Clareza da água sanitária

Não gosto nem nunca gostei de visitas. Só gosta quem acha que perdeu algo por aí no mundo. Já sei: quem não gosta de visitas não quer deixar rastros, não é? Será esta conclusão válida? Mesmo que não, ou pensem que não, peço que entendam.

Preciso confessar, tenho saudade daqueles tempos em que aceitava a existência alheia e brincava no pátio da escola e na vilinha do Roberto. O Roberto era gordo qual anta e tinha cara de delibóide, digo, debilóide. Nunca mais tive news dele. Nunca mais vi mais gordo. O baleia me detestava. Por que será?

Quem não gosta de visitas passa aos outros uma impressão de ser inconfiável. Isso sempre me deixou triste. Pois sou. E não quero que confiem em mim. E querer isso é para mim um avanço espetacular. Quero ter amigos. Amigos que me deem uma opinião sobre um livro que estou escrevendo. Amigos que me respondam. Sou sincero. Cansei de brigar. Com tudo e todos.

Hoje não consegui dormir. Fiquei lá deitado, esperando. Esperando o quê? Um convite. Aquele que enjeitei a primeira vez. Me perguntava se ainda estaria de pé.

Agora que fiz esta confissão tô me sentindo leve. Saiu um chumbo do meu peito. Ufa, como foi que pude respirar até hoje? Sabendo que há tantos visitantes potenciais no mundo aí fora, gente ávida por me conhecer de perto, presenciar meus movimentos, saber o que me leva a fazer o que faço.

Sei quão dura é a vida sem plateia. Todo esse tempo vivendo pra ninguém em solidão abissal.

Temos de viver por algo. Ou alguém que se disponha a testemunhar a infernal inventividade dos que existem para criar.

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