Nas voltas do meu coração

O tempo é a nossa única dimensão interessante e que conta. Não tem presente ou passado. Quem tem é a história. Futuro não existe, é uma abstração. O mundo ainda não acabou, fato, não significa que não acabará daqui a 3 segundos ou 10 minutos. Taí algo que a ciência não tem como "comprovar".

Einstein disse, entre outras definições, que tempo é o que o relógio mede. As descobertas do rapaz levaram à teoria quântica em que fenômenos que regem nossas vidinhas ocorrem não se sabe em que grau sob a lei do indeterminismo em que tudo é uma questão de probabilidades, i.e., acidental, i.e., se a melindrosa leitora não captou a implicação medonha, somos serezinhos brotados do lodo mais ou menos ao acaso, nossas vidinhas não são governadas por desígnios divinos, vamos padecendo aos trancos nos barrancos deste vale de lágrimas velho de guerra sem a mínima idéia de onde saímos, onde estamos e aonde iremos, quem somos e outras duvidazinhas que fazem dos nossos coraçõezinhos bombinhas-relógio decoradas com lacinhos vermelhos de chumbo e fel.

Os estudiosos quânticos puseram/põem na mesa enigmas como os pósitrons, elétrons que se movem para trás no tempo, e os táquions, demonstrados matematicamente, partículas mais rápidas que a luz que talvez possam subverter a ordem temporal que conhecemos, nossa noção de sucessividade, o modo como vemos as coisas ocorrendo no tempo, e outras belezinhas mais ou menos básicas para a nossa frágil mentezinha amanteigada. O pessoal, parece, descobriu que a seta do tempo pode ser invertida, qual naquela bela novelinha de Martin Amis, Time's Arrow. A máquina do tempo provavelmente será questão de, ã, tempo. Tem até um físico americano, John Wheeler, que disse haver fenômenos em que eventos ocorridos agora podem afetar o curso de eventos já ocorridos, quac.

Tudo isso é deveras intrigante, larirá-lirari. Desde Aristóteles a rapaziada vem peleando para espetar uma etiqueta no peito do bicho e partir para outras questões secundárias aguardando na fila das verdades científicas que viram de ponta-cabeça a cada seis meses. Não importa o que se descubra daqui em diante, não vai dar tempo de salvar nosso lindo ex-bucólico planetinha. A menos que defacto inventem a máquina que nos levará rumo ao futuro passado, quem sabe. Até lá, Marx, el gran sacador, reduzido a chefe de torcida organizada por direitistas/esquerdistas boçais engalfinhados na imorredoura bobageira ideológica, por culpa do "pragmático" Engels, me parece ainda insuperável em que o que conta é a história, o resto é detalhe, como definiriam certos confusos jornalistas. O cara teve a sorte de viver a efervescência da Revolução Industrial, que, contrariando meus princípios linguísticos, não posso deixar de pôr em caps. Kant, oquêi, é a rosa inebriantemente perfumada da Revolução, arauto que oficializou a maratona definitiva da humanidade, sob o tiro de largada de Newton, na corrida do conhecimento e do progresso e da autodestruição. O jogo-da-amarelinha quântico é cativante, urdido e tramado pelo mesmo tipo de cientistas que fizeram da Terra o lixão da Via Láctea. O patético disso tudo é que os cabras agora têm pela frente a missão de desinventar a porcariada que nos trouxe a este cul-de-sac. Mas parece que deus não aceita devoluções. Nada vai nos tirar desse encrenca. A fantasia da alienação está à venda em milhões de tamanhos e cores. Um deles/delas serve direitinho na ciência. Entre religiosos assumidamente irracionalistas e cientistas sonambulamente irracionalistas, fico co's primeiros. São menos perigosos.

Pra variar, a última palavra é dos poetas, pessoalzinho que não entende a vida nem tem a pretensão de:

Carrol:

Alice sighed wearily. 'I think you might do something better with the time,' she said, 'than waste it in asking riddles that have no answers.'

'If you knew Time as well as I do,' said the Hatter, 'you wouldn't talk about wasting it. It's him.'

'I don't know what you mean,' said Alice.

'Of course you don't!' the Hatter said, tossing his head contemptuously. 'I dare say you never even spoke to Time!'


Eliot, em Burnt Norton:

Time past and time future
Allow but a little consciousness.
To be conscious is not to be in time.
 

4 comentários:

  1. Interessante o post, mas o fato é que Einstein nunca negou Deus completamente, ele nunca disse que éramos mero acaso, pelo que li/vi sobre ele. Existe um físico, talvez o mais famoso físico atualmete, e que trabalha com física quântica, Michio Kaku, e ele acredita em Deus, da forma dele... que é uma forma racional, com argumentos e tudo. Então cientistas não provam nada, pelo menos não até agora. Até agora é tudo uma questão de opinião!

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  2. O que Einstein chamou de deus foi a "estrutura do mundo na medida em que nossa ciência é capaz de revelá-la".

    Com certa regularidade ao longo das décadas, são feitas pesquisas sobre a opinião dos cientistas sobre a existência dum deus. Uma ligeira maioria se confessa descrente.

    Mas, como digo em meu texto, isso não significa grande coisa para mim. A começar pelo fato de que os cientistas em geral evitam bater de frente com as visões estabelecidas na sociedade. São raros os que têm peito de dizer sinceramente o que pensam a respeito.

    Seja como for, a noção de deus para mim particularmente é irrelevante. Sou um sujeito religioso. Mas não no sentido convencional e sim como alguém que crê que a ética entre as pessoas é a única salvação possível para o beco sem saída em que a humanidade vive se metendo.

    Mais importante para mim do que descrer de deus é descrer do utilitarismo a que as religiões e os "religiosos" reduzem a noção de divindade. Ou seja, para mim a única ideia religiosa que faz sentido é aquela que serve para unir as pessoas duma comunidade ou sociedade.

    Assim como Einstein, deploro o uso "privativo", egoísta, interesseiro que os "crentes" fazem de deus.

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  3. Pois é, mas ele acreditava numa certa inteligência e coerência das coisas, certo?
    E procure por videos do Michio Kaku no youtube, são muito interessantes.
    Eu também lamento essa visão utilitarista de alguns crentes, que só pensam em "se salvar"...

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  4. Meu texto apenas menciona Einstein en passant. O que me importou aqui foi utilizar os desdobramentos da teoria quântica, entre os quais a acausalidade e o indeterminismo a que me refiro, embora não explicitamente, para produzir mais um texto poético. Não sou físico nem tenho domínio formal sobre a matéria, nem pretendo ter.

    Aliás, são exatamente os conceitos a que me refiro que Einstein renegou até morrer.

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