dra. Samira quinta quinze e vinte

Ao contrário dos metafísicos, nunca questionei, nem jamais questionaria, por que o mundo existe. Estranharia é se não existisse.
Liberdade não passa duma racionalização provocada pelo desejo delirante qual tantas inúmeras das nossas distorções perceptivas em colisão com emoções, sentimentos, memórias, intuições, e o mais próximo que consigo chegar da noção é deixar, ou tentar, meu pensamento bater asas na direção que lhe aprouver para pousar no galho que lhe der na telha (...) Missão impossível, claro. Você tem de se munir de forças e a encrenca já começa com a escolha das palavras e você então precisa se convencer de que elas não levarão embora seu élan quando perecerem, forem embora, fugirem da luta, desertarem, te pregarem uma peça. Pensamentos batendo asas? Pensamentos pousando em galhos? Veja como imagens empobrecem, metem as palavras dentro duma carapuça para lhes roubar o significado e, pior, a significação. Escrever não é moleza, escrever honestamente, menos ainda.
Tinha parado de ler Pessoa anos atrás, recaída braba meses pra cá. Pessoa pulveriza todos os outros poetas e até prosadores, te monopoliza, te escraviza, te joga num interminável meio-metro de wasteland. Críticos literários há que reclamam dos imitadores de Pessoa. Mas há os que não o imitam? As poesias inglesa e americana, as melhores, não; para eles Pessoa é um mero sucessor de Whitman, cuspo para a ignorância arrogante. Pessoa não é o Shakespeare da poesia do século 20 porque Portugal é insignificante e o português tem tanta importância no mundo culto quanto um dialeto de Katmandu. E, como disse dia desses, continuará desconhecido. A grande poesia é intraduzível. Porque poesia não é pensamento, não é inteligência nem palavra. Os sindicatos esquerdalhos de professores do brasil varonil bem que podiam orientar seus membros a fugir da idade da pedra em que batem cabeças e aprender a ler poesia para ensinar a seus alunos. Um mundo sem poesia é inconcebível. Um mundo sem poesia é este em que vivemos, inviável. Cansei de viver porque, entre outras razões, não tenho com quem falar de poesia. Da maneira como deve ser falada. Da minha maneira.
Saudade doida de pegar fogo. Entendi agora. Sempre bebi pra me incendiar. Apagado sou um fiasco. Bem lá no fundo mamãe deve ter sacado que aquele 14 do 12 tinha parido um foguete latente e, pobre roceira, morreu de medo de me acender. Escuta, liberar, ou ao menos tentar, a fantástica energia retida em cada coração não pode fazer do mundo calamidade maior do que ele já é. Cada um dos nossos controles civilizatórios tem sido inútil até aqui e a pletora de teorias e princípios e planos e metas que vimos elaborando e implantando e observando não tem dado conta de meio por cento do caos que nós mesmos geramos. O Estado Islâmico é apenas o começo, baby. Não há paz, não há convivência possível, quem quiser continuar vivo terá de matar. É assim desde o começo, por que agora seria diferente? Nossas racionalizações bem-comportadas não passam de piadas que inventamos para tentar aliviar o susto de enxergar um monstro quando nos olhamos no espelho. O resto é PC.


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