Conto com a posteridade e prometo

A vida é, digamos, um jogo de dominó que não sei jogar.
Nem esse específico à vida nem qualquer outro.
Sei quando muito lembrar.
Os senhorezinhos sentados disciplinados ao redor da pequena mesa sob a hesitante iluminação do buteco e eu só olhando, não muito perto, não muito longe, talvez sabedor, desconfio hoje, de que o futuro me reservava o Noturno opus 9 em si menor de Chopin. Eis por que é tão desumanamente difícil crer no destino — ele podia simplesmente dar uma dicazinha de que a jornada lá adiante não seria tão esquizóide quanto suspeitávamos a partir dos indícios da infância e que não nos debulharíamos em lágrimas sob a Meditação de Taís de Massenet.
Quero olhar lá para trás mas estou cansado da sedução.
Ela, sedução, me prometeu tanto, tanto, tanto.
Não cumpriu nenhuma de suas promessas.
Não superei o olhar deslumbrado tentando abarcar num só golpe o espetáculo dos jogadores de dominó.
Não aprendi a tirar lições das minhas experiências.
Nem a me conformar que o sr. destino não me talhou para tirador de lições de experiências.
Eis que hoje me reduzo a meio entendedor de Beethoven.
Me conforta um tico saber que são poucos os que sabem escutar a Sonata nº 1 para piano em fá menor opus 2/1.
Conforto que não perdura um minuto, obviamente.
Ao contrário do que julgam tolos paulos francis passados, Beethoven é maduro, completo, desumano demais para nós condenados a invejar o talento.
É duro ter de admitir que esse foi um homem sem necessidade da aprovação de outro homem.
Mamãe, me salva do papel de macaco de circo.

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