E ainda assim depois de tudo?



Felizmente não consigo ser um super-homem como o eterno entusiasta da existência humana Quintana.
Sou incapaz de extrair lições positivas das minhas experiências. Não tenho os instrumentos necessários para enxergar as luzinhas que brilham sob o manto pesado do meu pessimismo. Não tenho o dom de Quintana de colher com esmero e paciência o grão bichado para transformá-lo em alimento.
Mário Quintana usava as palavras para edificar ideias. Foi um mestre que construía pensamentos e os entregava absolutos, acabados e ornados c'um delicado lacinho à fruição de seus leitores. Que com ele aprenderam a ir abrindo com os movimentos vagarosos de quem espera uma bela surpresa o papel de seda envolvendo o presente. E a bela surpresa, nada surpreendentemente, sempre está lá: um quase frágil quitute de aparência amorosa e cheiro suavíssimo, a ser degustado sem dentadas e sem violentar as glândulas do paladar. O leitor de Quintana é um consumidor de delicatessens, guloseimas de baixa caloria mas nutritivas que jamais ameaçam a esbelta silhueta do freguês.
Mário foi um hábil comandante das emoções e exímio executor das palavras.
Quanto a mim – sem a pretensão de me equiparar ao mestre – , são as palavras que me usam. Minhas emoções me comandam, minhas palavras me executam.
Estou à mercê delas qual um veleiro avariado em alto-mar flutuando ao sabor da tempestade.
Não sei quase nada. De mim, dos outros, do mundo. O pouco que sei é que não sou o comandante das minhas emoções contraditórias.
Acho que é essa minha diferença em relação aos “escritores” digitais que peroram confiantes e ridículos suas pífias bachareladas nos blogs por aí e em tantos outros antros (com perdão da poesia fora de lugar) em que grotescos se proclamam sábios.
Eles não sabem que são confusos. Eu sei que sou. É um bom handicap, pra começar.
Por isso, e por outras razões de que não me lembro agora – e que contarei mais tarde se lembrar e se achar que existe alguém disposto a saber –, não me leve muito a sério.
Além de conscientemente confuso, sou inconscientemente inconstante. Porque, como disse, estou ao sabor da ventania. Pretensiosos críticos literários já me chamaram de bipolar. Não! respondi, sou multipolar. Também nenhuma pretensão aqui de me exibir. É apenas uma tentativa de me explicar com razoável honestidade. Não que eu seja muito honesto. Para simplificar, me chamem de um desonesto sincero. Procuro ser sincero na medida que a ventania mo permite. Talvez seja esta a âncora que mal e mal ainda resiste ao furação.
Bem, talvez não lá tão sincero, admito. Acho que sou sincero na medida que alguém com a veleidade de ser sincero pode ser sincero.
Na verdade tem sempre esse grito entalado na minha garganta.

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