Marimacho Coralíneo. Finalmente.

Como todos meus quase três leitores haverão de se lembrar, tenho aqui em casa um escada que descobri não faz muito tempo (uns dez ou doze anos no máximo).
Agora vou lhes contar um segredo, dos legítimos, meus quase três leitores: um dos raros, raríssimos hobbies que cultivo é passear nessa minha recém descoberta escada em alguns fins de tarde no inverno, em alguns comecinhos de noite no verão.
Parêntese. Há uns anos – uns dez ou quinze, talvez – eu sem dúvida diria crepúsculo, lusco-fusco e outras baboseiras poético-cafonas que tais (god, preciso dar um fim nos que-tais). Felizmente me livrei desse hábito. Hoje, como deixo claro acima, me limito a fim de tarde e começo de noite, o que é desesperadamente pobre e me dá inconcebível saudade dos meus tempos de crença em mim (antes de deixar de acreditar em mim tinha deixado de acreditar no mundo, e antes disso, na vida. Mas não quero falar disso agora, embora fale disso quase o tempo todo.
Volto à escada.
Meu maior – um dos – barato é descer e depois que estou lá embaixo, subir de volta.
Vocês também haverão de se lembrar que não há iluminação nessa escada. Quando a desço, se a subo, é absolutamente no escuro.
E se a desço e quando a subo no escuro, é totalmente bêbado.
Minha escada não tem corrimão.
Não sei quantos degraus tem minha escada.
Sabe o que sei da minha escada?
Sei que quando estou lá no meio, ou mais ou menos
me abstraio e
me distraio
e já tudo deixa
de ser ensaio
e acontece pra
valer
Mais um degrau
Sempre um degrau mais
Sei do que preciso
Preciso vencer
Este medo
Esta náusea e ânsia
De confrontar minha
Infância
Um mais
Só mais um
Devo retroceder outro?
Bien sûr. Quem sabe
Não estará aí o segredo?
Não sei ser pequeno
Não sei ser grande
Não sei se desço
Não sei se subo

Paro
Olho
Pra cima
Pra baixo

Inda bem que estou bêbado
Como bêbado nasci
E bêbado não cresci
E bêbado quero morrer

Inda bem que estou só
(e a solidão perfaz minha inteireza)
Sei que está escuro mas vejam!
Nada nas mãos
Nem nada nos bolsos

Não tenha medo, baby

Não tenha medo, baby
Somos só nós dois
Eu e você
Tanto sós
Que somos um
Nos tantos quanto
Somos