Hoje estou nas nuvens. Recebi um elogio. O dedico aos que
torcem o nariz pro meu lado. Obrigado. É prova de que estou no rumo certo como criador
de bafafás, mesmo que pífios. A unanimidade etc. A menos que todos sejam
unânimes em descer o porrete. Nada contra.
Vocês me conhecem. Sabem o que penso. Quem Quer Escrever (QQE)
pra valer não deve recear uma sarrafada no meio das ideias. Ou, como Rilke preconizava,
dar ouvidos à crítica. Não que sarrafada não doa. Dói. Dependendo de quem,
pacas. Ou então resulta absolutamente indolor, também relativamente. Mas, uma,
temos de engrossar a casca — quem sabe na próxima doa menos. Cinco, quem quer
não ser chamado de escritor e sim se considerar um, sob seus próprios critérios
e para seus próprios (maus, inconfessáveis) propósitos, tem de fazer um
exercício diário: um, escrever, e escrever sem noção de pecado, pudor, decoro e
o deboche do vizinho; vinte, fingir que não doeu. Se você for macho (explico:
não falo de gênero nem macheza), as vergastadas frequentes ajudam a calejar o
lombo. Que me perdoem os outros, e os miguéis sanches da vida, mas um QQE não
escreve para eles. O público-alvo do QQE é ele mesmo. O tema do QQE é ele
mesmo. A janela pela qual ele imagina vislumbrar o mundo é o olhar dele mesmo.
E o conteúdo de sua escrita é a tradução que ele faz de sua dor. (Obviamente me
refiro ao tipo específico de escrita que faço. Embora ache que Paulo Coelho
também deva sofrer quando abre o extrato de suas contas refestelado diante de
sua piscina térmica. Com o tempo aprendi comigo mesmo que não veria sentido em
escrever não fosse Ela.) Os “outros” durante a sua escrita são miragens.
Antiquíssimos Abantesmas Abstratos (AAA). Reconhecimento é consequência. Se você
escreve poeticamente almejando a qualquer outra coisa que não seja lavar a sua
roupa suja através da sua escrita, o resultado provavelmente não será nenhuma
brastemp.
Ainda sob a meia-luz do retrorreferido, gostaria também de
falar da minha experiência escrevendo na rede e do que acho de blogs em geral.
Mas é uma interminável história e fica para outro post. Se alguém estiver
disposto, acho que topo trocar umas visões impressionistas.
Quanto ao alvoroço em torno de manifestações legítimas ou
não, queria lembrar que no chamado meio acadêmico também rola picaretagem, não
raro da grossa. O que não falta é doutorando especializado em plágio.
Último mas não menor, com relação ao ofício de escrever,
Roberto Piva em sua Autobiografia Selvagem cita John Cage: “Sou pela multiplicidade, a atenção dispersa e a descentralização, e
portanto me situo do lado do anarquismo individualista”. Desconfio que isso
tenha a ver com a supramencionada liberdade de um escritor escrever o que lhe
der na telha. O resto é fôdasse.
Não quero ninguém atravessando meu gingado.
E, cá entre nós, pro público internáltico tá bom demais. Particularmente
me dou ótimo com a moçada digital. Bem mais que (com) os vetustos voltados para
as coisas da academia. Volto correndo sempre que ouso os ler. São severos além
do razoável. Pra que levar os conceitos literários e as palavras tão a sério,
oras? Os carinhas vivem exigindo respeito. Cuidado. Compostura. Caracas, que papo
antiquado. Saiu de moda há séculos. Veja a molecada nas escolas: o professor
que se atrever a querer impor disciplina leva logo umas voadoras na fuça. Mano,
o resto é prosa. E prosa é papo da ditadura.
Os distintos não sacaram que internet não é museu onde eles
vão entrando meio se cagando de medo de sujar o tapete ou esbarrar nos cristais
do século 16. A galera tá mais a fim é de falar merda, botar os pezão na
mesinha de centro, cuspir no carpete, trocar um lero. Moralista tá cum nada. Bloguismo
é liberdade e democracia e cada um faz o que quiser e pronto. Esses puristas de
merda deviam é procurar o que fazer. Veja o caso do Kant. O cara escreveu 5 mil
páginas a vida toda só pra tentar reformar a metafísica através da
epistemologia. Pode? E o tal de Proust, então? Levou a Recherche pro Gallimard
e o Gallimard perguntou “Porra Marcel, 15 mil páginas só pra dizer que ama mamã?
Num dava pra falar isso em duas frases sucintas? C’est TROP ALLÉGORIE POUR TROP
PEU DE SAMBA!”