Estou aqui
fazendo o que mais gosto de fazer na vida – caminhar pelas ruas. (Caminho de
olhos baixos.)
Estou no meio
do quarteirão, um sujeito dobra a esquina.
É manco. Ninguém
tem equilíbrio mais perfeito do que o manco.
Olho a calçada.
Passo por uma árvore,
olho a árvore.
Olho a rua,
olho a cidade.
Me lembro
quando olhei algo (uma cidade, rua, árvore, calçada) como se fosse a primeira
vez mesmo depois de anos ou décadas e todos meus olhares passados pareceram tão
envelhecidos.
O manco passa
por mim, eu passo pelo manco. Bloqueio as narinas para não sentir o cheiro
dele. Quero olhar pra ver se ele faz o mesmo. Não parece um sujeito prevenido. Quanto
a mim, sou. Sou, sou sou. Meu cheiro carrega um veneninho mortal difícil de
sentir.
São as minhas palavras.
Baixo o olhar.
Alguém dobra a
esquina
Agora é uma
moça.
Há em seu rosto
um estranho desenho
Formado do
cantinho setentrional dos lábios
Ao pontinho
mais meridional do pomo esquerdo
Se fosse distraído,
eu provavelmente não enxergaria tamanha ageometria
Mas caçadores
de experiências feito eu caem
Alegremente na
armadilha desse sorriso
Olho para o céu
Vejo uma luz
acesa num apartamento no meio do arranha-céu (!)
A sala vazia
parece estar vazia
E a luz é
dourada
Iluminando algo
que ainda não morreu
Prenunciando uma
vida sagrada
Que não se
extingue
Tenho por minha
esta luz
É esta luz que
lhe ofereço