A cafeteira grunhe, o café está pronto.
Quer desligar o fogo para que não queime
eternamente.
Precisa escrever o poema que nunca
escreveu.
Tudo parecia relativamente bem até ontem,
apesar de tudo estar intoleravelmente mal como sempre.
Tenta girar o botão, o botão se recusa.
Nos últimos tempos essa medonha tentação
de dar um fim a tudo que escreveu até hoje.
O fogo queima implacável.
Ontem ela chegou à cidade, disse alguém.
Podia ser sua libertação. Ou sua danação.
Sua definitiva danação.
Essa chama não pode persistir para
sempre, alguém precisa fazer alguma coisa.
Anos, inomináveis anos sem escutar a voz
dela, como pôde?
Precisa esquecer o poema que nunca
escreveu.
Vou telefonar, pensa, olhar hipnotizado
pela flama azul.
Telefonou depois de hesitar o dia
inteirinho.
Ela morreu, alguém disse do outro lado. Morreu
dum mal súbito. Há anos.
O café parece espantosamente frio. A manhã, pavorosamente fresca.
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