A rebelião das pizzas


Pessoas, fiz esta apresentação para os desejem me conhecer minimamente e quem sabe aprofundar um pouco o nível de interação entre nós sem se assustar em demasia.

Antes, uma brevíssima introdução

Muitos de vocês certamente pensam que as alusões que alguns de nós temos feito às elites sejam apenas piadinhas sem maiores consequências. Por Deus, não são, não. Nós aqui levamos — e devemos levar  muito a sério o papel de escol que desempenhamos na comunidade social, a comunidade verdadeira, em que vivemos.
Desde o começo fui contra a campanha de bastardização literária que ora está em curso. Devemos ir de encontro a esse movimento de indigenciação com todas nossas unhas esmaltadas com enamel Chardin Brodeurs e nossos dentes clareados com gel de peróxido de carbamida.
A partir da presente data os novos patronos deste meu querido Website serão Gasset y Ortega. Finalmente teremos uma identidade à altura de nossa linhagem. Tudo bem, ainda pairam algumas dúvidas quanto à origem nobre de Ortega e o paradeiro obscuro de Gasset. Sabe-se, por exemplo, que Ortega nasceu no número 620 da rua Manoel Coelho, pertinho aqui de casa, e que a família do rapaz atuava no ramo de restaurantes. Ora, não é porque o gajo recendia a alho e cebola do Ceasa que deixaremos de honrá-lo como ele merece. Quanto a Gasset, dizem as más e infectas línguas que ele parece mais um personagem saído de Educação sentimental, de Flaubert, mas essa versão ainda é extremamente controversa. O fim do rapaz, entretanto, é bem conhecido. Ao desembarcar em Cumbica oriundo de Paris, ele entrou num daqueles radiotáxis que fazem o trajeto aeroporto-Vila Prudente e nunca mais foi visto. Provavelmente seu cadáver esteja hoje enroscado em alguma pedra no leito do rio Tietê, pauvre.
Agora, retomando o nosso assunto, cumpre fazer alguns esclarecimentos.
Comecemos pela descrição deste superfaciente sítio literário. Já passou da hora de avisar a todos que não, tal descrição não é uma gracinha tola destinada a entreter internautas ociosos. Estou ciente de que alguns leitores têm alardeado por aí que essa descrição é apenas um simulacro para despistar distraídos, que dão aos montes por aí afora. Acontece que essa explicação, por si, também é um despiste. O resultado dessa dupla dissimulação é que ela se autoanula, tal como dois fatores com o mesmo sinal, daí ficando a falsa impressão de que estamos aqui apenas para fazer piadas.
Sempre tive vontade de desempenhar um papel na elite da minha rua, do meu bairro, da minha cidade, do meu país. E para poder fazer jus a nosso papel de elite, é meu dever cuidar para que o intercâmbio de ideias e de opiniões se dê sempre de modo a evidenciar que sou inteligente e sei pensar. Mais: considero ser meu dever, como indivíduo de intelecto e posição social privilegiado, primar pelo bom uso da semântica, da retórica, do léxico e do vernáculo. Se e quando instado a demonstrar nossa verve para um fim especificamente nobre, poderei até mesmo empregar a grandiloquência sem dó nem piedade. Vocês sabem, nenhuma arma é cruel demais quando o propósito é dizimar a plebe iliterata.

Qual é, afinal?

Certo, pessoal, reconheço que alguns de vocês talvez estejam boiando mais que peixe morto no mar de São Sebastião depois de vazamento de óleo de cargueiro da Petrobras. Bem, só posso dizer por ora que pertencer à aristocracia intelectual requer algum sacrifício. Não é à toa que estamos aqui. Cada um de nós tem a obrigação de envidar esforços para evoluir individualmente, de modo a ajudar a promover o bem coletivo. Se fôssemos egoístas e preguiçosos seríamos simplesmente iletrados, não é mesmo? Ou então nos contentaríamos em trocar vitupérios como sói ocorrer nos mais pobres websites da rede.
Como é notório, constituímos uma dissidência nobiliárquica do Grande Fórum da Vida. Acredito que todos já puderam atestar pessoalmente a limitação dos debates naquele antro. Eu mesmo participei deles por alguns anos e não pretendo voltar. Admito que algumas vezes cedi ao clamor dos instintos e cheguei a recomendar veementemente a um ou outro ser banal que internalizasse as próprias palavras por via retal. Posteriormente me arrependi. O pecado, vocês sabem, não está em errar, mas em não reconhecer o erro.

Estou no ponto

À altura em que nos encontramos, penso estar apto a trocar o ícone populista que ilustra este sítio por algo que realmente traduza minha estirpe. Bem, minha sugestão nesse sentido é aposentar incontinenti o rosto amanhecido do fulaninho que aí está e usar nada mais nada menos o semblante tenso e profundo dos grandes, dos insuperáveis pensadores franco-espanhóis Ortega y Gasset.
Há entre vocês uns que ainda acham que Arnaldo Sin Jabor é representante de Ortega e Diogo Mainardi, de Gasset no Brasil. Não poderia haver engano mais ledo. Se você pensa que Jabor seria capaz de dizer uma pérola divina como “Não sabemos o que está acontecendo conosco, e é exatamente isto que está acontecendo conosco, não saber o que está acontecendo conosco (...)”, se você de fato pensa isso, bem, só posso concluir que você está no website errado.
Há mais de 70 anos Ortega escreveu Rebelião, sendo logo acompanhado por Gasset, com seu das Massas. A partir daí ambos passaram a ser conhecidos como os pensadores mais elitistas que já pisaram em terras paulistas.
Ortega y Gasset defendem que o homem-massa de hoje habituou-se a exigir para si apenas privilégios, sem a contrapartida da responsabilidade. Absolutamente alienado dos obscuros mecanismos subjacentes à vida moderna, o homem-massa se acha detentor de todos os direitos e isento de todos os deveres. Como vocês já podem deduzir, é exatamente essa dicotomia que está por trás de ideologias espúrias como o paulocoelhismo.
O paulocoelho da vida, mesmo sendo um serzinho desprezível, inculto, despreparado e, sobretudo, preguiçoso, se pensa capaz de ombrear-se aos “homens de excelência” de que falam Orsset y Gatega. (Sim, a ordem dos nomes de ambos é indiferente, embora Ortega postulasse que não. Mas essa discussão não vem ao caso no presente ensaio.)
Esses homens de excelência, naturalmente, somos todos nós que temos coragem suficiente para dar um passo avante e tomar em nossas mãos a responsabilidade pelos rumos das nossas vidinhas. Cabe a nós a tarefa da criação do paradigma pelo qual o homem médio terá que se pautar. Cabe a nós o dever de fazer eu, ele, você avançar na direção que elegemos a melhor para nós mesmos e para os nossos. E cabe a nós assumir a responsabilidade pelos nossos próprios erros e acertos. Embora Ortega y Gasset não tenham particularizado a definição de passivismo e imaturidade do “homem-massa” no sentido de que são uma resposta ao poder infantilizante de um paradigma hierárquico de dominação, ambos distinguiram o estado inerente do homem (e também da mulher). Como vocês já perceberam, estou me referindo à excelência. É por essa razão que podemos nos chamar vanguarda, ou grupo seleto, pois que assumimos a missão de quebrar o encanto da passividade, da sina de seres dominados e escravizados.
A partir daí fica evidente a forma solerte como determinados leitores a quem não vou me dignar a nomear planejavam nos submeter a todos a um regime de força, ou seja, na tentativa fracassada de nos atingir em nossa prerrogativa de homens de excelência para nos subtrair de nossa liberdade mesma. Quando somos livres, somos livres não apenas para exercermos o livre arbítrio, mas também para exercermos a excelência. O conflito comunismo-capitalismo certamente é o exemplo mais completo do que Ortega y Gasset pretenderam expressar. Enquanto num o homem abdica de sua prerrogativa de escolha individual para sujeitar-se ao arbítrio e discrição de um terceiro, o que, evidentemente, está fadado ao fracasso per se, noutro ele está livre para explorar a vasta gama de estados naturais do ser humano, podendo, se quiser, passar fome ou criar os mais sofisticados e maravilhosos sistemas de promoção do bem-estar e do conforto jamais sonhados pela mente humana.
A maioria de nós brasileiros abdicamos do nosso poder e da nossa responsabilidade em favor de, no dizer preciso e insuperável de Gasset y Ortega, outro alguém. Não confiamos em nosso governo (se é que me faço entender), mas, ao invés de tomarmos a solução para isso em nossas mãos, escalamos outras pessoas (se é que me manjam) para fazê-lo. Não podemos ser “homens-massa” sempre a exigir cada vez mais programas governamentais, mais qualidade de vida e pizzas com maior variedade de sabores, ao mesmo tempo em que sequer prestamos serviços voluntários em nossa própria Comunidade, como se não fizéssemos parte do meio em que vivemos. Uma simples postagem num tópico eletrônico a cada 2 ou 4 anos não é o bastante! Temos de nos conscientizar que é nossa obrigação trabalhar dez, vinte vezes mais. Para cada dez distraídos iletrados, temos de contrabalançar com dez vezes mais suor. Na vida não acontecem milagres.
Ortega y Gasset tinham desprezo pelo homem médio obcecado por preservar seus privilégios de classe e ao mesmo tempo fugir do domínio das elites e do nivelamento por baixo das massas.
Assim, peço que a partir de hoje todos os leitores leiam A Rebelião e das Massas, os dois mais importantes livros dos nossos amiguinhos. Dessa forma evitaremos vexames como querer dizer algo mas não ter a mínima ideia de como fazê-lo. Um tema perpassa os vários artigos do livro: é o nascimento da sociedade de massa, que hoje, aparentemente, está assumindo um caráter de verdadeiro império. Quando assistimos aos desmandos e o discricionarismo daqueles determinados leitores, vemos que não há nada mais pertinente e oportuno.
Mas Ortega y Gasset não se limitaram a desprezar o homem médio. Na talentosa prosa que vibra sob os conceitos da Rebelião, eles elaboraram uma crítica demolidora ao postismo diletante.
Por último, é mister salientar que, infelizmente para alguns poucos, não será mais considerado de “bon ton” citar Paulo Francis, seja qual for a razão. Se fossem vivos, Gasset y Ortega fariam picadinho do jornalista campeão em citações de autores obscuros por centímetro quadrado. Quem conhece Francis a fundo sabe que ele não manjava lhufas de Ortega y Gasset, obsessivo que era por Edmund Wilson, Arthur Koestler, Freud, Eliot e Joyce. Mas até aí, Olavo Carvalho não conhece nem Ortega, nem Gasset nem nenhum outro autor que valha a pena ser citado, então estamos quites.
Finalmente, solicito aos meus queridos leitores que me enviem seus nomes à medida que concluírem a leitura da Rebelião. Quando todos tiverem feito isso, iniciaremos uma nova fase em nossa existência: todos escreveremos em latim.

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