Por que poetas se dão tanta
importância? Eis, para mim, o maior mistério do mundo.
O sujeito registra em tinta ou no
computador alguns versinhos amargos, falando duma dor indistinta, e já se acha
digno da leitura dum leitor.
Que desmedida presunção. (E olha que
estou falando dos poetas de antanho, aqueles, que, qual Kafka, deixavam a seus
próximos ordens expressas para que tudo que tinham escrito fosse destruído. Que
medonha humildade essa de Franz. Imagine hoje em dia um sujeito que vertesse
algo equivalente à Metamorfose ou ao Processo. No dia seguinte suas
ações estariam valendo trocentos quatrilhões de dólares. Em meia-hora
alcançaria a fábula de dez mil curtidas. Seria o grande fenômeno literário até
amanhã cedo e ninguém jamais tornaria a ouvir falar dele depois do meio-dia.)
Tenho medo.
Sempre tive medo.
Riam de mim na escola por ter tanto
medo. Riem de mim na rua pelo meu andar trôpego dos que têm medo. (Esse medo
difuso do reflexo da luz do sol nas íris dos olhos fixos resolutos nestes céus
que há milhões de anos pairam por sobre esta raça.)
Tinha medo de meu pai.
Tinha medo de minha mãe.
Tinha medo de minha irmã.
Tinha medo do escuro, tinha medo do
claro.
(E olha que ainda estávamos no
começo de julho.)
Abri os olhos e lá estavam teus
lábios entreabertos a esperar meu beijo e tuas pálpebras entreabertas a
espreitar minha aproximação e naquela metade de segundo fui feliz.