Vamos jogar boliche no céu

Lembra quando você achava que teus pensamentos eram capazes de mudar o mundo?
Não? Então tudo bem – pode se declarar um sujeito normal, relativamente isento das sujeiras que se acumulam nas mentes de certos seres por aí que, qual este vosso vão, vil vassalo, sofrem desta e de outras mazelas emocionais mais ou menos mórbidas.
Quanto a mim, lembro, claro. Orgulhosamente.
Lembro não apenas que achava que meus pensamentos eram capazes de mudar o mundo mas duma porrada de outras coisas inúteis que com o tempo aprendi a chamar de “meus escombros”.
Vê se pode.
Se meu nada douto dr. G me lesse neste instante haveria de menear a cabeçorra lotada de teorias psicanaliticamente furadas e estalaria seguidas vezes a língua viciada em matraqueios frívolos e me tascaria no lombo uma interpretação enviesada que me deixaria atordoado por uns, digamos, seis anos?
(Como são chatos esses explicadores d’alma alheia pretensos herdeiros de Freud e Klein. Estes ao menos tinham gênio, o que é alguma coisa quando você, desamparado, em tua eterna busca dum sentido, procura em volta um olhar que não te retorne uma luz vazia. Li, durante minha “análise”, termo descabidamente pretensioso, um livro chamado Psicanálise, profissão impossível, da jornalista Janet Malcolm. É importante o registro de que Malcolm não é psicanalista, a quem seria igualmente impossível escrever um livro desses tanto quanto o seria a um escritor escrever algo como Literatura, a arte inalcançável. A barreira intransponível da psicanálise é o psicanalista. Não tive como superar a turrice, a incultura geral, a “especialidade” tapa-olho do meu caro dr. G e outros em cujas mãos finas e pecadoras tive de pagar meus pecados a trocentos paus a hora.)
Lembra quando você achava que teus pensamentos eram capazes de mudar o mundo?
Foi uma época em que teus pensamentos pareciam mágicos, não pareciam?
E são mesmo, pensando bem. São o reflexo aqui dentro do mundo que ocorre lá fora, à tua revelia e apesar dos teus esforços para tomar parte dele, mundo.
Oh! tudo isso, isso tudo é tão medonho. É tão frustrante.
Quando comecei este texto me sentia com energia suficiente para obrar um tratado, um poema, uma postagem para este pobre blog perdido em meio a trilhões de outros escritos diligentemente por bilhões de outros blogueiros a caça dum sentido, e se um sentido se revela impossível, um alívio, por efêmero, uma esperança, por solerte.
Meus pensamentos são tão mágicos quanto aqueles que, segundo Kafka, surgiram suicidas na cabeça niilista de deus em minúscula ao nos criar. Não há como escapar da definição de que o mundo é um pecado de deus. Para Kafka, há, sim, esperança, mas para deus, não para nós. Abdicar a essas dúvidas jogando-as no balaio trêfego de que estamos salvos nas mãos dum ente divino é o suprassumo da covardia.









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