Feliz mergulho

Você criou este poema pra mim, eu sei, mas não vou lhe agradecer.
Uma, porque poemas são, como já disse 8 bilhões e 548 milhões de vezes, mera conjugação de restos de impressões, cacos pontiagudos de pensamentos, refugos apodrecidos de sentimentos, tudo precariamente amontoado numa massa obtusa de palavras rebuscadas a formar versos irrelevantes e destrambelhados e pretensiosos que no conjunto não compõem sequer uma miragem mentirosa e calhorda que nos engana nos fascinando e nos desencaminha nos encaminhando e nos adoece nos curando. (FAVOR PRESTAR ATENÇÃO.)
Duas, porque poeta que é poeta não deve mostrar gratidão jamais. Muito menos a outro poeta.
Gratidão é atributo vagabundo de gente ordinária (ATENÇÃO: EM OPOSIÇÃO A EXTRAORDINÁRIA) que em seu dia a dia precisa negociar até as meias que tem nos pés para se sentir algo reconfortada. É essa gente que acredita que felicidade é obrigação, que vivemos por um desígnio, que a vida sem gratificação sensorial constante é um inferno a ser evitado a todo custo. É gente que acredita que tudo que a tevê e a internet lhes enfia na cachola merece pelo menos o "benefício da dúvida", incluindo os que se dizem poetas.
O que essa gente tem a ver com um poeta de verdade? Nada.
E tenho notado nos últimos dias que a taxa de uso de pontos de exclamação e reticências nos seus poemas vem caindo como a popularidade da nossa presidenta crânia. Okay, você nunca vai me dar a baba de admitir, mas parece que está finalmente aprendendo certos fundamentos do que é escrever.
Peraí!
Alguém acabou de entrar numa postagem antiga minha. Ai que emoção. "Desequilíbrio fino". Postada num sábado, dia 9 de outubro de 2010. Peraí de novo. Nove de outubro, se bem me lembro, é a data de nascimento de John Lennon. Ou foi quando ele morreu? Não, forraram o cara com 6 balaços foi é em dezembro. Lembro que tocava aquele purgante So this is Christmas por toda parte, me dando gana de bater a testa pelos muros à medida que caminhava pelas ruas escuras como sempre fiz e faço. Vinha todo mundo e seu vendedor de cartucho de impressora jato de tinta chorando buá, mataram o John, eu respondia já vai tarde e os caras saíam emburrados. Chapman, o maluco que deu fim no farolero, tinha um exemplar do Catcher in the Rye debaixo do braço. Já escrevi a respeito, acho que mais duma vez. A polícia quis saber de Chapman o porquê e ele disse, cara, o cara vivia de papo pro ar com aquela vozinha melosa imagine um mundo sem propriedades, imagine um mundo sem grana, até que um dia li no jornal que ele tava leiloando um touro reprodutor de trocentos mil dólares, ora, fui lá e enchi o cumpadi de azeitona. Chapman está até hoje internado num sanatório psiquiátrico mas, porra, eu também tenho gana de mandar pro beleléu esses hepócreta que enche o rabo de grana às custas da ingenuidade da patuléia. Embora a patuléia mereça, óbvio.
Clico no link da minha velha postagem "Desequilíbrio fino". Às vezes me dá essa curiosidade de ver que é que tão lendo no meu blog. Uma das mais concorridas é aquela que enchi de termos e expressões de sacanagem só pra atrair esses doentes que perambulam pela rede atrás de... sacanagem. Mas não é essa a mais popular. A mais popular, longe, é uma que fiz sobre um sujeito que ganhou sozinho na loteria. O sujeito era mendigo, imundo e desdentado. De repente fica assim de mulha no pé dele. Se isso não escancara de vez a natureza verdadeira da raça, puta merda. Carinhas lotam oceanos de bits & bytes em suas teses antropológicas mas a verdade toda está contida neste meu modesto post. Nós humanos somos essencialmente prostitutos, period, paragraph. Tirante neguinhos como Beethoven, Grieg, Dostaux e eu.
Clico no link da minha velha postagem "Desequilíbrio fino". O link vem do google. Ah, eis aqui. Eis aqui o que vieram procurar. Tem "cabaço" na primeira linha. Antigamente meus textos estavam hospedados num site que me dava um relatório de todas as palavras de busca do google que levavam até mim. Noventa e nove por cento eram, bidu, palavrões ou safadeza. Uma das virtudes da internet foi ter dado aso ao nosso lado animalesco de ser. E não me refiro apenas aos tarados e pornógrafos. Aprendi pra caralho dos últimos seis ou sete anos pra cá, sobretudo em fóruns e as orkuts da vida. Muita gente entrou de sola e se expôs além do conveniente e quebrou a cara, eu inclusive. Muita gente usou, e ainda usa, a rede pra "fins escusos", pra cunhar uma frase original. Não apenas pra satisfazer seus instintos primitivos mas, não sei se principalmente, pra passar a perna em incautos. E não me refiro aos ladrões de senhas e de contas bancárias rondar adrede o pedaço.
Clico no link da minha velha postagem "Desequilíbrio fino". Que começa assim, "Que é que é: tem um cabaço que nunca rompe".
Sinto de pronto uma fisgada no suleste do estômago. Minha relação com meus escritos é foda. Confusa pra caralho. Inconstante pra cacete. Ora acho genial, ora acho uma merda. Ouvi dizer que com Shakespeare acontecia mais ou menos o mesmo. Pobre Bill. Pobres escritores. Pobres poetas. Pobre todo mundo e seu vizinho.