Neuroses


Meu analista dizia que eu era, sou, chorão, ex-analista, ninguém assaca acusações fundadas contra mim e get away with it, oquêi, sou chorão, choramingão de marca maior como costumava denunciar mamãe quando queria me ferir fundo enquanto me entuchava banana com aveia lá nos idos da lojinha ao lado da lavanderia dos japas, as cartas que me couberam do baralho genético da vida foram as das lágrimas, nunca aprendi a roubar no jogo.

O dr. G era, é, um sujeito meio bronco mas altamente prático, o que resultou numa boa simbiose no confronto semanal, em que às vezes eu lhe aplicava um calote, que ora ele interpretava ou tentava, ora fingia não ver, pois psicanálise, lalarilarirá, não vale um por cento do que esses barões freudianos extorquem dos infelizes analisandos em busca dum superego que lhes aplique umas boas chicotadas, o que não é, era, meu caso, sou um tico  mais refinado com minha verve poética e sólida cultura humanística. Caí nas mãos, no sentido figurado, do dr. G depois de quebrar a cara cuns picaretas no Paecambu, digo, Pacaembu depois de zanzar sonâmbulo algumas semanas oníricas sob o comando impiedoso duns tenebrosos traumas de infância revolvendo tormentas dentro deste frágil músculo cardíaco depois de anos sob um lar regido pelas neuroses dos semideuses, exposto a céu aberto, quem conheceu mamãe entende, quem conheceu a fundo papai entende mais ainda, ainda hoje sou perseguido pela imagem dum dândi argentino em plena ditadura, mon dieu, desses viadinhos que deitam um pullover com calculada displicência sobr'ombros raquíticos, instalado numa sala recendendo a carvalho num bunker suntuoso e artificial, que teve a pachorra de me tachar de invejoso quando comentei estar meio acanhado diante do fausto e, cúmulo, declarando-se despreocupado quando lhe assegurei inúmeras vezes por telefone que lhe pagaria as três sessões houvesse o que houvesse, mesmo que assaltar preciso fosse outro analista para levantar a grana, pombas, ninguém vai tripudiando assim impunemente do homem equilibrado, lúcido e corajoso que me tornei.

Tendo deixado para trás o dandizinho cucaracha fui dar no sentido lírico, lalarilarirá, no consultório duma psicanalista, até hoje me pergunto como pude, morro de medo de mulher, sobretudo se for pernuda, também no malfadado Pacaembu, que igualmente me enrolou por três torturantes, tortuosas, tolas sessões, espanhola ou descendente, será tudo isso parte dum plano diabólico de Cervantes? me olhava cuns olhões de quem queria me comer, no sentido bíblico, lalarilarirá, primeiro sugeriu que eu deitasse no divã sob a lenga-lenga de que assim a gente fica mais à vontade, depois tentando que cansa menos, que a psiquê flui mais, então mais assanhada tentando usar a encarnação do meu pobre eguinho tentando me induzir a sucumbir, eu olhava pro divã, necas, a coisa está mais pra leito, me pus assustado esperando a hora em que ela certamente me mandaria baixar as calças pra ver se tudo correra bem com minha operação de fimose.

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