Third of the Year

Quando dá por si Kuhhirten está sentado diante do computador tentando achar algo interessante para fazer na internet, mesmo cônscio de que seria perda de tempo. (Mas, cá pra nós, todos adoramos perder tempo, não é mesmo? Frívolos que somos, vamos brincando com o que não devia jamais ser alvo de brincadeiras.)
Nisso, recebe uma intrusiva chamada pelo skype. (Pois é, esta nossa historia se passa nos primórdios da rede mundial, quando as pessoas ainda trocavam leros eletrônicos.)
— Que diabos quer de mim? — retorque nosso boêmio encalacrado, hesitando se dirige a pergunta a quem vê na tela ou a si mesmo.
— Você caiu na Teia da Idade Mídia, Kuhhirten. Agora está prestes a virar Farofa Internáutica.
Quem dá tal “explicação” é uma mulher de cabelos compridos negros tocando os ombros, lábios sensuais e um sorriso absolutamente asnático, digo, asmático. Tem as mangas da blusa dobradas, pondo à mostra os cotovelos mais pontiagudos e róseos que Kuhhirten já viu. “Tomara que sejam naturais”, sussurra para si mesmo. “Detesto cotovelo de borracha.”
— Teia da Idade Mídia? Farofa Internáutica? Mas que porra?
— Se preferir, TIM e FI, simplesmente.
Kuhhirten olha para si mesmo. (Como se fora possível. Ninguém consegue olhar pra si mesmo. Desculpem a licença poética (LP). Hoje é domingo, se me entendem.)
— Meus pés estão no chão! — brada K (se me permitem outra LP, chamemos o miserável apenas de K, pra poupar uns B&B (tão escassos pra quem, como é o meu caso, tem de navegar via conexão discada. Bem que vonceis podiam fazer uma vaquinha (longe de mim trocadilhos indesejáveis) pra eu poder comprar uma banda larga). Qualquer semelhança com aquele outro famoso K é MC), espantando-se com o próprio brado.
— Pois é. (PÉ, SePre (se preferir).)
— Como vim a cair presa desta TIM? Sempre olho onde clico. Aparentemente mão me machuquei na queda. — K dá umas apalpadelas nele mesmo, procurando possíveis ossos quebrados.
— É por causa dos AKF. Ataques Kafkabookkianos, Herr K — diz a cotoveluda, tirando o palito de dentes que tinha entre os ditos e coçando o ouvido esquerdo com o dito. (E depois cheirando o dito. Mas isto não vem ao caso.)
K estremece. E se...? Passa a mão nos fundilhos das calças, temendo pelo pior.
— Ufa! Nenhum sangramento... — suspira aliviado.
— PÉ.
K estranha os repetidos PÉs. Em seu universo povoado de roths, rilkes, sebalds, carpeaux, queijinhos de aperitivo e quejandos não há lugar para expressões chulas desse naipe. (K não perde a chance de se mostrar o esnobe que sempre foi. Como todos já perceberam, trata-se dum CaViMó (Cabotino Virtual Mórbido).)
PÉ, K estranha os PÉs. Mas sendo estranhador profissional, guarda o estranhamento para si. Se fôramos discorrer sobre o EC (Estranhamento Cibernético) não haveria IS (Internet Suficiente).
— Quando caímos na TIM é assim — completa a cabeluda cotovolérica. — Com perdão da rima acidental. Nenhum ferimento. Nenhum êxtase. Mais ou menos como o purgatório. Mas isso não tem importância por ora. SBV! Seja bem-vindo!
— O... obrigado!. Acho.
K olha ao redor. Tudo azulado. Enevoado. Que previsível, se desaponta com o lugar-comum. Não sabe bem por que, esperava algo inédito. O batido, além de sovado e surrado, lhe dá dor de barriga.
Já há algum tempo K vem padecendo desse mal. (A bem da justiça, há exatos 38 anos.)
Por falta de cuidados é que não foi. K procurou virtualmente todo tipo de ajuda para seu probleminha. Recorreu até à ginecologista Cibele, indicada por uma de suas ex-noivas. Um dia, há mais ou menos 8 anos, perdeu a paciência e visitou Iolanda, uma de suas vizinhas que joga búzios e lê cartas. “Ioiô, minha nega. Não aguento mais! Só você pode me ajudar.”
Passaram-se três dias de jogação de conchas, consultas com o Além, telefonemas para Índios Velhos, até que Ioiô desistiu.
Next step, K tentou seu primo Jonas, numerólogo cabalístico, que nas horas vagas vagava vagamente por Sampa vendendo Pamonhas de Piracicaba importadas diretamente de Americana.
— Kuhhintern —, perorou Jonas, recostando-se na poltrona e ejaculando o ar poluído dos pulmões —, sei exatamente qual é a origem desse mal que tanto lhe aflige!
K esticou as sobrancelhas, ávido, hospedeiro e tenebroso pela fala bíblica do NC.
— A causa toda jaz nesse seu nome! — protocolou Jonas, hermético feito uma embalagem de isopor e canudos de bambu projetada especialmente para o transporte clandestino e ilegal de passarinhos caçados à socapa no que restou da Mata Atlântica na última quinta-feira de chuva de cada mês. — É que seu nome tem dez letras, primo. Tal como felicidade. Prum carinha maseaux feito voncê, NVN?Nadaver né? Tira esse 'r' aí. Verá que é mesmo assim, a história num tem fim.
Dito efeito.
K destrambelhou a recomendação de seu primo e tchibum (tchibum)! Passou a ser feliz e mais nada. (E até parou de implicar toda vez que depara com isso.)
K agora anda tão feliz, alegre e nacionalista, que percebe uma música tocando em algum lugar. Melhor: algures! Mais propriamente, um coro. O coro mais desafinado que já ouviu em toda sua vida de diletante.
— Quem está “cantando”? — Procura conter o desagrado mas sente os lábios se retorcendo involuntariamente.
— K, temos um assunto muito importante a tratar. — A Skypeana Kafkabookkiense finge não notar o termo entre aspas.
— Quem é você? — K finalmente consegue se acalmar o suficiente para fazer a pergunta que qualquer outra pessoa normal teria feito no primeiro parágrafo.
— Ora, fofo! Eu sou a Kafooklorilde!
K se volta para olhar os olhos de Kafooklorilde mas percebe que Kafooklorilde tem apenas um olho, que fica num local...  digamos, inusitado.
— E que é que a senhora faz exatamente, dona Kafooklorilde?
— Fico online kafkukando, ora! Que esperava que eu fizesse? Seguinte, K, tenho uns formulários para voncê preencher.
— Que p... — K se cala a tempo.
O rosto de dona Kafooklorilde se ilumina num risinho extremamente sutil e irônico. Ela parece se divertir. Provavelmente é sádica. Embora leve toda a pinta de ser adepta do assexualismo vegetariano.
— Digamos que isto é, ou seja, uma entrevista. Afinal precisamos saber com quem estamos kafkukando.
Ela mal conclui o ditirambo quando do nada surge diante de ambos um gabinete de aço com um número infinito de gavetas. Kafooklorilde abre uma, aparentemente a esmo. Retira um calhamaço de documentos que devem pesar bem uns 300 kg e o joga sobre uma secretária em Portugal ou escrivaninha no Brasil.
— É o arkivo da KGB? — Os olhos de K se arregalam, esticando-se de espanto, assombro, estupefação, perplexidade, fome e excesso de leituras não recomendadas para maiores de seis anos. — Que tipo de info quer de mim?
— Mais ou menos o de praxe. Com que propósito costuma navegar pela rede, que é que ela tem que não tenho, onde aprendeu a escrever tão divinamente, desodorante preferido, número de banhos diários, superstições, frequência onanística, coisas do tipo.
— You're kidding me.
— Nós kafooklorildes nunca brincamos. Apenas kafkukamos, kafkukamos, kafkukamos.
K ri zombeteiro com desdém e mofa. — Você vive fazendo piadinhas. E bem sem graça, se me permite uma opinião honesta.
Nem bem desfere a raquetunda, Kuhhirten empalidece. Acaba de cair numa cilada. Por sua única e exclusiva culpa. Agora Kafooklorilde já sabe...
— Não se preocupe, K. Já desconfiava.
— Quantas questões tem cada formulário?
— Ótima pergunta. Vejamos... Varia. Nesta, duzentas e quinze. Nesta outra, quatrocentas e quarenta.
— E tenho de responder cada uma delas?
— É a política da casa. Pode se sentar naquela mesinha. — Também do nada, uma secretária em Portugal ou escrivaninha no Brasil surge a um canto. Kafooklorilde apanha os formulários e puxa K pelo braço.
Kuhhirten se acomoda. No tampo da escrivaninha há um apontador e um toco de lápis. Estranhamente não passa pela ideia de Kuhhirten perguntar se não seria mais fácil fazer o preenchimento num computador.
Puxa o primeiro formulário e passeia os olhos pelas perguntas. Então aponta o toco de lápis e começa a se desincumbir da tarefa.
Animais de estimação?
Sim.
Quantos?
Dois.
Quais?
Um gato e uma cadela.
Raças?
Angorá e labrador.
Cores?
Preto e branco e cor de mel. (Óbvio, todo mundo que tem labrador tem labrador cor de mel.)
Nomes?
Ego e Alter. Sou alérgico ao Ego. Caminho todas as tardes com Alter no parque perto de casa.
Ainda não perguntamos sobre suas doenças e hobbies. Procure ater-se estritamente ao escopo da pergunta.
Kuhhirten tem vontade de soltar um sonoro palavrão mas de novo se contém. Não sabe exatamente por que, está decidido a ir até o fim na tentativa de convencer Kafooklorilde de que é um sujeito pacato, cordial (não tanto quanto aquele famoso homem de S.B. de Hollanda), inteligente e não toma viagra on a regular basis e filho de deus.
Mesmo com a boca seca pelo esforço de engolir o impropério, Kuhhirten sente algum alívio. Pensando bem, até aqui o questionário está se mostrando soft. “Animais de estimação” é lá algo que se queira saber de alguém? debocha interiormente. Kafooklorilde se acha muito esperta. Vai ser um piece of cake. Kuhhirten esperava perguntas mais barra-pesada, tipo nome completo, profissão, idade, essas coisas que nenhum navegante sensato abre na rede, dada a altíssima taxa de pilantragem digital. Assim, quase orgulhoso de sua própria capacidade de se autotranquilizar, retoma o questionário.
Nome completo, profissão e idade?
Não, não é o fato de Kafooklorilde se atrever a perpetrar tais perguntas com todas as letras e ponto de interrogação. E sim a pobreza da apelação humorística. Kuhhirten se remete àqueles horrorosos seriados hollywoodianos em que os personagens ficam o tempo todo levantando a bola para o outro chutar, na mais entediante das previsibilidades e no mais previsível dos tédios. Só falta a claque, Kuhhirten pensa, desalentado.
[kkkkkkkkkkkkkkkk] A claque cai na gargalhada.
Kuhhirten quer bater a cabeça no tampo da escrivaninha, enfiar o toco de lápis no olho, engolir o apontador, qualquer coisa que o livre dos tenebrosos, dos infames kkk com que a maioria dos internautas se “expressa” quando pretende alardear ao mundo sua medonha faceirice.
Ó mãe santa, haverá no mundo algo mais hediondo que a experiência digital? Afortunados os capazes de resistir à tentação de criar um perfil! E não se trata apenas do seu pudor artístico de evitar a qualquer custo comparações fáceis com Friends, Two & a Half Man, A praça é nossa ou Bonanza. Até algum tempo atrás costumava manter um perfil com seus dados verdadeiros e, claro, acabou quebrando a cara, como todos aqueles que procuram se apresentar com um mínimo de autenticidade. Depois d’algumas boas quebradas de cara, Kuhhirten, como todo mundo e sua pedicure hoje em dia, passou a dissimular-se (também não me perguntem para quê. Se tivesse um mínimo de juízo, Kuhhirten continuaria na sua, levando pacificamente a vidinha de jor... digo, bancário de sempre, sem encher o saco alheio nem ter seu próprio saco cruelmente enchido por terceiros. Mas o cretino tem essa comichão de saracotear e não para quieto um minuto. É hiperativo, pauvrezito).
Que é que faço agora? se angustia. Se diz a verdade, a coisa fatalmente acabará degringolando como antes. Se cria uma nova persona, corre o risco de ser tachado de fake. A angústia a corroer o âmago de Kuhhirten pode parecer balela para quem assiste aí de fora deitado no divã do psicanalista chupando manga mas para um cara hiperultrasensível feito nosso heroi não é nenhuma batatinha king-size do Mac. Kuhhirten ainda tem chutando na memória as vezes em que foi sordidamente espeloteado por essa gentalha que abunda online. Sendo espevitado por natureza, porém, tem por hábito disparar sua metralha a esmo algumas vezes ao dia e sempre acaba desempolgando uns balaços certeiros, em que pese ocacionalmente desnomeados, fazendo um determinado número de vítimas, desenlevanando irresistível ida poética ao banheiro (IPB) e confundindo seus inimigos que com aversão se enrustem a bradar em caixa-alta e ponto de exclamação em fúria apocalíptica que o alarmaria não soubesse que o ódio mais virulento é o amoroso. Nem por isso, sendo sensível e o cacete, deixa de acabrunhar-se para dedicar a vida a demonstrar alguma compaixão pela raça humana que, debalde. Prima por perdendo-se em fascínio e histeria, descontrolando-se a berrar cada vez com mais azedume e raiva, até que Kuhhirten, com o coração se partindo em 1347 caquinhos da porcelana da dor, se veja obrigado a dar um basta ao martírio e lavar as mãos pra ver se pelo menos deixa de escutar dolorosas sílabas de epítetos inomináveis.
Refeito do acometimento de desvario onírico, Kuhhirten acha-se prestes a partir para a pergunta seguinte quando o formulário é repentinamente arrancado de suas mãos.
— Seja gentil! Ainda sou virgem! — Kuhhirten cerra os olhos e exclama em vozinha esganiçada, certo de que é chegada a hora de seu tão adiado descabaçamento sacrificial. Cá entre nós: no fundinho de sua esvoaçante alma de vate sem rumo Kuhhirten se mija de medo de mulher.
— Tô cagada de urubu virtual hoje — decreta retumbante Kafooklorilde, arreganhando os dentes para em seguida desatar uma reza de mumunhos escalafobéticos e arengas entremeadas de foda-se-isso, foda-se-aquilo, depoimentos-control-c-control-v, caga-aqui, caga-aqui, caga-acolá.
Kuhhirten fica novamente confuso. A quem se refere a meiga Kafooklorilde? Quem faz copia-e-cola? De quê? Os bois não têm mais nome? A generalização é uma merda, mesmo para os padrões putaria-cais-de-porto da moçada culta e sofisticada que popula a rede. E qual a razão da incontinência verbal escatológica? Seria Kafooklorilde uma menininha ainda experimentando os efeitos dos palavrões em ouvidos mais delicados? Ó, tortura-se, quantas perguntas sem resposta!
Kuhhirten vela os lábios com a mão, receoso de ter avançado além do prudente. Tomara que ela não tenha escutado! suplica em pensamento.
Tarde demais. Arrisca um olhar esguelhenento a Kafooklorilde e, lívido e fúlgido como o hino nacional às seis da matina na Cultura FM, percebe que ela escutou. Para seu espanto, todavia e contudo, ela se mostra mais perplexa que colérica.
Kafooklorilde estreita as pálpebras e crispa os lábios em sinal de que sua paciência acha-se no último estágio antes de largar a nave-mãe no órbita de Netuno. Quem é esse FDP moralista para falar assim dessa linda gente que permeia o idílico paraíso digital destes miraculosos novos tempos?
Ela franze o olhar mais. Mais. Mais.
Sofrerá ele de hemorroidas emocionais? Será um conhecido de outros carnavais em outros salões da vida? Será, gulp, mulher? Cazzo, pode ser virtualmente qualquer um.
Ela empalidece. Estará tête-à-tête com o famigerado EfeBeCop, o Justiceiro das Inglórias Curtidores (zik)? Ante tal possibilidade Kafooklorilde engole em seco novo ovo de avestruz. Se for EfeBeCop defacto então está fritinha da glória araújo. Há algumas semanas tem ouvido falar dos estragos que o carcamano filho-duma-égua vem aprontando em sonhos gentis espalhados por pequenos cérebros de pazarinhos e pazarinhas último reduto castelão kafkiano afora. Os versos favoritos de sua sanha parecem ser do tipo gracinha debilóide como “Curtida Puxa Curtida” ou “O que te instiga no tweet acima?”
Bem, Kafooklorilde reconhece a contragosto, “Curtida Puxa Curtida” é mesmo abjeto e pueril. E, mon dieu, onde é que ela estava com a cabeça quando liberou aquele “Lambe servil meu perfil que lambo obediente o teu?”? Hoje é plenamente sabido que muitos dos curtidores profissionais tornaram-se impostores que projetam neuroticamente suas fantasias e desejos incofessos de tal modo digital que quase nada tem de hermafrondoso ou profilático. Que é que tal ficção pode “instigar” em quem quer que seja eja eja? Mas, veja vevevê, o-que-você-tá-pensando já tem mais de 3 lambidas caninas! Não há dúvida de que a instigação também pode ser soporífera.
— Que é que é que é que é que estou falando? — Kafooklorilde procura passar vaselina nas hemorroidas emotivas para reagir. — EfeBeCop? Donde tirei essa bobagem? Era só o que me faltava, ficar dando satisfações a um desconhecido! Blagues tomadas de empréstimo a sites randômicos pelaí é o que tenho de mais sagrado em minha existência! Quantas noites indormidas bolando joguinhos infantis! Quanta energia dispendida maquinando versinhos lindinhos pra seduzir valorosos membros semieretos do coro desafinado!
Kafooklorilde, à beira dum ataque apoplético tico-ico, conclui que não há outro jeito senão tomar aquela difícil decisão que costuma guardar como último recurso: subir um vídeio pro u-tube mostrando um montão de sicofanta mau-caráter espertalhão covardão bestalhão. Onde já se viu? Vamo cuidá da vida, seus rato peçonhento dos inferno! (Naturalmente, não exatamente nesta escolha de palavras, pois, como já vimos, a outrora candidata a deusdede nórdica é mais chegada numa esculhambação escatológica.)
Porém mas o ímpeto vingativo dura meros três segundos e oito décimos. Dio mio, onde está com a avantajada cabeçorra forrada de tão negros cachos? Não, seu orgulho não permite. Passar recibo prum bosta cujo nome, profissão, idade e sexo agora é de domínio público, never de pitibiribes. É seu dever continuar firme no posto de guardiã de sua iluminada existenciazinha digital, estimulando e zelando pelo brilhantimo de suas sacadas no efebê e pelo priapismo dos abatidos membros de seu círculo de amigos igos gogaux.
No que a indecisa Kafooklorilde requenta os miolos tentando gratinar a jaca com calda de ostra, eis que uma outra suave e angelical melodia toma conta do ambiente virtual de novo ovo viu a uva do ivo no mais encardido dos clichês. Kuhhirten, claro-clarabóia, deixa-se enlevar pelo doce e harmonioso naipe de violinos. Donde virá tão divina música? pergunta-se semihhhipnotizado para então sentir uma vibração entre o bolso direito das calças e o esfíncter o-O-ôh-ho. Kuhhirten puxa seu blackberry, que toca O último quiromântico do técnico em contabilidade Lula Santos. É Nilcéia, sua melindrosa noivinha.
— Não faça fo, Fuhhirfen! — a melíflua fozinha da fada arfa do outro lado, ofegante e aflita.
— Não faça o que, Nilce babe?
— Não aceite essa chamada!
— Mas, anjinho, por quê?
— Você não viu a última?
— Não vi, não. Faz três dias que não ligo o liquidificador. Estou lendo o Manual do Conselheiro Cristão, de Jay E. Adam, em que o autor, com sua escrita despojada, estilo incisivo e tendência para rir de si mesmo rebate o ideário do célebre círculo de intelectuais do Flip.
— Então se prepare-se! Fizeram um debate em homenagem às mulheres!
— Não...! — O queixo de Kuhhirten cai sob a ação da gravidade e ele tapa a boca com as duas mãos e o pé esquerdo, temendo a entrada de abelhas ou outros equídeos. Aparenta estar simplesmente abestalhado abobalhado apalermado apaspalhado atoleimado bestificado embasbacado estupefato, na mais perfeita ordem analfabética. Não consegue acreditar nos ouvidos próprios dum derradeiro paraxístico lugar-comum que é pra ninguém ter dúvidas do que estamos falando.
Após vários segundos que pareceram meio minuto, Kuhhirten logra balbuciar:
— Você está brincando, Nil? Custa a crer que...
— Fim! Fefefefefe. Fusta a frer fakas. Mas tá lá com todas as letras e acento com crase: “Homenagem à elas”. Ufh! — Nilcéia emite um grunhido de desagradável êxtase anal-ógico.
— Homenagem crasística à elas em plena semana internacional da mulher? Ai que meu coraçãozinho de poeta frustrado para de vez!
— Foi for fouco fão foi? — Nil fusfira afiviada.
— Meu amor, que sem eu você faria? — Kuhhirten está insinceramente agradecido.
— Fior que ifo fó a fofu Fiferafura!
— Já não sei o que é pior. O planeta não aguentará tanta inteligência libidinante. Será o fim do mundo?
— Vai ver, essa gente lê auto-ajuda.
Kafooklorilde, vendo que Kuhhirten está na eminência (zik) de cancelar seu requerimento de receita de maçãs verdes com vinagre, enfim resolve decidir-se. Por mais que os lúbricos comentários do afrescalhado requerente tenham lhe causado espécie, no fundo sabe que não pode se dar o luxo de preterir de tão vigor-oso vir-il viv-az volupt-oso vaga... lume. Faz anos que anda mal das tíbias pernas, há muito carecendo dum cabra geniau que lhe substitua o vazio genitau, digo, vaginal au au au e au.