Sonometria tautológica

Quando lhe informo que o mencionaria num textículo que qualquer dia iria escrever, roga, praticamente juntando as mãos num gesto de súplica, que não o identifique. “Magina se os vizinhos ficam sabendo!” Os olhos dele se anuviam ominosamente. “São capazes de me linchar!”
Esse meu conhecido sempre foi brincalhão e me limito a rir.
Os olhos dele se fixam aflitos nos meus e então percebo que não era piada.
“Mas o que foi que houve, homem? Que é que os vizinhos podem ficar sabendo?”
Ele gira o pescoço para os lados, se certificando de que ninguém o segue. Aliviado, me puxa para perto na calçada e cochicha:
“Que sou seu informante.”
Franzo o cenho ante tal disparate.
“Como informante se nunca me informou nada? Além do mais, não sou polícia, nunca fui, nunca serei. Que história é essa?”
Sempre auscultando as cercanias com um olharzinho arredio, ele explica:
“Não é polícia mas é blogueiro. É ou não é?”
“Você sabe que sou. Mantenho um blog há uns anos. Quase ninguém lê mas me orgulho dele. É a minha contribuição, em que pese modesta, aos esforços dos homens e mulheres de bem para evitar que a democracia calamitosa da internet destroce de vez o pouco que resta da Literatura!”
“Baixa a voz!” Ele me puxa pelo braço para um canto próximo a um muro. “Podem estar nos seguindo. Não podemos confiar em ninguém. Absolutamente ninguém!”