Eu, a noite
Eu sou a Noite que de tempos em tempos
desce sobre todo lugar, me infiltrando por todas as partes. Me aproximo
pelos lados do horizonte. Longe de olhares que perscrutam ou perscrutem.
Venho porque não há alternativas a não
vir. Sou fatidicamente cíclica. E tal como aqueles que me pretendem perscrutar,
sigo os ponteiros do Mestre Relógio.
Mas venho também porque sou chamada. Me querem.
E não devo frustrá-los.
Alguns me combatem qual inimigos. Outros
fogem feito presas. A maior parte me enfrenta com a Luz.
Então recolho meus véus. E finjo que me
retiro. E eles fingem não me ver.
E com o Vinho que extraem da Uva que
colhem da minha comadre Terra, brindam ao meu recuo.
Como se Eu, Dama do Espaço, Senhora de
Todas as Frestas...
Frestas! Eles, que pretendem saber tudo —
e sabem, embora teimem em negá-lo —, desdenham que ocupo cada uma das frestas
deste Universo, seja em que planeta, em que cometa for.
E que a cada uma ocupo com o mesmo zelo
de Guardiã das Distâncias entre os Astros.
Durante o turno do meu primo Dia, que ora
faz as vezes de meu irmão, ora de meu Salvador —, quando querem um pouco de
encantamento, erguem os olhos para o céu e sonham com as nuvens, os pássaros, o
Sol que não tolera ser mirado.
Mas, pergunto, quem permite que vislubrem
a Imensidão das Coisas e enxerguem que não estão sozinhos neste Mundo e
reconheçam, para seu próprio bem, a pequenez do seu tamanho e a incalculável insignificância
das suas vidas?
Minhas Crianças perdidas. Meus pequenos, frágeis
gigantes.
Chego — às vezes com as primas Trevas,
sempre com minha irmã Escuridão —, chego e eles bocejam, largam lassos seus
braços exaustos, deitam-se e fecham as pálpebras.
E cubro-os com meu Manto Azulão.
A maior parte, acalento seu Sono, os distraio
com Sonhos para que a Letargia não seja monótona. E ao fim da minha guarda
aviso minha companheira Aurora que os acorde para viver.
Mas alguns... coitados. Deitam-se e, em
vez de fechar as pálpebras, olham para dentro de Mim como se pretendessem me
decifrar.
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