento em que a solerte Dona Aranha a que nos referimos no título (lembram-se? Ou terão já esquecido?) um belo dia deu as caronas no clube, paralisando mais uma vez o descontrolado coraçãozinho de mel do nosso pobre imbecilzinho.
No próximo capítulo veremos como nosso azarado insetozinho logrou escapar por um triz das garras da famigerada Aranhazona que mais parecia uma anta hermafrodita que habitava as trevas da night azulada e que por diversas vezes chegou perto, muito perto mesmo de deflorar o rabinho do nosso desafortunado protagonista com um dos seus dedões médios de quase 30 cm cada um dignos dum sádico, desvairado proctologista.

Veremos, ainda, que, por sua orientalzinha de sorriso sol-nascente e impronunciável nome japonês, o pernilonguinho quebrou ainda mais promessas, se deixou humilhar, rastejou, comeu o pão pullmann que o perniabo amassou e muitas peripécias mais. E que tentou – ó, como tentou – cair exangue em seus bracinhos lácteos qual glóbulos mais brancos que testa de cadáver.