Blogando 0047


Quando estou indo desmaiar
Adoro escrever teu nome

Nem quero soletrar direito

Não quero ser bem-vindo
Quero ser maldito

Mais que querer, sou

Não adianta  insistir

Estou desmaiando?

Não, desmaiar é bobagem

Preciso cuidar da minha reputação

Cansei que me vejam como alucinado

Não quero que me vejam como coisa nenhuma

Uau, até que estou conseguindo digitar direitinho

Sou uma peste

ACHTUNG!

Gamo o idioma e a literatura alemães

Tchibung

Blogando 0046

Parado
Na esquina
Da avenida
Só peço ao
Meu deus
Cujo Deus
Se Esqueceu
De o criar
Que não me vicie em felicidade.

Alberto


Fui incoerente, não fui?
Cara, tenho nojo de quem dá lição e não vou lhe dar.
Simplesmente veja os dois contextos em que eu disse uma e outra coisa...
...e veja se faz sentido.
Pra mim faz.
Mas, olha, fazer sentido prum poeta não quer dizer nada.
Aliás, fazer sentido não quer dizer porra nenhuma pra ninguém, em se tratando de literatura.
Você até pode dar seus primeiros passos poéticos mandando o sentido pro caralho.
Se quiser.
Quer ser poeta?
Então não se fie na opinião de ninguém.
Nem na minha.
Não espere reconhecimento.
Não fique aí parado feito tonto esperando um docinho.
Um afago.
Um elogio.
Quer ser poeta?
Então seja poeta.
Primeiro...
...aprenda a sentir.
Pra sentir...
...aprenda a sentir.
Pra sentir...
...aprenda a se livrar das besteiras que te enfiaram na cachola desde o dia que você nasceu.
Aprenda, acima de tudo, a sentir...
...a dor...
...que é sua...
...só sua...
...sua...
...sua...
Eu estou tentando ser poeta há 40 anos.
 E vejo hoje que tenho mil toneladas a aprender.
A cada manhã.
A cada tarde.
A cada lusco-fusco usco co o.
E desaprender.
Dsprender.
Aprnder.
Prndr.
ndr.
r.
Preciso aprender a aceitar o que sinto.
Preciso desaprender o que me entucharam na cabeça.
Tem lógica?
Se tiver, então tô falando merda.
Mas uma coisa tenho por certo nessa salada milenar:
Seguinte:
Três pontos
Não deixe que teorias e teóricos queiram te ensinar o que você sente ou deve sentir.
A poesia e a literatura em geral tem raríssimos criadores.
E palpiteiros a dar com o pau.
Não há poeta igual a outro.
Não há escritor igual a outro.
Cada verso é uma declaração de independência.
Uma declaração de guerra.
Um manifesto por um mundo carmim de sangue.


Blogando 0045


Sabia.
Não deu outra.
Um “poeta” tinha de “tratar” da distopia ocorrida último domingo na trágica Santa Maria no estado do Rio Grande do Sul.
E tal poeta só podia ser um gaúcho, obviamente. Afinal, é a área dele. Ele tem ascendência natural sobre as tragédias de sua terra.
Previsivelmente, o canto de dor pelo funesto episódio da danceteria Kiss (Jesus, terá o “poeta” recorrido ao previsível trocadilho?) coube a Fabrício Carpinejar. O poeta na hora certa no lugar certo.
Sem saída (jesus!), começo a ler o canto de morte. Meus olhos correm por dois ou três versos e imediatamente buscam ar (jesus!) no branco da parede à minha frente.
Carpinejar teve coragem! (Se há um ponto de exclamação legítimo no mundo, é este.)
Incluiu em sua elegia fúnebre todas as imagens grotescas que se poderia esperar dum poeta como ele. Só espero que Veríssimo não o siga.
Carpinejar veio açodado tomar parte do imenso açougue humano transformado pela mídia e pelos poderosos no Maior Espetáculo do Fim de Semana. Com seu panegírico fora de lugar, juntou-se às lágrimas de crocodilo de Dilma Rousseff, aos esgares canastreiros do governador Tarso Genro, ao picadeiro rocambolesco armado pelo ministro da Saúde.
Soube dessa imensa infelicidade quando cheguei na casa da minha irmã domingo pouco antes do almoço. Entrei na sala, a tevê estava ligada, dei com a notícia, escutei minha própria voz exclamar “puta que pariu!”.  Senti os olhos molhados. Eis a total reação espontânea que algo assim merece. Eis a única poesia que se pode prestar às vítimas da infâmia, da incúria dos nossos homens “públicos”.
Hoje abro o site da revista Veja para descobrir que o gran necrófilo Luiz Datena, que revolve a carniça humana todas as tardes na tevê com seu enorme bico de abutre de Prometeu, foi legitimado - e, pior, emulado – como poeta pelo poeta Fabrício Carpinejar.
Sobre este episódio sem adjetivos tudo que a canalha política e os poetas maiores podem fazer é o silêncio.

Blogando 0044

Tudo que espero é
Tudo que quero

Amanhã cedinho
O mundo vai acabar

Sem horário certo
Nem lugar anunciado

Esmagado sob o peso
Dum poema meu

Blogando 0043 sobre o Detonador de Ilusões

Amanhã, se tudo estiver bem como esteve hoje e como esteve ontem, vou explicar por que sou o Detonador de Ilusões e como há décadas observo as pessoas se afastarem como se eu fosse leproso.

Uma coisa posso afirmar que aprendi — as pessoas não toleram que se lhes destruam as ilusões.

E àquele desprovido delas, ilusões, tratam como o mais maligno dos cancros.

As ilusões são nosso alimento.

E nosso veneno.

Blogando 0042

Fico pensando se Ludwig, já surdo, esmerilhando seu diabólico piano, deixava uns olhares escapar na direção da sua plateia, se perguntando, será que esses imbecis sabem que estou surdo?

Faz alguma diferença?

Os quartetos que Ludwig criou no fim da vida são definitivamente obra dum surdo. Um surdo genial. Um gênio surdo.

Se tivesse leitores, eu lhes perguntaria, será que não enxergam que estou deprimido? Deprimido ao nível intolerável?

Minhas postagens recentes são obra dum escritor envenenado pelo que se convencionou denominar depressão.

Vejam, senhoras e senhores, vejam quão rarefeito é o nexo das minhas palavras, quão vago é o sentido das minhas frases, quão abstrato é o sentimento que penso estar pespegando na fachada do meu blog com o mais sólido prego imaginário que posso conceber e cujo significado se dilui de alguma forma em algum lugar dentro de mim qual a mais fudigia das alucinações mnemônicas da minha existência uterina.

E escuto os quartetos de Ludwig e escrevo e lá fora é noite e a noite haverá de passar e amanhã tudo será o mesmo.

Blogando 0041

DEFINITIVAMENTE, não entendo internautas. Não entendo membros de redes sociais. Não entendo blogueiros. Não entendo blogueiros que se pensam e pretendem se mostrar sensíveis, poetas, portadores de visões especialíssimas do mundo.
Não entendo qual lógica seguem. Sei que não é a minha e é tudo que sei e saber algo que não é não é saber muito.
Espero que minha última frase acima os confunda.
Se pudesse, os atrairia para a beira dum precipício, ficaria esperando que tivessem então um insight do mundo sensível perdido.
Não entendo, entre mil outras coisas, uma gente de índole literária aliterária E antiliterária. Gente de ideologia literária que não toma conhecimento da base, do fundo, da partida e do fim: a palavra.
Não entendo gente literária cuja palavra tem sua ortografia violentada, seu lugar ignorado, sua ordem trocada, seu significado desprezado, sua sacralidade aviltada.
Não entendo gente literária em que a complexidade da sensibilidade artística é contrabandeada pelo fascínio da conectividade que pede urgente uma teclada mecânica como resposta mecânica a uma postagem mecânica cujo conteúdo introspectivo, reflexivo é nulo.
Não entendo gente literária em que uma postagem de boa vizinhança é enviada apenas para suscitar outra postagem de agradecimento e a seguinte para provocar uma outra numa circularidade que se autoalimenta do impulso clicatório, gerando no pobre internauta uma eterna ansiedade pela próxima réplica.
Não entendo gente literária digital em que o digital é tudo e o literário é nada.
Não entendo gente literária que adora escritores e poetas por sua fama e não por suas obras e ideias, na mais decepcionanante rendição ao mais grotesco culto à celebridade dos fofoqueiros da tevê.
DEFINITIVAMENTE, não entendo internautas literatos e sua estranha concepção de que literatura é só mais uma desculpa para concretizar a "experiência" digital.
Os internautas fazem, certamente, parte do mundo da palavra abolida. São ágrafos sob o domínio de uma hipnose eletrônica.
Literatura é palavra e palavra é pensamento. As microsofts ainda não inventaram um sucedâneo.


Para amanhã ao acordar, sei lá que hora, não me acusar de autotraição


Melhor que dar um beijo é sentir a aproximação da boca do outro.

Melhor que dar a mão é estender a mão.

Melhor que esnobar é PODER esnobar e NÃO esnobar. 

Pior que dar a facada é apontar a faca.

Onde estão todos?

Não se angustie.

Todos estão onde todos estão.

(Que é que você acha de eu encerrar esta postagem exatamente aqui? Se o fizesse, você ficaria sem entendê-la mas eu, em contrapartida, faria alta literatura, embora para consumo estritamente pessoal, e, de minha parte, estaríamos conversados e, de sua parte, seu olhar buscaria rapidamente uma base, mas, você sabe, um escritor, grande ou pequeno, não deve se preocupar com a parte alheia. Na literatura, o problema do leitor sempre será do leitor.)

Naquela minha épica era de garoto solitário, todos estavam no salãozinho de reuniões do conjunto de casas e eu estava somewhere alhures somehow conversando comigo mesmo tentando abraçar essa imensa solidão que nunca coube em mim e encostar os dedos das duas mãos do outro lado, negociar, ver se ela, por uns momentos que fosse, podia me aceitar como digno de misericórdia, me dar uma trégua assim de colher de chá, que mal podia haver? eu não era tão ruim que não merecesse uns minutinhos de alívio, mesmo na farta escuridão da rua, longe do salãozinho de reuniões onde todos sempre estavam e não poderiam estar senão ali.

Todos continuam onde sempre estiveram e ainda assim continuo me surpreendendo que todos sejam e tudo seja assim.

Eu também.

Meus braços continuam enlaçados na ampla pança deste mostrengo da minha solidão e continuo a tentar que as pontas dos meus dedinhos se encostem do outro lado.

Posso, como sempre, ouvir seu coração palpitar. Sentir seu cheiro de suor. Ouvir seu hálito entrando e saindo por sobre meus cabelos.

Fomos feitos um para o outro.

Eu, para a minha solidão. Minha solidão para...

Oh não.

Casa cidade



Entre minha cidade,
A cidade que é minha,
E a cidade vizinha
Há outra.

Cidade em que entre uma rua e outra
Há outra
Entre uma casa e outra
Há outra
casa que é minha
à casa vizinha.

Não há parques nas redondezas e eu não ligo

Você pode rir e quem sabe eu até acabe rindo com você, não sou duro como gostaria, foram décadas de frustração tentando imitar os mocinhos altos, loiros, de olhos azuis daqueles faroestes de bolso que comprava às dezenas na banca de jornal na esquina de casa. Hoje vejo que queria não apenas macaquear os estereótipos de herói da subliteratura americana, mas queria acima de tudo que um dia em minha vida — um que fosse, de toda minha vida, do começo ao fim — pudesse ser simples como aquele da chegada do misterioso forasteiro num vilarejo no meio do nada que, com sua mera presença, instituía a civilização, escorraçava  os bandidos e de quebra amolecia o coração de pedra da sofrida mocinha que aos parcos 19 anos, tendo experimentado nada mais que percalços em sua brevíssima existência, já decidira que viver é lutar e que seus grandes, belos olhos, também azuis, que lembravam as taças de champanhe dos cabarés parisienses jamais haviam avistado uma única evidência de que existia no mundo algo suficientemente belo para ser avistado por seus grandes, belos olhos eternamente azuis.

Era uma dor palpável como a mesa da cozinha. A cabeceira da cama. O chão de pranchas de ipê. As venezianas apodrecendo na janela. O frasco de desodorante Avanço esguichado às pressas na noite de sábado como se em meu céu houvesse potencialidades.

Se Maharishi Mahesh tivesse então emergido de Within You Without You que tocava obsessivamente em minha vitrola xadrez e me ensinasse que tudo que eu precisava era aprender a morrer — e me convencesse —  eu teria me consentido a crer num deus, indiano, católico ou o que quer que fosse. Alegremente.


Quando nem onde

Vou subindo a avenida
Contra o vento soprando
De outras esquinas quebradas
No passado

Com que então Neil
Armstrong foi até a Lua
E voltou à Terra sem
Conhecer o lado escuro
do nosso satélite

Subindo a avenida, posso
Dizer que entendo Neil
Armstrong e para entender
Neil Armstrong não tive
De ir tão longe

Subindo a avenida
Subindo a avenida é
Tudo que sou
Sem olhar os que
Descem
Nem cogitar pelos
que vão na calçada
Oposta

Me lembro vagamente
dos que vão ao outro
Lado do mundo
Ao outro lado do rio
E me reconforto que
Não pretendo ir sequer
Ao outro lado de mim

Blogando 0040


Esta noite tive vários sonhos vários.
Em sua maioria eram foncusos, digo, confusos e disparatados e perturbadores como sempre são meus sonhos desde que me lembro. Ora simplesmente oníricos, ora arrematados pesadelos.
Teve um, no entanto, que destoava dos demais — em vez de me deixar atarantado como sempre fico quando sonho, me obrigando a acordar para fugir dum padecimento, esse me enlevava. Digo, me enlevava ao longo de sua duração. Pois que permitiu que eu tivesse ciência de que saía — ou me tirava  — dum lugar e chegava  — ou me levava  — em outro. Ou seja, tinha tempo. E, não sei como, pude perceber o decorrer do tempo desse sonho.
Provavelmente já me ocorreu isso antes. Mas, se ocorreu, não me lembro. E meu sonho dotado de tempo me fascinou. E fascinado ia curtindo meu enlevo onírico me regozijando comigo mesmo, como não faço também desde que me lembro.
Mas não foi  isso.
Esse meu sonho temporal e prazenteiro, ao contrário da imensa maioria dos sonhos que tenho durante meus lances de sono espasmódico, tinha  — e disso me lembro claramente  — um sentido.
Digo, um sentido que estava ao meu alcance, acessível aos meus parcos conhecimentos de sonhador penitente e leigo explicador de sonhos. Me lembro que não era desses sonhos que criamos para o exame do arguto cérebro de um freud na esperança de que um freud igualmente onírico nos revele a chave do nosso enigma.
Pois, assim como, imagino, a imensa maioria dos seres humanos que cada noite depois que nascem sonham mil sonhos, também cismo. Cismo não apenas com cada um dos sonhos que sou capaz de recordar ao acordar, mas cismo sobretudo com o fato de sonhar.
Por que nós seres humanos sonhamos, afinal?
Ou melhor, para quê?
Okay, estou ciente de que a imensa maioria dos sonhadores felizes que compõem nossa espécie talvez não goste de abordagem assim tão investigativa dos momentos para lá de íntimos que passam a sós consigo mesmos no aconchego de seus lençóis. Como espécime da raça, sei mais ou menos como é. E também prefiro evitar que esses profissionais do cérebro que penduram uma plaqueta na porta anunciando as maravilhas da cura espírito-mental vasculhem meus domínios secretos com suas lamparinas de diógenes sem rumo. Uma, porque todas as vezes em que tentei a experiência, esqueceram aqui dentro pedaços de gaze apocalíptica, tesouras de recomendações em grego, bisturis de conselhos cegos, cacos de barbeiragens interpretativas e outros objetos estranhos que essa gente costuma abandonar dentro de suas cobaias. (Ou será que deixam de propósito, mais ou menos sob o espírito dos experimentos "médicos" de Auschwitz?) Duas, porque de todas minhas experiências com esses pretensos conhecedores da alma humana saí cuma profunda impressão de que me conheço e sempre irei me conhecer um milhão de vezes melhor que qualquer sujeito que se ache o engenheiro das minhas razões, ou das faltas delas, só porque estudou o funcionamento da mente por uns anos numa faculdade qualquer. Três, porque nenhuma consulta vale o que esses caras cobram, really. E, quatro, porque me dá nojo aquele brilho de triunfo a iluminar aqueles carões sempre satisfeitos por acharem que têm nas mãozinhas finas de exegetas ociosos a chave do enigma dum pobre-diabo inerme.
Mas eis que aqui pego em minha tosca arapuca a imensa maioria dos meus quase três leitores. Sei  — ah como sei — que já estavam a ponto de rir do meu enésimo naufrágio literário. Será que nós frágeis seres humanos jamais conseguiremos superar esses patéticos papéis de gatos e ratos que desempenhamos com tamanha pusilanimidade?
Será que um dia serei capaz de começar a falar de Freud sem descambar em Darwin?
Não fui talhado para as leis da selva. Ou, como se diz hoje em dia, não tenho esse "perfil" — esse perfil que os praticantes de perfis praticam para trucidar os que não querem ou não podem ter perfil algum.
Sei que meus quase três leitores haverão de levar em conta os verdadeiros motivos que subjazem a este pobre textículo. Sei que compreendem que estou preso neste meu circuito de irrecorríveis ajustes de contas com os sabichões da existência e que assim vou blogando e que ir blogando é tudo, é só o que me move a esta altura.
Isto dito, eis que finalmente posso arrematar esta pequena peça de especulação metafísica confessando que meu sonho tinha um sentido e o sentido era que não havia sentido e isso me fez um bem danado.
Pra variar.

Blogando 0039


Se um céu existe, é lá onde nos unimos àqueles que perdemos.
Não um reencontro.
Um encontro apenas. 
Um encontro definitivo, sem tempo nem passado.
Um encontro sem futuro nem sempre.
Sem nunca, sem não.
Um constante sim.
Um eterno sem fim.

Se um céu existe, é lá onde nos abraçamos à mãe e ao pai.
À irmã e ao irmão. Ao filho e à filha.
Ao primo da cidade distante do interior.
À prima distante que morava na outra esquina.
É lá aonde foram nossos cães e gatos ao desaparecerem de nossas vidas.
Lá onde sabemos. Não por milagre — não há milagres no céu.

Se existe um céu — não esse com que sonhamos dia e noite,
E que faz das nossas pobres cabeças uma prisão no inferno,
O nada mais terrível,
Mas lá onde não perdemos ninguém e ninguém nos perde
Não esperamos ninguém e ninguém nos espera,

Onde somos o que somos,
Onde estamos onde estamos.

Me sentando na beira da cadeira


Acabei de chegar.
De onde?
De lá.
Aquele lugar que se tornou um, digamos, santuário na minha vididinha de pagão.
Não, nada de santuário. Nada para mim merece o nome de santuário.
Recomeço.
Acabei de chegar.
De onde?
De lá.
Aquele lugar que de repente deixou de ser apenas mais um entre os milhares de lugares absolutamente banais e desinteressantes pelos quais passei e que passaram por mim até hoje marcando em mim nada mais que um sinal a ferro de enfado quando o que sempre desejo ardorosamente é o disco voador do qual falo e hei de falar para todo o sempre e que espero desde que nasci e que pensava poderia me sequestrar para outras inéditas paragens sem nada que as identificasse com este desolado mundo onde tenho a impressão de ter sido gerado por engano.
Acabei de chegar daquele lugar no meio daquela avenida que nunca me significou absolutamente nada e cujo nome evocava em mim um vago resquício do meu antigo mundo associado a uma palavra indígena de sonoridade desajeitada e pela qual transitei a pé e de carro e de ônibus milhares de vezes sempre torcendo para erradicar da memória de onde vinha e fantasiar com minha imaginação de eterno adolescente um destino milagroso que não morresse de maneira tão decepcionante na porta duma loja ou dum banco e que me levou milhares de vezes aonde fui obrigado a ir contra minha débil vontade.
Aquele lugar que se tornou um refúgio na minha vididinha de ermitão.
Refúgio alternativo, segundo ao meu primeiro refúgio que é minha caverna.
Para onde busco que me ensinem a fugir quando preciso de um alívio à insuportável mesmice que é minha solidão.
Então me ensine alguém.
Me ensina como faço para estar nesse meu novo refúgio de corpo e espírito, como me convencer de que finalmente posso deixar de simular esta minha implacável indiferença ao mundo que converte em risíveis fósseis os seres que nele vivem.
Hoje, ao sair do meu novo refúgio, já não esperava meu impossível disco voador.
Então meio que me congratulei.
Estarei hoje, vim pensando, nesta minha segunda odisséia às minhas novas paragens, dominando minha irrefreável tendência à fantasia?
Será que posso baixar a guarda, me achar enfim capaz de me pôr neste exato segundo no papel deste homem específico, este homem de carne e osso que desde sempre venho tentando em vão ser, pois, se não tive escolha senão representar outro que não a mim mesmo?
Então, me dizendo heroi, respirando meio aliviado, me congratulando por ter liquidado com a parca munição que me cabe o disco voador e os insidiosos seres determinados a fazer de minha existência um permanente estado de ansiedade, então, assim, me congratulando, vim me reunindo com outros cento e quarenta e dois que sou, assembleia barulhenta, selvagem, em que eu e os outros dois mil, setecentos e quarenta e três que sou tentamos deliberar sobre o que devemos pensar sobre o que devemos pensar sobre o que devemos pensar.
Então, ao chegar, alguém que talvez me ensine, depois de exterminar os seissentos e trinta e cinco que sou, incinerá-los como vermes ávidos pelos meus pensamentos, deportá-los para onde quer que se abriguem em sua sombra distante dos meus sentidos, então, alguém que bem que poderia me ensinar, depois disso tudo, depois de tantas outras ações e exercícios que sou obrigado a cumprir depois de sempre que a presença desse alguém a escassíssimo meio metro do sorriso constante desse alguém e do sorriso inebriante desse alguém e sorriso comovente desse alguém e depois de me considerar remotamente reintegrado em mim e razoavelmente apto a reecontrar meu rumo e me lembrar da localização da minha caverna, aqui me sentei em minha cadeira e liguei meu computador e botei a minha música e me pus a digitar em meu teclado este meu desvario que, tenho quase certeza, um dia alguém haverá de compreender e, talvez, aceitar.


Blogando 0038


Era uma vez um garotinho que queria ser amalucado que não sabia que havia no mundo muitos outros garotinhos que queriam ser desvairados.
Ponto, parágrafo e dois pontos.
Então esse garotinho que queria ser diferente que não sabia que havia no mundo muitos outros garotinhos que queriam ser excepcionais começou a ser um garotinho singular.
E esse garotinho que queria ser descabeçado que não sabia que havia no mundo muitos outros garotinhos que queriam ser desmiolados continuou sendo um garotinho desequilibrado.
Só que esse garotinho que queria ser lunático que não sabia que havia no mundo muitos outros garotinhos que queriam ser loucos mas mesmo assim continuou sendo um garotinho delirante que não sabia que havia no mundo muitos outros garotinhos que queriam ser esdrúxulos um dia percebeu que havia no mundo outros garotinhos já decididamente — e eis que aqui entra O GRANDE ADVÉRBIO  insanos que eram muito mais excêntricos que ele, o garotinho que queria ser esquisito.
Schlupt!
A maluqueza foi aí um dia e engoliu o garotinho.
E ninguém se perguntou bosta nenhuma.
Pois o garotinho que queria ser espeloteado nunca tivera peito de alertar seu pessoal  e ele o desconfiava, pretendente a culto que era  que a loucura podia um dia fugir ao SEU controle e assim num VAPT fazer do seu mundinho areia e do seu esqueminha filosófico FARINHA e da sua pretensão a DEUS SOLITÁRIO DE SI MESMO açougue e si nada, pois (então o menininho recebeu a iluminação) não somos porra nenhuma ante um sentimentozinho que subitamente brota lá longe do passado para confrontar nossa cara com o espelho que  CREDO CRUZ  não queremos olhar PUF puf PUF
E o garotinho que queria ser alienado ficou querendo ser estapafúrdio até empunhar a verborrágica metralhadora que pipocava três pontinhos a cada segundo undo und un u