Não tenho como falar agora.
Os deuses nórdicos, como
diziam em 1969, me abduziram.
Se abrir a boca, me
arrancam a cabeça, me carregam pra além de Alfa-Centauro.
Se eu dissesse que
ela, minha cabeça, jé esté lé, debochariam, me trariam de volta. Seria suicídio.
Estou no meio desse
bailinho.
Uma música toca do
recém-lançado Abbey Road e estou no meio desse bailinho.
Lá fora uns polícias
passam querendo assuntar. Veem minha cara de quem vive em Alfa-Centauro,
resolvem tirar satisfações.
É complicado no
começo. Eles falam algo parecido com o português, eu falo minha língua, meus
caros servidores públicos.
Daí são só
mal-entendidos até tudo terminar como sempre.
Vamos descendo para
Santos pela Anchieta, paramos no pedágio.
Pai, cadê aquele livro
que vou ler daqui trinta anos?
Ele faz que não é com
ele. Mamãe ajeita os cabelos tintos de rinse.
Assim que acaba a
descida da Serra, papai para o carro no acostamento ao lado da floresta, um
carteiro se aproxima.
Uma carta. Uma carta
para o principezinho.
Mamãe abre o
porta-luvas, retira meu cetro e minha coroa.
E eles ficam olhando
enquanto alço voo pelo céu poluído de Cubatão rumo à Praia Grande, onde conheci
meu primeiro amor.
Que me toma pela mão
na roda gigante, assegurando que não estou perdido.