Meu barato, meu baratinho

Vou puxar pra baixo, pra direita, abrir mais espaço. Preciso de espaço hoje, agora, neste instante. Preciso de espaço no meu (...), na minha (...), aqui.
Veja, estava vazio...
Outra vez: estava vazio.
Viu?
Há questão de 10 minutos (10 minutos parecem passar tão rápido e lá se foi embora minha vida?), de repente toda essa raiva?
Então faço o que faço quando meu santo baixa: me divido em partes desiguais (por que quando aprendemos divisão na escola não nos dizem de cara que dividir não é o mesmo que distribuir igualitariamente? Seria tão mais fácil. Muitos dos meus mitos pessoais – de que nunca me livrarei, seja por não saber, seja por não poder – nasceram de más concepções aritméticas que adquiri no primeiro ano no meu banquinho escolar (ao lado de Sílvia, a v va val valquíria Sílvia de cabelos castanhos claros encaracolados como nunca mais vi igual, olhões elétricos verde-azulados, que passava por mim na classe e no pátio do recreio como se eu fosse um poste em que alguém tivesse afixado um aviso “Proibido colar cartazes” e que, lá de longe da minha absoluta irrelevância, eu estudava com o canto dos meus estudiosos olhinhos lambedores de etéreas dríades nascidas para me distrair de mim mesmo, da voracidade com que sempre me espreitei temendo sucumbir à fraqueza de ir, e que ainda hoje senta ao meu lado quando estou absolutamente só absolutamente, soltando aquelas gaias gargalhadas de neutra dríade da pororoca de tristeza e alegria que se erege quando estou vazio como estou agora, absolutamente só como estou agora neste meu exercício de solidão que repito e repito e repito para nunca aprender a ser o que sou, esperando – tão tibiamente, santa mãezinha – que o motor de máquina de lavar roupa que sacoleja reciprocamente o que sinto se acalme e me deixe respirar e não me deixe respirar e me deixe me afogar e não me deixe me salvar e tire da minha boca o gosto do nada e suplante em meus ouvidos o estrondo do silêncio e me enfie pelas narinas o fedor azedo do gás sarim das câmaras de gás cuja decidibilidade, mal imaginam suas ingênuas vítimas, é, deve ser, o bálsamo apocalíptico, mas, veja, não, não veja, passou, sorry, 10 minutos passam tão rápido e ainda estou aqui e minha vida não se foi, pois já estava fora há muito, muito tempo, vou esquecer de fechar o parênteses.
Esta noite de sábado queria ser o homem mais solitário do mundo. Tão solitário, que não houvesse mais ninguém no mundo. Você acha que é um sentimento de posse? Um sentimento tão egoísta de posse, que não posso suportar compartilhar o mundo com mais ninguém? Eu acho. Lamento profunda, profundamente que meus pais católicos não me tenham ensinado o egoísmo extremo. Aprendi com eles apenas o egoísmo religioso, esse que a gente vê em cada rosto e ouve em cada frase mundo afora. Esse egoisminho gosmento rastaquera que nos fez a nós herdeiros da Grande Religiosidade de Fachada esses vermezinhos sonsos que se pretendem excelsos mas que não passam de vermezinhos sonsos que se pretendem excelsos, jesus.
Glória a Ti, Poderoso, por ter me dado a Graça da Palavra, Filho da Puta.

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