Que faço com tanta alegria?

Hoje queria não morar sozinho.
Já se passaram quase dez anos que minha ex me trocou pelo dono da empresa onde trabalhava. Pra piorar ainda mais a situação, meus quatro filhos se mudaram de casa quase na época: um foi trabalhar em outra cidade, o segundo se casou com um primo, o terceiro entrou para o Exército e foi servir no Pará e o outro atualmente está internado numa casa de "repouso".
Nesse tempo todo tive dias em que pensava que não ia suportar. Cheguei ao ponto de falar sozinho, eu, que antes achava ingenuamente que falar sozinho é coisa de louco. Certos dias evitava olhar as paredes, de medo de conversar com elas. (Pode parecer engraçado agora, mas aqueles momentos eram terrivelmente angustiantes.)
Sempre fui um devorador de livros e comecei a ler em voz alta só para ouvir minha própria voz. Mas nem conseguia mais me concentrar nos meus autores prediletos, aqueles que me acompanharam praticamente desde a adolescência. Até que um dia, de repente, quase sem me dar conta, me vi às lágrimas sentando na poltrona da sala, com O pequeno príncipe nas mãos, um livro que antes considerava literatura infantil.
Além disso sempre tinha o costume de ler dois jornais IMPRESSOS todo santo dia e também de repente deixei de me interessar pelas coisas do mundo lá de fora. Para minha própria consternação, comecei a assistir tevê. Pior, sempre detestei novelas mas acabei virando um seguidor quase canino delas e logo lá estava plantado na sala chorando diante da telinha feito um bebezão.
Peço que me desculpem por esta confidência tão íntima. Me sinto até meio ridículo falando assim como um garoto romântico.
Bem, passado aquele primeiro momento de choque, me voltei aos poucos para as comunidades de relacionamento, principalmente a orkut. (Peço que não estranhem eu tratar a orkut no feminino, mas me acostumei e hoje prefiro assim; talvez porque a imensa maioria dos membros se constitua de mulheres, não sei.)
Mas devo confessar que ando bem decepcionado com os relacionamentos online.
Nestes últimos três anos, conheci muitas pessoas na orkut (ainda não me animei a entrar no Face e provavelmente não vou; não quero nem posso perder ainda mais tempo com a vida virtual do que já perco hoje; se você não tomar cuidado, é fácil virar meio escravo do mouse e do F5).
Algumas dessas pessoas que conheci online são legais e me senti até gratificado pela oportunidade de fazer amizade com elas. Estabeleci uma forte relação com três delas e hoje somos amigos de infância, de trocarmos visitas e tomar uma cerveja de vez em quando.
Outras pessoas me decepcionaram, como já disse. Algumas parecem ter verdadeiro prazer em atrair outras só para abandoná-las depois que as cativam, seja sumindo ou, pior, te bloqueando, te ignorando como se de repente você tivesse adquirido lepra. A uma, cheguei até a enviar uma carta pelo correio, com um endereço que a pessoa tinha me dado. A carta voltou com o carimbo "Inexistente" ou algo assim. De qualquer forma acho que hoje me considero escaldado contra esses tipos. E não estou com ânimo para falar muito deles.
Concluindo, queria dizer que esta nossa convivência virtual é formidável, ainda mais para um cara feito eu que cresceu naquela remotíssima era pré-computador em que tudo era mais difícil e ao mesmo tempo mais fácil.
Tento pesar bem uma situação e outra e confesso que não sei dizer qual das duas prefiro. Às vezes tenho a sensação de que continuo sozinho com era há nove ou dez anos anos.
Por isso, repito, hoje queria não morar sozinho.
Ter uma pessoa não só para transar ocasionalmente ou passar umas horas na mesa dum barzinho. Ou que esteja só a fim de curtir. Ainda mais porque, como já faz uns tempos que não curto muita coisa fora de casa, queria uma pessoa para quem a maior curtição seja eu mesmo.
Que me aceite como sou, com minhas características, virtudes e defeitos. Que não me veja como um simples tapa-buraco, seja financeiro ou emocional. Que preze, acima de tudo, o companheirismo.
Uma pessoa para compartilhar meus pensamentos, minhas preocupações, meus temores e minhas alegrias. Para conhecer o meu passado, se interessar pela minha história pessoal, querer conhecer minha família. Para, quando nos encontrássemos em casa à noite, me olhar nos olhos, tomar minhas mãos e conversar comigo. Uma pessoa que realmente se importasse comigo, que se sentisse feliz com a minha presença e eu, feliz com a presença dela.

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