Literatura tura 'rara

Literatura
Quem quer escrever deve fazer sua escolha.
Quem quer escrever não tem opção.
Escrever é se trancar numa masmorra e atirar a chave pela janela.
Se não está disposto a se trancar numa masmorra e atirar a chave pela janela, seu negócio não é escrever.
É fazer relações públicas.
Marketing.
Média.
Se tornar uma espécie de celebridade.
Se imaginar com a estátua do Oscar nas mãos, discursando para 8 bilhões de robôs encantados.
Escrever é ter coragem.


Me salvem de todos os lirismos
Abobrinha quando nasce
Esparrama pela rede
Coraçõeszinhos quando ficam tristes
Alguém os leve a uma clínica cardiológica

Estou farto do lirismo, não apenas o comedido, mas de todos os lirismos desmedidos.
Estou farto dos vates narcísicos que, sob efeito da auto-hipnose, insistem em desvendar a esfinge do espelho.
Estou farto dos trovadores que fazem a opção preferencial pelas trevas porque são incapazes de vicejar sob a luz e ali, escondidos no escuro, se prestam a tolos jogos de sombras em meio a bobos jogos de palavras.
Estou farto dos poetas autistas que deixam a vida passar e não conseguem superar o fascínio pelo próprio umbigo.

Cansei de idólatras ocos que pinçam em seus poetas preferidos lemas edificantes e os desfraldam qual bandeiras na popa de suas vidinhas fantasmagóricas.
Estou exausto dos que pensam que escritores e poetas são infatigáveis fabricantes de ditos e máximas.
Me enojam os que admiram Clarice Lispector por fanfarronadas como “Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania, depende de quando e como você me vê passar.” Ninguém pode ser leve feito brisa, porra! Muito menos forte qual ventania. É apenas retórica, será tão difícil assim de ver?
E Clarice era humana. Podia obrar bobagens como “Ela acreditava em anjo e, porque acreditava, eles existiam.”
Estou cercado. Deste lado, Quintana com suas formulazinhas mágicas que nos querem eternamente pueris. Deste outro, Florbela Espanca e sua mania mórbida do amor que não encontra correspondência no mundo real.
Estou farto e não quero listar os tantos que me deixam farto, a lista seria comprida.
Para Kafka, o primeiro sinal do começo da compreensão é o desejo de morrer.

Eis o que nunca compreenderão os que nunca se fartam de porra nenhuma.