sara sara saracoteia saracoteador

tem hora, tem noite, tem milênio demoro demais pra extrair um pensamento lúcido, inteligível da minha cabeçorra asilo de loucuras e arrumar algo digno de dizer
estou sempre errado de que nunca estou bem certo
não estou estou certo de nada
não quero estar certo de nada
não quero ter certezas. nunca quis
óbvia, clara, evidente, lógica, naturalmente é fatal
darwin abominava os incertos
foda-se você, charles
me esfrangalha os nervos a convicção com que todo mundo anuncia suas certezas vãs.
foram bons alunos do mundo, aprenderam todas as lições da vida, agora podem enfim se dedicar pachorramente a me ensinar com quantas mentiras se faz uma verdade
me dão gana de suicídio pessoas que vivem a hastear bandeiras coloridas ruidosas estampando majestosas seus princípios espúrios patéticos porque imaginam piedosamente que a lei da física pela qual a natureza não tolera o vácuo pode aplicar-se vicariamente aos nossos sentimentos e às nossas ideias e às nossas incertezas que tais pessoas tão grotescamente querem converter em veredictos. (estou meio lusitano hoje. não significa que amanhã estarei ainda. para espanto dos racionalistas empedernidos.)
escutem duma vez por todas, porra: sou um poeta com aversão à poesia
não!
não me digam que há um paradoxo aí. me poupem de seus julgamentos ansiolíticos
sim, estou ciente — fariseus positivistas travestidos de humanistas precisam do benefício do alerta. precavidos, contornam cuidadosamente os paradoxos que encontram pelo caminho
não há nada de paradoxal num poeta averso à poesia
não há nada de paradoxal em nada
paradoxos não passam de ataques intolerados por nossa frágil cabecinha deseducada a aceitar a impermanência dos pensamentos sobre as coisas