Não compreendo uma árvore.
Não compreendo que se abra numa profusão
de lâminas que podem tomar aleatoriamente a forma bipinulada, espiralada, aristada,
acicular, linear, lanceolada ou tantas outras. Não compreendo por que um botânico
queira me explicar por que deve ser assim. Mas compreendo que a árvore se
sustente num caule cuja espessura será proporcional ao tamanho e ao peso da
copa. Não compreendo seu porte nem por que pode ser pequena ou grande em relação
à que brotou ao seu lado. Não compreendo sua figura inorgânica. Não compreendo sua
ramagem nem cada um de seus galhos longos ou curtos, grossos ou delgados, lisos
ou ásperos. Não compreendo que uma árvore se junte a outra e outra para formar
uma floresta. Definitivamente, uma floresta é para mim o que há de mais incompreensível.
Não compreendo uma árvore. Não compreendo
sua sombra nem quem a procure para se deitar. E não compreendo quem não a
busque. E não compreendo crianças que gostem de trepar em árvores, nem tampouco
homens que sequer cogitam fazê-lo.
Não compreendo uma criança. Não compreendo
um homem, embora compreenda que não há um nexo entre uma incompreensão e outra.
Tampouco compreendo uma mulher. Não compreendo
que mulheres se liguem a homens para gerar um ser. Por que e para que,
compreendo ainda menos.
Não compreendo uma salada de agrião e brócolis.
Não compreendo uma rua sob a garoa fina.
Não compreendo um búfalo, uma prece, um
par de velhotes jogando dominó na mesa dum bar, uma tartaruga botando ovos numa
praia pela derradeira vez, um rock entreouvido em alguma casa da vizinhança.
Não compreendo meus pensamentos e muito
menos os dos outros. Não compreendo minhas verdades nem por que os outros não
as compreendem. Não compreendo por que não me compreendo, por que ninguém me
compreende.
Não compreendo por que escrevo mesmo
assim.
Não compreendo por que o que menos quero,
o que menos tento, o que menos preciso neste mundo é compreender.
Do que existe no universo não compreendo quase
coisa alguma: a luz que ilumina as estrelas e os planetas e o olhar na beleza
dum rosto dentro do ônibus no fim desta tarde de dezembro que me vislumbrou com
compreensível indiferença.
E hoje, depois de existir por tenebrosas noites
antecedidas de imemoráveis dias, cada qual igualmente incompreensível, finalmente desisto de compreender a vida. E por que tive de vivê-la.
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