Sob nova direção


Repentina bomba atômica íntima
Paredes se esfarelam rumo ao fundo
Erupções familiares, calhaus do naufrágio, âncoras aéreas
Macia, doce, gosmenta soçobração
E horror
A isso tinha tanto apego?
Escombros
Me agacho, manuseio os fragmentos estilhaçados
Valeria a pena uma triagem?
I don’t think so, mon ami
Tudo supérfluo
Estas obcessõezinhas aqui
Pego na ponta dos dedos, faço cara de arqueólogo, ajeito o monóculo imaginário, viro, reviro, atiro longe
Estes ressentimentos! Que perda de tempo
(Para que mais tempo sem saber o que fazer de mim?)
Engraçado me ver arrastando entre a porcariada, levando  avante a tralha aqui dentro até agora
Fabulosa jamanta sobrecarregada de fezes e chumbo deslizando tonta sobre uma rodinha de triciclo
Veja estes amores não correspondidos da adolescência
Doce, amarga bobagem pela qual perdi mil noites de bom sono
E estas esperançazinhas reluzindo no meio do entulho feito brilhantes
É este meu tesouro?
É por isto que vicejam dentro de mim cânceres, enfartes, cirroses, úlceras em promessa à Grande Recompensa amanhã, ano que vem, nos próximos dez quilômetros lá adiante?
O cogumelo restaurador lança absoluta luz sobre meu abafado íntimo

É a mais efêmera das luzes, por isso aproveito para olhar cada montinho de matéria sentimental – ou seria psicológica? – mal empilhados por todo lado
Aguardam meu sinal para desmoronar

Desmorona, ona, ona
Desmorona, ‘té cair
Desmorona, madrugada
Não deixai meu bem dormir

Ruína, dai a graça de mim
Isto sou eu
(Que amontoado de tolices sou.)
Wait a minute
(É tudo que peço.)
E estes testemunhos do passado
Era com eles que ia desenvolver meu projeto de ser?
Era eu minha arma secreta
Mãe de todas as bombas – não me faltai nesta hora, brava, prática tecnologia internáutica –, refazei-me


Um comentário:

  1. Companheiro sem companhia,

    Palavra muda nada.
    Ponte de palavra é estrada calada,
    Que ata e desata nós de coração
    Que sempre acaba estraçalhado na calçada.
    (Ninguém atropelou, atropelar é ação.)

    Palavra muda, nada!
    Quero mais é conversa de bar que vingue
    As noites que a garrafa passou presa no vime.
    Mas tudo é remoto e distante, falta de sorte
    Ui, vida, cheia de não-me-toques.

    Palavra, muda nada...
    Transforma em tudo para mim este déjà vú
    Do futuro que não aconteceu:
    Caio da rede, sou peixe de ateu
    Que tenta me convencer que não existo eu.

    Palavrão descompromissado,
    Termo ainda não utilizado
    Por não caber ainda no diálogo.
    Que intimidade um puta que o pariu
    Tem-se com aquele que o ouviu
    (Mesmo que seja um hostil).

    Distrair dos sonhos? Puta que o pariu.
    Se são a única coisa que me serviu...
    Coube agora, porque sou moça sem hora
    Sem educação, sem polidez e tenho muito de palidez
    Pelas noites, pelos dias em vão
    Que passo sem conter o estrago
    De um caminho que é tão vago
    Que nem sei eu onde vai dar.
    (Se der, se a coisa não desandar).

    Mas, pálida, insone, com gosto de café e timidez,
    Pensei eu: é minha vez, outra vez.
    Criemos não um caminho, que caminho é sozinho
    Mesmo sendo alma delicada de mulherzinha
    Criemos um jogo tolo como é a existência
    Em toda a sua demência de nos manter vivos
    Neste asilo de loucos alcunhado mundo,
    O jogo é simples, encontre-me um abismo, eu me atiro
    E o tiro vem do fundo do poço em que estou
    Direto para as nuvens que flutuam no seu céu
    Tentativa de furar a bolha que lhe serve de véu
    Porque não o conheço de fato, não sei dos teus atos.

    E sei eu dos meus?

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