Nem oito anos e já estávamos de saco
cheio de tudo, convicto de que a experiência humana é um erro, não sabíamos em
relação a que, claro, nunca tínhamos vivido antes para saber, mas tremendo dum
erro e já não podendo mais ouvir as exortações dos curandeiros da capacidade
humana em ser feliz decidimos que não precisava mais provas de que tudo acabava
aqui, já um cara tenso, Porra, a tensão dos nossos oito anos, gurizinho sofrido
e quando escutava alguém dizer que fulano ou sicrano estava com úlcera e sofreu
enfarte e derrame, inda tão novo, conclusão: não há como escapar.
Não há como escapar.
Qual é o problema, Porra? desviamos dos
insanos que dirigem automóveis na nossa affelandrepublik, seria assim em outros
lugares? A maior prova da incivilidade do janaílson é o trânsito, são todos
darwinistas, Fôdasse o outro que quem tem direito nesta Porra somos nós, sai da
frente desgraçado senão te passo por cima, conosco tem erro não, deu bobeira
atropelo mesmo, quer atravessar a rua, madame? ouse lambisgoia, chegar em casa
é um eterno espanto, incólume, sem morrer, sem matar, o carro também inteiro,
que raça, e ter de engolir os fascistões, aonde vamos agora? qual é o maior
problema de todos hoje? é o formidável ilimitado poder das grandes empresas,
que os affeländer janaílsones chamam "corporações". Os olhos olham o
retrovisor e os olhos veem um maníaco esbravejando contra mim, os olhos olham
mais para trás e os olhos veem que deixei que nos chupassem o sangue. E quatro-quintos
dos que têm o sangue chupado não sabem, milhões torrados em benefícios extras
para executivos e toda força ao marketing e cometem toda sorte de indulgência,
extravagâncias, mas não investem a mais minúscula quantia no que realmente
importa, informação, gastando "muito" pouco em detetives porque
executivos dão ênfase a tolices que só servem para lhes inchar o ego. Dediquei
noventa e cinco por cento do nosso tempo para chegar aonde estamos, me fodi com
fé e coragem, gastei o que tinha e o que não tinha, plantei as sementes certas
para colher esta autodisciplina marcial que hoje é o que nos garante
arrozfeijão, protegendo o caule, negociando sob mau tempo, lidando com
tempestades e consertando seus estragos, agora somos obrigado a recomeçar tudo
de novo, os conceitos que nos regem a todos hoje são ditados pelas corporações que logram disseminar a idéia de que todos lhes devem
oferecer tudo e a elas cabe retribuir quase nada, escutandoo essa palavrinha
calhorda competitividade há anos, mutreta de biguemaquianos
protestantes darwinistas organizados convictos do poder humano que fizeram
picadinho da nossa confortável pachorrenta cultura niilista da indolência com
princípios como qualidade de produção e atendimento de prazos e preços baixos.
Pra começo de conversa, dizem, você tem de estar assentado nesse tripé.
Metáforas, metáforas, dos Filhosdaputa mutreteiros, quando ouvi essa coisa a
primeira vez não sabia que esperavam que eu fosse sobrenatural, ingênuo,
pensamos, seria capaz de suplantar nossa preguiça macaquita e que no fim
ganharia um prêmio adicional por isso, um pedaço da torta de maçã, a como devia
ser deliciosa aquela torta de maçã com cheiro de Buceta chique que os loiros
saudáveis saltitantes biguemaqueanos exibiam em seus filmes com cara de quem vai
comer a torta e depois a Bucetinha asséptica aromática da housewifinha
anglicana, cuzinho nem pensar. Hoje sabe-se que decorar a odisséia homérica de
trás para a frente e depois recitar as páginas amarelas de tókio na ponta da
língua seria mais fácil. Pressiono até o fundo o pedal do acelerador, as mãos
fecham os olhos alguns instantes, quando tento levantar as pálpebras não
podemos, parece que não vamos conseguir reabri-los, só temos noção de estar
zonzamente louco, precisamos saber quanto tempo conseguiria dirigir sem
enxergar no trânsito de foragidos do hospício, finalmente, por milagre, a mente
acha, nossos olhos se escancaram, caralho, penseiquefôsseofim. Parece que
estamos ficando sem energia e a ideia não sabe se podemos abrir mais um pouco o
gás. Temos medo de explodir. Isso tudo claro não é razão para ser pessimista.
Hoje em dia não ganhar quase nada pelo seu trabalho, não importa quão penoso,
provavelmente é mais saudável do que estar completamente desempregado como se
você caísse em buraco sem fundo dia após dia e os sabichões que recomendam que
todos nos devemos dedicar plenamente à nossa "carreira" agora só
podem sugerir que nos internemos no charcô, na década de cinquenta, sessenta,
setenta, oitenta e noventa a vedábliu ajudou a fazer a história com os carros e
caminhões que fabricou e quando vieram para affelandrepublik nos anos cinquenta
estavam se arriscando mas hoje não é mais o caso, dizem. Estamos construindo
uma planta completa com sistema viário, infraestrutura, drenagem, rede elétrica,
rede de água e esgotos, praticamente todo investimento necessário, tudo com
grana dos sandrinílsones, queria ver esse servilismo condenado e a petulância
gringa esmagada sob gemidos impregnados de revolta, entregar o chão sagrado
virgem em sangue a uma companhia estrangeira que veio nos ensinar a
"competir", desesperados bovinos fritsílsones baixando os olhos
humilhados e, servis, decidem que não importa se lhes dá um punhado de
empregos. Biguemaquianos aparentemente gostam de pensar que há curioso contraponto
entre as maravilhas que engendram e as bugigangas que nós tão desajeitadamente
tentamos construir. Abrindo nossos braços a eles estaríamos assegurando
preciosa oportunidade de pôr fim a séculos de selvageria. Nos olham lá do alto
e parecem deixar transparecer que fizeram tudo que puderam, tal como fizeram
na coréia e vietnã mas que no fundo não dão a mínima, que importa? Todavia
nunca perdem a oportunidade de nos deixar claro que são nossa única esperança
de estancar o emaranhando processo de instabilidade a que estaríamos condenados
e que seríamos sábios se reconhecêssemos que nossa renúncia e subjugação à
inexorável grandeza e poder deles seria o melhor a fazer não apenas para nós
mas também para todos os outros povos de terceira categoria batendo a cabeça
por aí. Confrontação seria inútil e estão sendo amáveis o bastante para nos
deixar fazer o trabalho deles para eles em nosso país e assim aprendendo com
eles até um dia quem sabe conseguir de alguma maneira alcançar a disciplina e a
organização com que solucionam os problemas do gênero humano na Terra, idéias
que passeiam preguiçosamente nas mentes da pessoas da nossa geração e algumas
outras mais que os olhos veem feito uma mancha bem no meio do tapete da sala,
que no faz sentir vergonha quando aparece uma visita, com moleques cuja única
aspiração é ser consumidores mas ao contrário de como éramos em nosso tempo
ignoram sua história e seu lugar e se conectam no distante que não tem nada que
ver com eles e sonham em ser homens sem rosto sem pais e sem filhos sob hirsutíssima camada de balangandãs, o doloroso é que não temos saída, temos nosso destino
decidido paragraph period. Tudo estaria bem se pudéssemos nos isolar na floresta
amazônica, vestir fantasias de silvícolas, com tudo de bom e ruim que isso
implica, não podemos suportar as angústias que nos foram impostas pela
racionalidade anglo-saxã e seu tirocínio inconformista e objetividade
anglicista, não nascemos para ter responsabilidade individual, a ética só é boa
quando não praticada, o papa é nosso rei, o padre, nossa piada, o peru assado
não cabe na nossa lusitana salada mameluca de acarajé com pizza de gorgonzola,
porra como tem pizzaria na nossa affelandrepublik. Taco novamente o pé no
acelerador mas agora com o cuidado de não fechar os olhos. Paro no portão principal
da vedábliu, informo ao guarda que carlos mendes está à nossa espera, ele volta
à sala da segurança, telefona, faz que sim, anota a placa do Miata numa ficha e
levanta a porteira para eu sair da senzala e entrar no século atual. Pelas
lentes manchadas de suor dos nossos óculos os olhos olham carlos mendes,
ianquíssimo cravo na lapela, fixando um olhar paternal no nosso rosto no
departamento jurídico da vedábliu. Carlos mendes é um rapaz de cara brejeira,
exalando ao mesmo tempo infantilidade e a confiança de quem nunca age por
impulso. Autocontrole biguemaquiano. Esses filhosdaputa aprendem rapidinho as
táticas, a indumentária, os trejeitos e as atitudes do predador, pensamos. O
cerebralismo do oeste deve ter sido instilado nele e nunca mais o deixou, fosse
qual fosse a razão. Queria te esfregar algumas verdades nessa cara de bebê sem
vergonha., o corpo fica tentado a dizer assim que nos aproximo. Ia ser
engraçado ver a reação dele. Já esteve aqui antes? ele pergunta, algo de
insolência nos olhos vazios de quem não se dispõe a assumir a culpa pelos
próprios pecados. Privilégio de patrão. As instalações do departamento jurídico
da vedábliu não são um ambiente agradável para as visitas, não é fácil um
sujeito como eu sentir-se à vontade neste lugar. E mendes não facilita a
comunicação. Os olhos olham em volta para tentar suavizar aquele olhar besta
fixo em nossa cara. Em vão. numa mesa próxima está um sujeito em cuja mesa há
uma plaqueta escrita "Jaime Breda, subgerente", cara de quem parece
incapaz de falar mais de duas palavras por dia. E há também um paraguayo de
rosto anguloso hostil e olhar frio e inamistoso, que um neurocirurgião
certamente gostaria de tirar um eletroencefalograma do sujeito para poder
mostrar a seus colegas em simpósios médicos. Senta aí, mendes ladra. Seu
mendes... tartamudeio e paro. Diga. Não temos tempo de sobra, você sabe. Você
sabe, você sabe. Porra. Nunguento mais esses cacoetes linguísticos do oeste.
Bem... seu mendes, estávamos pensando se a gente podíamos deixar para outro dia,
porque… Nooope. Ele corta estridente. Fez-se um acordo e você vai cumprir. E...
eu pensamos que… Não. Temos mais que fazer além de ficar aqui escutando
choradeira. A mente acha que nos arrependi. Eu só… Se não está disposto a fazer
isso, cumpro nossa ameaça. A não. Estamos satisfeito com nosso acordo. Só…
Afinal, vamos só curtir um pouco. Não é pedir muito. Quem sabe depois te
arranjo uma oportunidade de trabalhar com a vedábliu. A, seria muito importante
para mim. Não parece. E não vai doer muito. Você vai ver. A mente acha que não
vai doer nada. mumunho, a voz sumindo na garganta. Não queria dar uma impressão errada. Estamos satisfeito com o acordo. Positivamente. Não fale como
se a alegria fosse um sentimento atípico, okay? O segredo da vida é saber
desfrutar da tristeza. Encolho os ombros para mostrar que tinha entendido e
aceitado e dizemos okay. Bye-bye. Ele estala os dedos num gesto rude de
dispensa.
continua em Ele voltou X
continua em Ele voltou X