Libido com banana ou será o contrário?

Tive um sonho sério noite passada. Não é a xaropada costumeira de quem gosta de contar sonhos. De minha parte, odeio, sonhos envolvem questões particularíssimas que só interessam ao dono. Todo mundo sonha e a maioria não dá maior importância. Neste quesito, estou com a maioria. Mas sei que você gosta de ambos: de contar e de ouvir, então vou contar. Depois deixo contar o seu. Não deve ser lá grande coisa mas topo o sacrifício. Ando meio penitente ultimamente ente ente.
Foi assim.
Estava de olhos fechados escutando meu Ludwig velho de guerra, minha nova paixão: Meeresstille. Sei que soo esnobe com essa mania de falar dos grandes mas não dou lhufas, sou esnobe mesmo. Ludwig é um dos raros amores da minha vida, ao lado duns outros batutões da música e da literatura. Minha paixão por ele é de fases, sempre me amarro numa só peça e ouço até a dimboribeta entortar. Agora está na vez da Meeresstille. Até duas semanas atrás foi a Sonata 31. E por aí etc.
Estou lá de olhos fechados escutando meu Ludwig velho de guerra... Lá onde? Bom, não interessa pros propósitos deste relato. Pense num lugar qualquer, um buteco, um restaurante (não vegan, obviamente), se quiser, uma igreja.
Embora de olhos fechados, não estava dormindo. Ludwig não me deixa dormir, por mais sonolento que esteja. Por esta mesma razão nunca leio antes de dormir, perco o sono e varo a noite lendo. Apenas escutava, absolutamente ab absorto, a única forma honesta de escutar caras desse jaez.
Então surgiu o rosto dessa russa na minha frente. Se quiser, pode chamar de devaneio mas devaneio é pior que sonho, tanto pra sofrer quanto pra contar a quem se disponha a ouvir depois.
Bom, não dei lá muita trela, muitas coisas e muitas gentes surgem na minha frente seja durante o dia, seja à noite, seja na vigília, seja no sono, num delírio seja onírico ou meramente neurótico.
Fiquei aguardando a russa puxar a carro, dar lugar à fila de alucinações que aguardavam atrás a vez de vir me encher o saco.
Esperei uns dez, quinze segundos, a dona se limitou a ficar lá (?) postada, me fitando.
Dei mais dez segundos de tolerância.
Nada.
Qualé? perguntei em pensamento, me dirigindo diretamente a ela. Perdeu alguma coisa? Vai demorar muito? Meus fantasmas aí atrás tão começando a chiar.
Ela fez uma compleição (como desde a infância eu não via). O cenho se crispou ligeirissimamente, acompanhado duma flexão vaguíssima dos lábios. Da Vinci não teria feito melhor.
Tá rindo de quê? exigi.
Ela meneou levissimamente a cabeça, indicando que seria inútil perguntar.
É parente da Esfinge? provoquei.
Nada.
Só então me dei conta de que seus cabelos eram negros, embora fosse russa. (Não me pergunte como soube que era russa.) O normal seria o castanho claro ou o ruivo.
Diga alguma coisa, pedi. Mas não em caracteres cirilos. Não manjo niente da língua de Dostoievski.
O sorrisinho e mais nada. Essa é daquelas que só dão o ar da graça pra que eu possa fazer um dos meus monólogos. O que também está na minha lista de odeios. Odeio falar comigo mesmo. Só faço na marra, como agora.
Tudo bem, cedi. Pode usar seu idioma. Só não fale num daqueles idioletos da Sibéria. Não transo legal com os gulags.
Novo sorrisinho monalísico. Essa sabia me açular.
Fiz mais umas duas mil perguntas, todas sem resposta. Não me surpreendi, não me estressei. Estou acostumado. Foi só mais um sonho típico (devaneio?) desta interminável noite que é minha vida.

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