Olhando daqui de cima parece fácil


Coragem.
Palavrinha metida a besta.
Quem se lembra de coragem no dia a dia?
Dizem que precisamos ter coragem.
Pra quê?
Pra que precisamos de algo que nem sabemos o que significa?
O que precisamos é de comida,
de sexo,
de bebida
de nexo.
Que é que é coragem afinal?
Quem sabe?
Ninguém.
Coragem provavelmente é coragem e ponto final.
Por exemplo,
Passar a tarde te olhando.
É coragem?
Preciso de coragem pra te olhar?
Preciso de coragem pra não conseguir trabalhar?
Pra me dar vontade de ouvir atrás da porta com a elis?
Pra ouvir atrás da porta com a elis enquanto ia adaptando a letra e quando ouvi de novo o gemido teu e o teu gemido era de adeus, juro que não acreditei, eu te estranhei, me debrucei sobre tua foto e duvidei, e me arrastei o mouse e te arranhei vou até em casa engolir um balla, vou me prometendo não voltar, sei que quando o balla fizer efeito vou mudar de idéia, que frívolo sou comigo mesmo, estado constante de paixão, impraticável ser assim, sempre me expondo muito além do limite do prudente e do razoável e do sensato, na hora penso, fôdasse, pensem de mim o que quiserem, não vou dar satisfação, mas obviamente não funciona, depois me arrependo, me sinto humilhado, juro pela bilésima vez que nunca mais, digo pra me deixar de ser tonto, quem sabe se preservar não se expõe, ou só expõe o que lhe convém... peraí, vou pegar o balla, sabia que ia ser assim, me segurei todos esses dias, sou o cara mais incapaz de conter os sentimentos que conheço, peraí, agora vou, já volto... pronto, agora tô devidamente munido, primeiro golinho... pelo menos consegui não desligar o computador, subir, tomar uma dose dando o dia por liquidado só pra voltar correndo, religar o comp, fazer o login de novo, que tempo e energia perdidos, dá-lhe atrás da porta, sabe que antigamente eu... não, não vou dizer que é que achava da elis nem o que acho agora, nem vou  dizer o que acho do chico, enquanto subia pra pegar o uísque fui pensando que eu é que devia estar na capa do disco no lugar dele, que ridículo né? um zé-mané se ombreando ao grande menestrel da emepebê, te entera muchacho, tá vendo só? vira e mexe esqueço qual é o meu lugar, por isso cometo tantas asneiras, falo tantas bobagens e levo chumbo do mundo, quando estou minimamente lúcido, o que é muito raro, claro, quando estou dou razão pro mundo que me detona, sou um molecão mimado, bato o pé quando não me dão a atenção que acho que mereço, o que é, lógico, totalmente contraproducente, ninguém curte criança mimada, e então me prometo que vou me comportar na próxima, vou fazer isso e aquilo, não passe do limite, sua anta, não existe só você de inteligente, sensível, sofisticado, o cacete a quatro, em vão, óbvio, sou um cabotino doente, e me arrastei e te arranhei e me agarrei nos teus cabelos, ao pé da cama sem carinho, o cara é um fedepê, hoje escutei pedaço de mim, cálice, fado tropical, retrato, sabiá, joana francesa, minha favoritas, a hipótese da troca impossível me martelando os ouvidos, passei a tarde roubando, ó... calma, não seja patético além do risível, amanhã dar de cara cuma bela descompostura, uma cortada, te botando no teu lugarzinho de merdinha insignificante, quem você tá pensando que é, mal escuta um álbum virtual já vai impondo exigência, quero isso, aquilo, tá assim pertinho de desembuchar aquelas atrocidades que sempre faz nessas horas, depois que estiver feito não chore, pamonha, também não exagere, nem sempre a autoimolação afetada funciona, no entanto volta sempre a enfeitiçar com seus mesmos tristes velhos fatos que no álbum... ó gosh, o álbum de novo, foi coincidência, será retrato a melhor do chico? tendo a achar que sim, varia de acordo com a época que se ouve, e basta ouvir outra pra achar que a outra é melhor e a outra e a outra, merda, por que é que eu tô falando qual matraca do cara, o cara é bom mas sou mais eu, perdão pelo clichê, detesto quando sou boçal, às vezes sou, vocês já devem ter sacado, sei também que ali sozinho eu vou ficar tanto pior, o que é que eu posso contra o encanto da (seguem milhões de adjetivos açucarados) inexpugnável, putz, não queria fazer refererência assim explicitamente, gosh, que nome, se eu me chamasse francisco, bom, seria uma merda, nome é assim não é? basta mudar uma letrinha pra ficar horrível, desisto, tinha me comprometido a não chamar deuses, rainhas, fadas, ninfas, esses lugarzões comuns que todo cabra metido a poeta se acha no direito de falar, mas, jesus, nem imagino que qualificativo devo dar, ainda mais depois daquela montanha de zombarias, que recaída, quando estou sóbrio não cometo esses deslizes, juro, foi fadiga, fadiga sentimental, na hora achei o mundo lindo e sedutor e pensei (se é que penso) fôdasse, e lasquei a dupla nefasta, merda, em dois vocabulozinhos me igualei aos milhões de tonhos que dizem tais asneiras a cada segundo, sou uma múmia, vou deitar à sombra duma palmeira que já não há, colher a flor que já não dá, bobagens mil me atravessando a superfície nevrálgica da mente, releve se eu me exceder, é o balla, é o sabiá, nada de esquecer, é o privilégio de ter alguém me lendo, amanhã faço um poeminha bonitinho comportadinho bem literário, desses que os poetas fazem quando têm medo de ser entendidos e desmacarados por seus severos críticos que só engolem declarações amorosas dignas do nobel, não vai ser em vão que fiz tantos planos de me enganar, fiquei longe do chico uns bons anos, não sei por que me deu vontade de ouvir agora, se ele me convidasse pra cama, ia? vou voltar, sei que ainda vou voltar pro meu lugar, sabe qual foi a última vez que cantei essa? tava descendo uma ladeira numa cidadezinha perto de sampa onde eu morava, pilotando a moto, aquela época só andava de moto, na garupa meu amigo do peito, músico como eu, eu era músico então, e comecei a cantarolar sabiá e ele disse, meu, incrível que você cante essa música bem agora e começamos os dois a berrar ao vento pela estrada a trocentos por hora, eu bêbado feito um irlandês do mato, ele chapadérrimo de erva, essa era a nossa diferença, nunca me dei bem com maconha, me sinto mais no controle com álcool, acho que deu, e qualquer qualificação enaltecedora que possa haver no vernáculo,  fôdasse, chega, não vou me conter, não sei me conter, quero me sufocar de tudo que possa me sufocar, me matava, me ressucitava, me cantava, me chorava, me aterrorizava, me ninava, vem molhar meu colo, vou te consolar, ajuda, tu és meu passaporte, faz de conta que todas as bobagens são por conta do chicão, ai esse homem deixa a gente louca não? quem é que pode se controlar não? 8:12 já beballabeballa de la cachaça e de suor ton soleil ta braise  angelicosa, é tudo culpa dele, esse endiabrado, geme de loucura e de torpor, mato-te de rir, mas veja que estou tomado de compulsão confessional, de agora em diante vão me conhecer do certo e do avesso, me dominar qual a um marionete, cazzo, o cara não me deixa pensar, essa joana francesa é a melhor, impossível escrever em paralelo, a mistura dos idiomas é primitiva, me atinge no âmago da alma, 8:17, gosh meu demônio, me dá o bálsamo, custei, não custei? não, não me xingue, não precisa dar se não quiser, pode me expulsar, pode me esquecer, pronto, desliguei o chico, vou me comportar, sou responsável agora por meus próprios atos, sou adulto, lúcido, letrado, escolarizado, conheço as regras sociais e sei muito bem o que posso e o que não posso fazer, dizer palavras minhas e me apossar de posses que são minhas e querer desejos que são meus e deixar meu coração bater as sístoles e diástoles que são dele, sem me arrepender nem ter de pagar com a única coisa que tenho de valor nem perder alento nem descobrir amanhã que não terei motivo pra querer morrer, que foi que me deu na cabeça de vir morar aqui? tanta cidade aprazível, jeesus, ainda não acredito, aquela de cão que ladra é balela, já tentei, só por tentar, tava experimentando, não é assim tão difícil, sabe o que aprendi? aprendi que basta não pensar no assunto, você não pode ficar planejando, que aí não dá certo, tem de fazer de conta que não tá nem pensando no assunto, de repente, yes, simples assim, é como poesia, tem de esperar brotar, não pode forçar nem cultivar, tem vida própria, será que ficou cafona demais? ficou, eu sei, tento mas nem sempre logro a sobriedade, sou um porco romântico, amanhã vou secar duas garrafas, prometo, quanto custa a passagem pra lugar algum? vou passear no shopping, arrumar emprego, subir  nessa obra até o último andar, dio mio, nunca pensei, tô ficando doido, minta.

Um comentário:

  1. Tá ficando doido não. Tá escrevendo... (isso não é loucura, será CORAGEM?)

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