0075, a saidera do domingo à noite


É noite de domingo e estou calmo. Nem me passa pela cabeça reler Anna Karênina.

Domingo à noite é um bom ambiente teatral pra você visitar seu museu de cera. É quase certo que encontrará todas suas peças nos lugares, imperturbadas. E não correrá o risco de deparar com algum desconhecido entrando ou saindo. Ou, o que seria muito pior, um conhecido.

Imagino que você tenha um museu de cera só seu. Um museu de cera interior. Que se cria quando você o inventa e deparece quando você o esquece.

Eu tenho.

Não, não me vanglorio disso. Por que o faria? Até concluo que os que não os têm sejam mais felizes.

Se é que ser ou deixar de ser feliz significa alguma coisa.

Você por acaso é feliz?

Não, obviamente.

Se fosse, não teria um blog, nem estaria lendo um.

Se fosse, estaria lá fora sendo feliz. Pois é isso que os felizes fazem.


* * *


Aí é que entra o museu de cera. Uma, digamos, muleta, para os não felizes.

Eles, os do lado de lá, os felizes, fico cá a imaginar, que será que pensam quando saem à rua com seus totós cheios de raça?

Bem, em certos casos posso até deduzir. Pelo olhar medidor que me dirigem. Me estudando. Estudando minha Zezeí. Na certa, do alto dos seus lhasa apsos, desdenham por eu passear uma reles fox mestiça de chiuaua.

De qualquer modo, ter um museu de cera interior pode ser útil em situações como a que passo neste exato instante. Domingo à noite, noite de domingo (pois é, ainda não me decidi), sozinho com  minha fiel escudeira Zezeí, escutando ora James Taylor, ora Edvard Grieg, o mais surpreendente dos românticos.

Que faria agora sem meu museu de cera interior?

Bem, eu sei a resposta, você sabe a resposta.

Lá fora no mundo real já andei todas as ruas, fui a todos os lugares, perambulei feito um demônio e cansei. Não há coisa alguma que me reste ver. E viver.

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