Redicionarizando

Se tivesse papo com deus, pedia pra ele equipar nós seres humanos c'um dispositivo que nos impedisse de já nascer errados.

Teria de ser algo meio mágico, claro. E tudo que é mágico, ou que pensamos ser mágico, acaba nos frustrando cedo ou tarde. Nunca gostei nem de mágicas nem de magias. Nasci já com este meu olho clínico para os truques atrás das mágicas. E, no meu caso, ter um olho clínico não é vantagem nenhuma. Só enxergo o que não deve ou não precisa ser enxergado.

Toda mágica guarda um mistério de polichinelo. Toda mágica é pobre e grosseira e se presta apenas a ludibriar os afeitos ao ludibrio.

Sim, há os que se deixam enganar por vontade própria. São os que fecham os olhos para não ver o coelho se esgueirando do fundo falso da cartola. São os que nascem apenas para ficar sentados no escuro da plateia e bater palmas para o mágico e seus truques manjados, soporifiramente tirando cartas da manga no jogo que nascemos para perder e serrando ao meio pessoas nascidas para ser apenas metade.

Se eu tivesse papo com deus, pedia pra ele dotar nós seres humanos c'um Para-Quedas Natal.

Meu Para-Quedas Natal seria por sua vez equipado c'um painel cheio de botõezinhos. (Sim, como o controle remoto da tevê.)

O infeliz paraquedista poderia fazer algumas opções básicas. (Só não poderia, obviamente, abortar o salto. Deus é bonzinho mas não é bobo.)

Poderia escolher, por exemplo, não cair bem no meio de Heliópolis. Ou poderia escolher, por exemplo, cair bem no meio de Heliópolis. (Nós seres humanos temos esse estranho senso de sobrevivência que nos impede de ver o que é melhor para nós mesmos e que parece que nos foi agraciado por um igualmente estranho desígnio divino.)

Se fosse equipado com meu Para-Quedas Natal e não pudesse declinar dos meus desígnios, eu faria o truque da minha vida e daria um salto mortal.

Parece abrupto, eu sei. Mas o ser humano dos meus sonhos não leva a vida num tribunal. E o salto dos meus sonhos será um salto suave.

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