Sábado, descendência italiana e nunca fui à Suíça
nem visitei a Flip. Tampouco tive um tórrido affair c’uma mulher deslumbrante. Pelo
que agradeço aos céus, caso contrário meu coraçãozinho de frango teria ficado incicatrizavelmente
dilacerado pelos unhões da jaguatirica. Convicções tive poucas e as poucas que
tive acabei perdendo. De uns meses para cá certas partes do meu corpo cederam à
flacidez e às vezes levo um susto quando me flagro diante do espelho, sabem
como é, a primeira impressão, a da infância, é a que fica e primeiras impressões
muito dificilmente sucumbem a uma segunda. Ontem, sexta, uma depressão voraz,
pensei que não fosse resistir, me mortifica tentando imaginar o que farei quando a famigerada me carregar para o
próximo estágio. Hoje a depressão deu lugar a este meu inefável tédio velho de
guerra. Parecem ser irmãos siameses, duas faces da mesma bidu, o início da dor,
a passagem insentida, o fim do nada. Dou o melhor de mim quando me sinto num
dos meus infinitos becos sem saída e nunca me ocorreu apelar à boutade “se é beco sem saída, então a saída não se
mostra”. (Não se mostra sob as pistas de sempre que me habituei a rastrear.)
Atravessava a rua sonambulamente, me recostava à parede diante do ponto e dava
prosseguimento aos meus deleites oníricos tão brutalmente interrompidos por mamãe
ou papai. De olhos abertos. O resultado é que um mundo de ônibus passavam sem
que eu me desse conta, entretido que estava nos braços de Silvinha cachos
dourados de caracol a me jurar com sua voz firme de menina-mulher que podia
ficar tranquilo, meu lugar no mundo ao seu lado estava assegurado e melhor
faria se me despedisse de vez daquele meu maldito ciclo de depressão excruciante
seguida de vazio entediante crucificante. Despertava do transe com Silvinha
depois do enésimo busão que ligava a Vila Gerty ao Centro e, se não fosse
circular – se fosse, ia dar um rolê pelos lados da Vila Maria e Vila Barcelona –,
ainda daria tempo de pegar a saída das aulas e, disfarçadamente, seguir
Silvinha até sua casa na Rua Pernambuco sonhando, agora dolorosamente acordado,
que um dia reuniria coragem para chegar junto durante o trajeto de seis quiméricos
quarteirões. Ao fim dos quais adviria aquele meu estado em que me recusava a
pensar. Sentava no último banco do Vila-Gerty e retomava minhas aventuras com Silvinha,
agora já avançando para suas axilas perfumadas a jasmim-manga. Não raro tornava
à casa já noitinha e se mamãe um dia se dignasse a indagar onde eu tinha
andado, não saberia honestamente responder. Tomava banho, jantava a inigualável
sopa de feijão e couve que hoje me é sinônimo de infância, assistia National
Kid deitado no colo de papai no sofá da sala, deitava para logo me embalar nuns
sonhos esquisitos de enredos temerariamente prováveis com meia dúzia de
motoristas de ônibus, alguns dos quais meus camaradas de outros anos.
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