A
primeira vez que te vi,
te
vi primeiro de costas e pensei:
ah!
pudesse um anjo deixar de lado um só dia
sua
missão de encantar seres não angelicais feito
eu e
pôr este mundo do avesso.
Consentisse
um anjo quebrar a aura de gelo eterno
que
o isola dos seres boçais, deixar-se
contaminar
pela dor dum pobre-diabo desgarrado.
Quisesse, um só dia (de todos os dias que já
nasceram
desde que o tempo existe), uma só vez (e a
vez
tinha de ser aquela, de todas as vezes que não foram
minhas),
quisesse um anjo se apaixonar pelo
ladrão
que o espia – pior: espiona feito
predador
faminto de matar a fome de beleza –,
lambendo-o
com olhos doentes,
heréticos
e vagarosos de inveja.
Pudesse
se deixar contagiar de feiúra
a
divindade que, ali diante de mim, indiferente
a
este olhar aviltante de quem para salvar-se sempre
mirou
o chão.
Pudesse
a divindade desistir de se desmanchar, não
desvanecer na atmosfera
como se não tolerasse a raça humana.
Consentir
minha presença, existir na mesma cidade,
no
mesmo dia!
A
primeira vez que te vi,
esse
teu jeito de parar com os pés ligeiramente para dentro,
sorriso
tão simples, tão simples, que custei anos para me
acostumar.
Esse teu jeito de inclinar ligeiramente a cabeça
de
lado ao escutar (muitas vezes duvido que tenhas
escutado
todas as tolices que te fiz ouvir),
o
dia em que te conheci,
a
primeira vez que te vi foi assim.
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