Quero uma mulher a quem possa chamar de estúpida.
Ou amor.
Que não saiba a diferença. E, se souber, não
faça diferença.
Que não veja o fim do mundo nessas
coisinhas bobas que fazem nossa eterna
bobice.
Quero uma mulher, não uma fada, dríade ou
musa, muito menos heroína. Que não se disponha a matar pelo que eu nunca
mataria ou morrer pelo que eu jamais morreria.
Uma mulher que não diga que minhas perguntas
são supérfluas mesmo que sejam e não me ache supérfluo por fazer tais perguntas
e nunca as responda com sinceridade mesmo que eu bata o pé exigindo franqueza.
Uma mulher que não duvide de mim (mesmo
que eu duvide dela).
Que saiba quando estou mentindo e deixe
passar a chance de me pegar no pulo ou em flagrante ou de se orientar pelas máximas
que orientam todas as mulheres e todos os homens.
Uma mulher que me chame cedo de manhã se
eu não estiver ao seu lado na cama e saia pela casa a me buscar e, quando me
vir sentado no sofá da sala, olhando macambúzio para a parede à minha frente, franza
a testa de preocupação e pergunte que
aconteceu, benzinho? e quando eu responder que um trem está passando dentro
da minha cabeça e em cada vagão do trem há um pensamento e não consigo entrar
em nenhum deles, não dissimule a estranheza e abra um sorrisinho condescendente
como se eu fosse um imbecil.
Ah, como quero uma mulher que me deixe
escutar o eco produzido pelo trem na estação depois de sua passagem. Uma mulher
que consentisse que nós, parados em pé na plataforma, não existíssemos.