Dia desses eu e Ulisses falávamos do mal
que as ideologias, políticas e outras, fazem ao mundo. Mencionamos en passant
como as pessoas que se deixam conduzir ideologicamente acabam escravizadas
dentro da espiral do pensamento único. Não sei como o Aurélio define a palavra,
mas tenho para mim que “ideologia” é uma forma de pensamento que exclui todas
as demais.
Simples, não é mesmo?
No outro blog que mantenho, Delenda PT!, escrevi pacas sobre o
assunto. Criei aquele blog em 2006, auge da comoção que correu o País após as
denúncias do mensalão e da polarização ideológica que se sucedeu. Os honestos já
tínhamos sacado, desde as denúncias contra Waldomiro Diniz, então braço-direito
de Zé Dirceu, que Lulla estava disposto a se manter eternamente no Planalto e
para isso convertera seu partido, que outrora se dava ares de honrado e
incorrupto, num eficiente bando de saqueadores do Erário. O plano era
igualmente simples: roubar o Tesouro, comprar com o produto do saque deputados
e senadores para obter sua fidelidade canina sem percalços ou riscos de defecções
e se segurar no poder na maciota, sem conflitos nem armas (pois Lulla, além de
safado, é um tremendo dum covarde e jamais botaria o pescoço a prêmio).
Em suma, um golpe de que a quadrilha sairia
limpa e não emporcalharia as mãos de sangue. Bem ao estilo cordial preferido
pelo brasileiro, que ferra todos que pode mas sempre com jovialidade e
simpatia.
Desci uma borduna lascada na máfia travestida
de partido político em várias dezenas de artigos, cravando uma pequena audiência
de vinte a trinta leitores diários, que dobravam em dias em que fazia promoção
em fóruns da Veja e de alguns jornais por aí. Até que um dia meu modesto
leitorado começou a dar sinais de fenecimento. Logo saquei a razão: um longuíssimo
texto em que metia bala no faroleiro profissional Diogo Mainardi.
Mainardi nunca me convenceu com as “análises”
ligeiras e frívolas que publicava semanalmente nas páginas daquela revista que
gosto de chamar de manual da classe média deslumbrada. Por anos foi o
articulista mais lido da Veja e, como sói ocorrer com quem não dispõe dum caráter
à prova de envilecimento, o sucesso logo lhe subiu àquele lugar que esse tipo
de gente costuma deixar que suba. Mainardi cantava ridiculamente a queda de
Lulla toda santa semana e quebrava tristemente a cara em seu papel de pitonisa
e eu já parara de ler suas diatribes fazia tempo. Até que um dia fiquei sabendo
meio sem querer que anos antes o falastrão havia montado um palavrório em que
atacava fútil e mesquinhamente Carlos Drummond de Andrade. E qual fora o pecado
imperdoável de Drummond ao olhos do vingador vejeano? Ter tido pendores
socialistas na juventude.
Não me contive, obviamente. O cara que
fosse ter seus ataques de estrelismo e prepotência em outra freguesia. E assim escrevi
e postei o tal longo texto, carregado da mais fina mescla de furibundice e
sarcasmo da blogosfera.
Foi esse o primeiro golpe na audiência do
Delenda PT!
Mais ou menos um ano depois resolvi
postar no blog um texto que escrevera ainda durante o último mandato de
Fernando Henrique Cardoso chamado Um dia
no Planalto. Se trata dum petardo literário satirizando o então presidente
e sua proverbial, descomunal vaidade e a não lá muito forte propensão ao
trabalho na administração do País.
Debandada geral. Dos vinte a trinta
leitores diários sobraram dois ou três bravos guerreiros.
Como gosto de repetir pelo menos uma vez
ao dia, meu papo é escrever. Não dei bola. E fui mais fundo. Resolvi botar pra
fora a antiapatia cada vez mais aguda que sentia de Reinaldo Azevedo.
Fui leitor do blog do Azevedo por uns
meses e umas duas ou três vezes o exaltei como a voz mais firme e dura contra a
infâmia lulopetista. Até me dar conta de que Azevedo reescreve exatamente o
mesmo texto todo santo dia sob formas outras. E por que faz isso? Porque tem
uma plateia cativa, um grande público que o frequenta sabendo de antemão o que encontrará
ali. Azevedo, tal como a imensa maioria dos que escrevem profissionalmente, não
inventa nem surpreende. E nem quer. Os que o leem não buscam pensar e sim
corroborar velhas opiniões que se cristalizaram ao longo do tempo. Azevedo,
cabotino de marca maior, se autoproclama lógico a cada duas linhas que digita
mas sua maior proeza está em não decepcionar seus leitores. É também lógica
simplérrima. Mas seu maior assunto não é o lulopetismo, ao contrário do que poderia
parecer, e sim ele mesmo. Azevedo é seu grande tema. Mais que jornalista, é um
guru. Mais que guru, desempenha um papel messiânico que Lulla tem de sobejo e
falta em virtualmente todos os oposicionistas do Pinguço Inflável. Os leitores
de Azevedo não estão atrás de informação ou simples leitura; querem é um ser
carismático que lhes satisfaça as aspirações de redenção. Eis a grande mentira
de Azevedo. A cada parágrafo se autoclassifica de racional enquanto vai
despejando toneladas de frases feitas e profecias e violentas injúrias antilulistas
ao povaréu sedento de catarse e salvação. Azevedo é o líder político que os
tucanos não sabem ser, o antilulla por excelência, o antípoda perfeito ao
salvador da pátria. E tão demagógico quanto. E, pasme-se, populista tal e qual.
Pois em seus textos Azevedo conversa consigo mesmo, se dividindo em dois
personagens, um ingênuo que coloca perguntas constrangedoras de tão
elementares, outro que responde paternal e lapidar, digno dum Oráculo de
Delfos. Azevedo não se envergonha de se chamar pateticamente de Tio Rei, pois é
o apodo “carinhoso” que grande parte de sua claque emprega.
De volta ao que interessa nesta postagem:
a ideologia e como a ideologia mói o pensamento.
Ideologias são extensos cardápios que
cada freguês escolhe ou por gosto ou por um outro critério qualquer que para
mim sempre é arbitrário. Exatamente
por que me escapa. A herdade, uma herança a preservar, a hereditariedade a
seguir, tudo que já foi conquistado para nós em nosso nome e em nosso lugar bem
poderia servir de começo de explicação. Mas o mundo concreto lá fora logo
desmente razões dessa natureza. Ideologias parecem jazer no reino da simpatia. Por
que o freguês opta por uma ou por outra, quer cedo, quer tarde na vida, é para
mim um mistério. Conheço direitistas jumentos e direitistas brilhantes. E esquerdistas
sagazes e esquerdistas asnáticos.
Quanto a mim, sou, pela enésima, eu
mesmo.
Outro dia os jornais online alardeavam
uma “declaração” de Rubem Fonseca. Parece que o autor de O cobrador fora à ABL receber um prêmio e estava explicando por que
nunca se candidatou a uma cadeira naquele antro de fósseis. “Sou um homem idiossincrático e
idiossincrasias não se explicam”, foi o que disse. Li a manchete mas não me
interessei em ler o artigo. É patente, evidente, manifesto que Fonseca é
idiossincrático e ele provavelmente estava apenas fazendo blague para
jornalistas, pois nunca dá entrevistas.
Idiossincrasia é uma palavra cara para
mim. Desde que me conheço tenho essa consciência vívida de não saber
precisamente o que sou mas saber que definitivamente não quero ser como os
outros. Muito menos ser o que os outros querem ou esperam que eu seja.
É um esforço contínuo e doloroso de autoexploração
e autodescoberta. Atenção, não tentem isso em casa.
Automatismos me dão engulhos,
mecanicismos me enfaram, pré-concepções me enjoam, ideologizados aversos ao
pensamento vivo me dão sono.
Os pobres de espírito dividem o mundo em
Marilena Chauí e Olavo de Carvalho, esquerda e direita, isso e aquilo. Quando você
vai lá ver, é apenas um Coríntians X Palmeiras que nunca termina.
Eles querem é bater boca, xingar a mãe,
se sentir importantes, se sentir “parte”.
Bom proveito.
Agora passo a palavra a quem entende do
assunto.
Da supracitada discussão, Ulisses teve a
ideia de escrever sobre Um inimigo do povo,
de Ibsen. Falar de Ibsen no geral e dessa peça em particular significa tratar
da figura do livre-pensador.
Ibsen e a figura do livre-pensador
Ulisses Razzante Vaccari
doutor em Filosofia pela USP, experto em Kant e Hölderlin e profe numa universidade federal do pedaço
Em
Um Inimigo do Povo, o norueguês
Henrik Ibsen decide encenar a trágica e indesejável figura do livre-pensador. Por
meio dessa figura, realiza uma profunda reflexão sobre os temas da hipocrisia,
da mentira e da democracia nas sociedades contemporâneas, procurando pensar o
papel do governo, da imprensa e do povo nas esferas do poder.
Na
peça, o livre-pensador é o personagem principal, o Dr. Stockmann, um médico
responsável por cuidar da qualidade da água do balneário municipal de uma
pacata cidade nórdica. Motivo de orgulho do prefeito e dos cidadãos, o
balneário traz gente de todo o país em busca do efeito medicinal das suas águas,
que inunda também os cofres da prefeitura. Um belo dia, entretanto, suspeitando
da qualidade da água, o Dr. Stockmann resolve testá-la num laboratório. O
resultado, como já se esperava, revela que a água vinha sendo envenenada pelos
curtumes de algumas residências próximas ao balneário. Ao serem informados pelo
doutor da notícia bombástica, os editores do jornal local A Voz do Povo põem-se imediatamente ao seu lado, reservando no
periódico um espaço para Stockmann publicar um artigo trazendo à tona o fato,
de interesse público. Mas o prefeito da cidade, que é irmão do Dr. Stockmann,
logo se mostra avesso a essas ideias, alertando para o fato de que tal notícia
espantaria os visitantes e levaria à falência tanto o balneário como a própria prefeitura
e os negócios que dependiam dele. Insensível ao apelo do irmão de que seria
preciso dizer a verdade, o prefeito alerta o Dr. Stockmann a não levar adiante
a história, ameaçando-o de perder seu emprego e ter a opinião pública voltada
contra ele.
Mas
o Dr. Stockmann está obcecado com a verdade e pensa ser um dever moral
revelá-la; está convencido de que o interesse pela verdade está acima dos
interesses mesquinhos do prefeito e de uma minoria que pensa apenas no lucro. É
um sonhador, um ingênuo ou um idealista, como diríamos hoje em dia. Nesse meio
tempo, seu irmão, o prefeito, faz uma visita à redação do A Voz do Povo e explica
aos seus editores as nefastas consequências que o artigo do Dr. Stockmann traria
para a cidade e para o balneário. Aturdidos com a ideia da falência e da
bancarrota geral, os editores do jornal viram a casaca num piscar d´olhos, e negam
ao Dr. Stockmann o espaço antes prometido para seu artigo no periódico. A
reviravolta soa tanto mais revoltante quando o leitor ou espectador da peça
toma conhecimento de que eles não apenas se recusam a publicar o artigo do Dr.
Stockmann, como, no seu lugar, publicam um artigo do prefeito, em que este
calunia as intenções do irmão.
Apesar
desse segundo golpe, proveniente do conluio da imprensa, que havia
primeiramente se colocado ao seu lado de forma incondicional, com seu próprio
irmão, o Dr. Stockmann está ainda mais coprometido com seus princípios. Pensa
que os recentes fatos tornam ainda mais urgente a denúncia desse grupelho e de suas
intenções enganosas, pois o povo precisa saber que a tão celebrada prosperidade
da cidadela é falsa, fundada numa mentira! Nesse meio tempo, entretanto, o
artigo do prefeito já havia sido publicado no jornal, difamando a figura do Dr.
Stockmann ao espalhar a notícia de que sua intenção era destruir a sua própria
cidade. Numa tentativa quase desesperada de conter as calúnias e ao mesmo tempo
revelar a verdade, o doutor convoca uma assembleia popular, esperando
esclarecer para as pessoas o “mal-entendido”. Mas, ao chegar à assembleia,
Stockmann se depara com a presença do prefeito e dos editores do A Voz
do Povo, que se põem a falar antes que o doutor pudesse se defender das
calúnias que vinham sendo feitas a ele. Após acusado de louco e ser xingado e
insultado pelos cidadãos agora tanto mais convencidos de sua insanidade, o Dr.
Stockmann finalmente começa o seu discurso, espécie de clímax da peça, em que constrói
sua teoria sobre a hipocrisia desse tão celebrado conceito de democracia.
Segundo
o doutor (e aqui o leitor saboreia como nunca a verve crítica do próprio
Ibsen), a democracia é uma farsa. Por trás desse conceito pomposo e promissor, a
grande maioria é tanto mais facilmente manipulada pela meia-dúzia de poderosos
que mandam e desmandam na cidade. E, assim sendo, se essa ideia de que a
maioria escolhe o que é melhor para todos é uma farsa, uma tapeação, porque, no
fundo, quem escolhe são sempre apenas os mesmos poderosos, que a manipulam,
então essa maioria deve ser considerada inimiga da verdade e da liberdade: “O
inimigo mais perigoso da verdade e da liberdade, entre nós, é a enorme e
silenciosa maioria dos meus cidadãos. Esta massa amorfa”, afirma o doutor em
seu tumultuado pronunciamento. As duras palavras, proferidas assim a seco,
ofendem profundamente o público que, levando a assembleia ao caos geral, exige
imediatamente a retratação do insano orador, ameaçando-o das formas mais inesperadas.
Mas o Dr. Stockmann já não pensa mais nos males que essa sua atitude lhe
causará; não está mais preocupado com sua família, nem com seu emprego, nem com
sua fama nefasta. Pode-se dizer que encarnou a figura suicida do verdadeiro
filósofo, do livre-pensador. Apenas a verdade interessa-lhe, a verdade nua e
crua, essa mesma verdade que ninguém mais pode suportar. Recusa-se de pronto a
se retratar pelo seu pronunciamento e assim quadruplica o já intolerante ódio
dos presentes, desde o povo mais humilde até o prefeito e os editores do A Voz
do Povo.
Ao
fim e ao cabo, após um grande tumulto, a assembleia tem por bem declarar o Dr.
Stockmann inimigo do povo. Humilhado e insultado, ele se recolhe à casa, que
tem as vidraças apedrejadas. Despejado pelo seu senhorio, seus filhos passam a
ser insultados na escola. O apego irrefletido pela verdade e pelos princípios,
a atitude quase kantiana com a moralidade lhe sai extremamente cara. As pessoas
endeusam a verdade, esse conceito abstrato e romântico, mas não a suportam. Esse
mundo insuportável e insustentável da verdade, entretanto, é a casa do
livre-pensador, o lugar ao qual ele pertence e o único em que se sente
realmente bem a ponto de arriscar sua vida material para apoiá-lo, difundi-lo e
sustentá-lo. E é essa figura que o Dr. Stockmann de Ibsen encarna, em sua forma
mais crua e radical. Como todo livre-pensador, Stockmann não é ligado a nenhum partido,
ao contrário do prefeito, cuja função na administração municipal consiste em
defender o interesse dos banqueiros e investidores (no Brasil atual, esses
investidores são os empreiteiros, que enriquecem com propinas enquanto as
cidades transbordam de concreto). Mas a liberdade de Stockmann contrasta também
com a promiscuidade da imprensa, pintada por Ibsen como espécie de
maria-vai-com-as-outras, a tender para o lado que se mostrar mais favorável,
mais rentável. E exatamente por isso, por não pertencer a nenhum partido, a
nenhum grupo, o livre-pensador, detentor da verdade que ninguém quer ouvir, se
torna o ponto mais fraco da corda, aquele que necessariamente sucumbe quando um
embate desse quilate vem à tona. Ao ser oficialmente declarado inimigo do povo pela
assembleia, Stockmann torna-se o bode expiatório, a figura ideal para a
população como um todo despejar o ódio inconsciente acumulado por séculos e
séculos de dominação e ultraje dos poderosos sobre ela.
Ao
longo da história, a humanidade conheceu muitos livres-pensadores, artistas, cientistas
e filósofos que, incapazes de apenas reproduzir uma ideologia, se comprometeram
com a divulgação da verdade e pagaram um preço caro por essa decisão, que, no
fundo, é uma vocação, um destino do qual não puderam fugir. Não podemos deixar
de pensar aqui em Sócrates, ele próprio declarado inimigo público, segundo as
autoridades de Atenas, por corromper a juventude. Podemos pensar em Galileu, condenado
pela Inquisição a se retratar pela descoberta das manchas solares, contrariando
claramente os dogmas da Igreja. Ou podemos pensar em Espinosa, excomungado por
ambas as comunidades religiosas, a cristã e a judaica, esta última tendo sido
suficientemente clara na sua determinação: “Pela decisão dos anjos e julgamento
dos santos, excomungamos, expulsamos, execramos e maldizemos Baruch de Espinosa
[…] Maldito seja de dia e maldito seja de noite; maldito seja quando se deita e
maldito seja quando se levanta; maldito seja quando sai, maldito seja quando
regressa […] Ordenamos que ninguém mantenha com ele comunicação oral ou
escrita, que ninguém lhe preste favor algum, que ninguém permaneça com ele sob
o mesmo teto ou a menos de quatro jardas, que ninguém leia algo escrito ou
transcrito por ele” (texto
da sinagoga de Amsterdam de 1656).
Espinosa
formulou um pensamento tão nocivo às duas ideologias dominantes, das quais
fazia parte – a cristã e a judaica –, que teve de ser expulso de ambas. Se soar
por demais peremptório e dogmático afirmar que foi excomungado por possuir a
verdade, para além da questão da verdade, a ojeriza causada por pensadores
desse calibre se refere antes ao fato de eles não comungarem de linhas de
pensamentos determinadas, de nenhum padrão claro ou linha pré-definida. O que
causa asco em todos esses casos – e aqui podemos pensar também na empreitada de
Nietzsche contra o cristianismo e o proselitismo – é a liberdade de que gozam. É
a rara liberdade com a qual falam o que pensam, sem se preocupar em agradar a este
ou àquele lado da disputa, que constrange o que não é livre, que o ameaça em sua
confortável posição, protegido que é por seus asseclas, por seus pares, que
invariavelmente “pensam” como ele.
No fundo, aquele que
defende uma ideologia – seja ela de esquerda ou de direita, cristã ou judaica –
não pensa no sentido mais radical da palavra. O ideólogo apenas reproduz ou
imita uma doutrina pronta, um leque de ideias que está sempre lá à sua
disposição, espécie de manual ou repositório intelectual ao qual ele pode
recorrer sempre que se vê em perigo. Com isso, ele se exime da responsabilidade
de pensar e do que já foi pensado, protegendo-se das possíveis críticas na
casca da ideologia. Geralmente, os ideólogos o fazem porque têm algum interesse
em jogo ou porque têm algo a perder, como o prefeito ou os jornalistas da peça
de Ibsen, colocando seus cargos e seu bem-estar pessoal acima do bem público,
acima do interesse da maioria. Como diz o Dr. Stockmann em seu discurso, é por
isso que a tão celebrada democracia é uma farsa. Em última análise, trata-se apenas
de um conceito utilizado e difundido por uma meia dúzia de poderosos para
manipular a maioria, que vota em quem eles determinam previamente, recebendo o
suporte (e isso é o mais grave) da classe dos ideólogos, constituída por pseudopensadores
e pseudoartistas em geral, pseudoprofessores e pseudojornalistas, todos
interessados em tirar uma casquinha do poder, em participar desse oba-oba público-privado,
localizado nas altas-esferas da sociedade, ao mesmo tempo em que desempenham
papeis previamente esboçados na grande farsa, na tragicomédia da democracia.
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