Confissões a um assassino


Meu caro J., sob os suplícios que me inflige este pau-de-arara moral em que me penduraram os carrascos que nos executam sob insuperável deboche, confesso por fim. 

Confesso, primeiramente, que é chato este approach direto a um figurão assassino enfurnado num covil-gabinete a ocupar-se dos rumos desta nação de palhaços sem graça que somos todos nós os jamais incluídos no banquete. 

Confesso, Va. Excia. entende, que seria preferível uma abordagem impessoal em que pudesse confessar muitas coisas e ocultar outras ─ ainda mais (ou até porque, como se diz hoje em dia), sendo Va. Excia. assassino atarefado, neste exato momento provavelmente estais às voltas com novos e fantásticos planos para que prossiga em grande fausto o genocídio de brasileiros nas desoladas terras da mãe gentil. 

Meu caro J., confesso que fico pasmo com a capacidade que tem Va. Excia. de balbuciar as mais infames mentiras que já escutaram estes meus céticos porém obstinados ouvidos. Embora eu procure tampá-los com estas mãos que não se cansam de gesticular aflitas de indignação, meus tímpanos não se deixam enganar e vibram doloridos antes os afáveis e nauseabundos brados em falsete com que Va. Afônica Excia. emite vossa defesa no vil tribunal armado pelos que se pretendem vossos juízes. 

"Assassino sim! Não por mim, mas pelo meu país!" parece ser o principal mote do tour de force jurídico com que Va. Sinceríssima Excia. reage às acusações de vossos adversários. 

Confesso, meu caro J., que assassinos calculistas feito Va. Fria Excia. prescindem ─ confesso! meu caríssimo J. ─ de razões para assassinar. Razões as têm homicidas chinfrins, desses que matam o próximo por paixão, por ódio ou por mera precisão de matar. Bem sabemos todos nós, tripudiados órfãos filhos desta triste tímida terra, que excelsos assassinos não se guiam por motivos reles. 

Meu caríssimo Mr J., confesso que Va. Angelical Excia. chafurda na mais degradante e pegajosa mescla de sangue e lama que já escorreu pelo solo da prostrada mãe gentil. Confesso ainda, meu terno, meu abençoado J., que Va. Dulcíssima Excia. se emporcalha exultante no viscoso estrume excretado pelos cadáveres que ornam paredes e pisos de mármore de cada aposento de vosso palácio. 

Sem mais forças para outras confissões sob esta inclemente tortura com que vossos abnegados cães-de-guarda gaiamente me forçam a denunciar o inconfessável, confesso, meu caro J., que assassinos messiânicos feito Va. Esmagadora Excia. estão além das garras trêmulas de injustiça de nós eternamente sodomizados em berço esplêndido, estão além do cadafalso que os paladinos das nossas prostradas cortes se recusam a fincar na praça dos três poderes e estão além do pelotão de fuzilamento que em certas tardes cubanas, ao ritmo frenético de mambos e rumbas, opositores do regime enfim confrontam seu merecido destino. 

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