Zezeí vai
aprendendo a liderar nossos passeios. Me mantenho uns dois ou três passos
atrás. Ainda não contei que nunca usamos guia. Nas calçadas diversos velhotes
aposentados, desocupados em geral, donas de casa e de apartamento e empregadas
zanzam com seus cãezinhos de pelúcia. Alguns, se vê pela estirpe e orgulho do
acompanhante, pequenos campeõezinhos. Todos, os da moda: poodle toys, shih
tzus, bulldogs franceses, lhasa apsos e schnauzers. Nenhum viralata. Pra quem
não sabe, schnauzers são aqueles que têm a cara do Machado de Assis. Zezeí
nutre especial temor deles. Parecem defacto amedrontadores, embora de tamanho
módico.
Mesmo sob 50ºC à sombra, muitos
impõem camisetinhas e jaquetinhas aos seus bichinhos, que desfilam com os mais
variados penduricalhos nas orelhas, nos topetes, nos rabos (ou devemos proferir
"caudas"?). Os pobres diabinhos se tornaram as mais recentes vítimas
do consumismo desvairado da classe média imbecil (se você é desfilador de
cãezinhos e pertence às classes médias, não se amofine; meu adjetivo pode não
se estender genericamente a todos que tenham tal perfil (ugh)). Existe uma onda assoberbante
de humanização dos cachorros. Donos tarados
querem trazer suas bestinhas à sua imagem e semelhança. Dada a desembestada
evolução da tecnologia, na certa conseguirão mais dia, menos dia. Só espero que
não a ponto de dono e bicho trocarem de papéis.
Há uma rede de lojas para artigos pet (ugh) aí que fatura 400 milhões ao
ano. Well, estamos numa democracia (ainda; pelo andor com que as classes baixas
estão elegendo quadrilheiros lullistas, muito em breve seremos mais uma nação
sob a égide do bolivarianismo chavista; desconfio que então seremos obrigados a
entregar nossos mimosos pets às garras do Estado para que este os transformem
em sabão de pedra em nome da revolução socialista). Well again, prefiro
assistir à diuturna parada dos fofos malandrinhos caninos acompanhados de seus
(às vezes) desorientados proprietários que ao avanço do Exército Vermelho
Brasileiro pelas ruas e avenidas da cidade sob o ritmado rufar dos
tambores de Zé Dirceu. Que extremos mais díspares esses que a nova configuração
mundial nos coloca, não acham? Parece cada vez mais difícil tomar partido neste
mundo.
Hoje pudemos desbravar quase dez
quarteirões eu e Zezeí, ou melhor, pela ordem, Zezeí e eu, sempre mudando de
calçada ante a possibilidade de cruzarmos com outros cães no contrafluxo. Zezeí
pode ser bem aristocrática às vezes. Ao contrário da maioria de seus primos e
tios, não sofre da característica curiosidade canina por outros espécimes de
sua espécie. Au contraire, passa o mais longe possível deles. E é com garbo e
nobreza que passa longe. Sem sequer dignar-se a um olharzinho de esguelha ao
desprezado. Fico até compungido ante tamanha frieza.
Sob os 50ºC à sombra, todos
trazem uma garrafinha de água mineral à mão. Seguindo a recomendação daquele
médico que perora na tevê, certamente. Também resolvi seguir o doutor. Enchi de
vodka gelada uma garrafinha de Minalba e lá fomos nós sete e meia da
matina.
Jesus, what a kink. Alimentado pelo
aguardente de batata, meu tubérculo preferido, meu cabeção destrambelhado foi
engendrando mil autodescobertas por passada, mil versinhos
por atravessada, mil poeminhas por quarteirão. Meio desconsolado,
sabia que tudo se pulverizaria em milhões de caquinhos de letras mal
chegássemos em casa. É assim mesmo, mas. Até que estou me acostumando. Não se pode
ganhar sempre. Quem disse que poesia é só aquela que se registra em papel ou na
página dum blog?
Estavas tão familiarmente
estranha, que esqueci teu nome. Estavas tão arrebatadoramente
sedutora, que procurei ávido o cheiro da tua buceta. Tua língua em
minha boca era o passaporte à dimensão que me faltava, te disputando com
os três mosqueteiros, os três patetas, os três cavaleiros do apocalipse e o
infinito aborto. Pois eras tão desconhecida, que não reconheci teu rosto.
Voltamos e comecei a construir uma
usina de refazer pensamentos meus next to meu alambique artesanal onde
haveremos de misturar a batata com cevada, centeio, trigo e milho. Estamos
pensando também numa fábrica de salgadinhos amanteigados junto com um
laboratório de Marrobone com fragrâncias e aromas especiais das montanhas do
Afganistão, terra do meu saudoso Flip.
Logo será novamente nossa hora. Eu e
Zezeí, digo, Zezeí e eu estamos sempre prontos para o que der mesmo que não
venha. Se formos nós, será bastante.
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